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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte II 225<br />

cria<strong>do</strong>s que esperavam minha vin<strong>da</strong>, quan<strong>do</strong> de repente se viram <strong>do</strong>s mouros<br />

assalta<strong>do</strong>s que, falan<strong>do</strong> o arábigo para mais acreditar o engano e <strong>da</strong>r forças ao<br />

temor, imaginan<strong>do</strong>-se cativos os cria<strong>do</strong>s fugiram desamparan<strong>do</strong> as portas e<br />

casa, valen<strong>do</strong>-se <strong>do</strong> escuro por entre os arvore<strong>do</strong>s <strong>da</strong> quinta para segurarem a<br />

liber<strong>da</strong>de que já temiam perdi<strong>da</strong>. Pouco trataram de segui-los os disfarça<strong>do</strong>s<br />

piratas, que como não buscavam mais riquezas que Lucin<strong>da</strong>, que era to<strong>da</strong> a<br />

presa e saco desta navegação que emprendiam, não se empenharam em<br />

seguir o que não buscavam, porque lhes não fugisse o que queriam.<br />

Arruinaram as portas em que meus pais e Lucin<strong>da</strong> retira<strong>do</strong>s estavam e com os<br />

mosquetes encara<strong>do</strong>s e outros com os alfanges na mão, ameaçan<strong>do</strong> com a<br />

morte a quem lhes resistisse, toman<strong>do</strong> <strong>do</strong>us deles pela mão a inocente<br />

Lucin<strong>da</strong>, a quem o sustento lamentável em que se via lançava grilhões aos pés<br />

para mover-se e embargos à voz para queixar-se, que um sobressalto grande e<br />

repentino é rémora <strong>do</strong>s passos e silêncio <strong>da</strong>s vozes, porque ocupa<strong>do</strong> o<br />

coração com a carga <strong>do</strong>s pesares, to<strong>da</strong>s as potências suspende, to<strong>do</strong>s os<br />

alívios embarga.<br />

Considerai, discreto amigo, no penoso deste sucesso, o lastima<strong>do</strong> <strong>da</strong><br />

pena e o requinta<strong>do</strong> <strong>da</strong> <strong>do</strong>r que sentiriam meus aflitos pais ven<strong>do</strong> à sua vista<br />

roubar a pren<strong>da</strong> em que se reviam seus cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s e por quem se desvelavam<br />

suas memórias: ven<strong>do</strong> a filha mais queri<strong>da</strong>, prodígio por fermosa, espanto por<br />

modesta como cordeira entre as garras violentas de despie<strong>do</strong>sos inimigos<br />

arrancar-se de seus olhos para jamais a verem. Rompeu enfim a voz mais a<br />

força <strong>do</strong> amor e a <strong>do</strong> alento em meu pai, dizen<strong>do</strong>:<br />

- Se o desejo de adquirir riquezas vos obriga a este assalto, em que<br />

mais descui<strong>da</strong><strong>do</strong> dele vivia, riqueza tenho, senhores, com que possais<br />

satisfazer vossos desejos, sem profanares o decoro dessa filha de quem pende<br />

a vi<strong>da</strong> dessa desconsola<strong>da</strong> mãe. Aqui tendes as chaves de quanto possuo, que<br />

bem sobra para compensar to<strong>do</strong> o resgate que por ela pedir vosso interesse.<br />

Resgatai a vi<strong>da</strong> de uma mãe com a liber<strong>da</strong>de de uma filha, não queirais de um<br />

golpe tiranizar tantas vi<strong>da</strong>s; e quan<strong>do</strong> não me conce<strong>da</strong>is esta pie<strong>da</strong>de que vos<br />

peço, ao menos não me negueis levar-nos com ela cativos, corram nossas<br />

vi<strong>da</strong>s uma própria fortuna, e se nos hão-de matar as lembranças sau<strong>do</strong>sas <strong>do</strong><br />

bem que perdemos, mate-nos o rigor <strong>do</strong> cativeiro e não a tirania <strong>da</strong>s sau<strong>da</strong>des;

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