17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte V 881<br />

opostas que de antes tinham <strong>da</strong><strong>do</strong> a Cesena motivos de tantas guerras.<br />

Desejávamos eu e Roberto ouvir de Lívia o caminho que seguira aquela<br />

funesta noite em que se ausentou <strong>do</strong> casal, que com tantas diligências não<br />

pôde ser acha<strong>da</strong>, e o que lhe sucedeu até chegar ao casal <strong>do</strong> ancião Arnal<strong>do</strong><br />

em Sarafina; e assi ao outro dia sobre mesa lhe pedi nos referisse o caminho<br />

de sua fugi<strong>da</strong>, ao que ela satisfez, dizen<strong>do</strong>:<br />

- Quan<strong>do</strong> naquela infelice noite que sucedeu ao mais penoso dia em<br />

que Roberto intentou minha injusta morte e vós, senhor Lisar<strong>do</strong>, me<br />

socorrestes, vi que ele chegava ao casal com seus parentes e cria<strong>do</strong>s de<br />

armas tão provi<strong>do</strong>s e delibera<strong>do</strong>s, temi não como culpa<strong>da</strong>, mas como pouco<br />

venturosa, que por mais que vosso pie<strong>do</strong>so valor quisesse aventurar-se em<br />

defender-me, se pusesse a vitória (como de ordinário sucede) <strong>da</strong> parte <strong>do</strong>s<br />

muitos. Ansia<strong>da</strong> com esta pena e assusta<strong>da</strong> com o temor, enquanto vós os<br />

definheis para que no casal não entrassem e os lavra<strong>do</strong>res e abegões estavam<br />

com o repentino sobressalto diverti<strong>do</strong>s, vi outra porta cerra<strong>da</strong> que nas costas<br />

<strong>do</strong> casal a outra parte saía. Deu-me forças para abri-la o receio em que me via,<br />

e amparan<strong>do</strong>-me <strong>da</strong> sombra que as árvores contra os raios <strong>da</strong> lua faziam, não<br />

saben<strong>do</strong> que caminho emprendesse que não me seguissem, fui <strong>da</strong>r no rio; e<br />

aventuran<strong>do</strong>-me a to<strong>do</strong> o risco fui seguin<strong>do</strong> sua corrente, que com minhas<br />

lágrimas mais cau<strong>da</strong>losa se mostrava.<br />

Era o caminho trabalhoso pelo muito arvore<strong>do</strong> que o vestia, estreitos<br />

passos que o dificultavam, quebra<strong>da</strong>s que suas inun<strong>da</strong>ções causa<strong>do</strong> tinham,<br />

escuro e sombrio para temer-se, solitário para implorar socorro quan<strong>do</strong> minhas<br />

desgraças me seguissem. É um pavor médico de um receio, que com ele se<br />

cura o temeroso; e assi com o me<strong>do</strong> de perder a vi<strong>da</strong> com os desaires <strong>da</strong><br />

afronta, me aventurei ao perigo de poder receber a morte sem desaires.<br />

Caminhei to<strong>da</strong> a noite com esta pena, ten<strong>do</strong> a ca<strong>da</strong> passo um susto, fazen<strong>do</strong>-<br />

me atrevi<strong>da</strong> o próprio temor que me levava; que não parece novi<strong>da</strong>de no<br />

mun<strong>do</strong> nascer uma ousadia <strong>da</strong>s mesmas desconfianças <strong>do</strong> remédio. Assomou<br />

a aurora com crepúsculas luzes a minha pena, e achei-me vizinha a um<br />

espaçoso lago, se pequeno para mar, muito grande para rio. O que com sua<br />

corrente guia<strong>do</strong> até ali me havia, molesta<strong>do</strong> de ouvir minhas queixas, ou por<br />

não ver-me mais penar, ou por não querer ouvir-me, se entrou no lago arroja<strong>do</strong>

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!