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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte V 805<br />

Assi choran<strong>do</strong> de magoa<strong>da</strong> se queixava a fermosa Lívia nas ribeiras<br />

desertas <strong>do</strong> cristalino lago em que o Pó ia dilatan<strong>do</strong> sua corrente e, com<br />

ambições de ser mar, descui<strong>da</strong>n<strong>do</strong>-se <strong>do</strong>s atributos de rio. Tão<br />

insensivelmente movia suas on<strong>da</strong>s que parece que por ouvir o discreto de suas<br />

queixas parava de compassivo, para imóvel atender a elas.<br />

Chegava neste tempo ao lago uma barca de pesca<strong>do</strong>res vizinhos de<br />

Veneza, que navegan<strong>do</strong> para o porto <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de Ancona, entraram a fazer<br />

agua<strong>da</strong> neste famoso lago, em uma cau<strong>da</strong>losa fonte que distava pouco <strong>do</strong> sítio<br />

em que Lívia choran<strong>do</strong> estava suas mágoas. Saíram em terra e o patrão <strong>da</strong><br />

barca, que era mancebo de boa presença e que antes de se aplicar ao<br />

exercício <strong>da</strong> pescaria tinha cursa<strong>do</strong> alguns anos o estu<strong>do</strong> e depois<br />

experimenta<strong>do</strong> os perigos <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> militar, escolas uma e outra em que se<br />

aprende to<strong>da</strong> a política, que, como a definiu Aristóteles 713 , é a regra <strong>do</strong>s<br />

mora<strong>do</strong>res de uma ci<strong>da</strong>de ou república em que se governa o man<strong>da</strong>r e se<br />

ensina a urbani<strong>da</strong>de de obedecer. Era o patrão <strong>da</strong> barca, que Antonino se<br />

chamava, casa<strong>do</strong> em Veneza, limita<strong>do</strong> nas possessões, pois a maior que tinha<br />

era o móvel <strong>da</strong> barca, em que se cifravam to<strong>do</strong>s os seus móveis, e umas casas<br />

humildes em que, em Veneza, junto à ribeira <strong>do</strong> mar vivia, em que no móvel e<br />

raiz a fortuna lhe repartiu o património. Vivia <strong>da</strong> pescaria e de algumas breves<br />

navegações que pela costa <strong>do</strong> mar Adriático fazia, já em passar algumas<br />

pessoas de umas terras a outras, já levan<strong>do</strong> ou trazen<strong>do</strong> algumas merca<strong>do</strong>rias,<br />

como nesta ocasião levava de Veneza para a marítima ci<strong>da</strong>de de Ancona, que<br />

edificaram nesta costa <strong>do</strong> mar os antigos sicilianos, fugin<strong>do</strong> <strong>da</strong>s cruel<strong>da</strong>des de<br />

Dionísio, tirano de Sicília. Tem Ancona seu sítio em um promontório <strong>do</strong>s<br />

navegantes bem conheci<strong>do</strong>, e para onde agora Antonino com merca<strong>do</strong>rias<br />

navegava.<br />

Saía com seus companheiros em terra, pela causa que disse de se<br />

proverem de água <strong>da</strong> fonte que vizinha corria, e em que Lívia não tinha<br />

adverti<strong>do</strong>, ten<strong>do</strong> tão perenes fontes em seus olhos de que tão copiosas<br />

lágrimas caíam. Apenas os pesca<strong>do</strong>res viram a Lívia como lavra<strong>do</strong>ra vesti<strong>da</strong> e<br />

como cortesã briosa, na vista tão fermosa e nas lágrimas tão triste, solitário o<br />

lugar, areoso o sítio, as horas tão antecipa<strong>da</strong>s aos resplan<strong>do</strong>res <strong>do</strong> sol e aos<br />

3 Ar., Pol. 3.

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