17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

178 Padre Mateus Ribeiro<br />

Semelhante foi a morte <strong>do</strong> insigne poeta Sófocles Ateniense que morreu de<br />

alegria ven<strong>do</strong> a última tragédia que compôs julga<strong>da</strong> na opinião <strong>do</strong>s sábios por<br />

mais excelente que to<strong>do</strong>s os poemas <strong>do</strong>s famosos poetas de seu tempo, com<br />

quem <strong>da</strong> primazia e laureamento competia. Porém agora conheço que muitas<br />

vezes as que se avaliam felici<strong>da</strong>des se permitem por castigos e os que se<br />

julgam por infortúnios são muitas vezes benefícios.<br />

Chegou-se o dia <strong>do</strong>s desposórios de mim tão deseja<strong>do</strong>: vi-me possui<strong>do</strong>r<br />

<strong>da</strong> pren<strong>da</strong> que com tantos extremos queria, bens enfim <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, sempre<br />

maiores nas esperanças que na posse: imaginava-me o mais venturoso <strong>do</strong>s<br />

homens, ven<strong>do</strong>-me em tão breve tempo casa<strong>do</strong> tanto a meu gosto, com mulher<br />

de tantas pren<strong>da</strong>s e com <strong>do</strong>te conveniente para sustentar o esta<strong>do</strong> que à sua<br />

quali<strong>da</strong>de não desdissesse. Porém apenas seriam passa<strong>do</strong>s vinte dias de<br />

minhas imagina<strong>da</strong>s venturas, quan<strong>do</strong> em um instante me vi conduzi<strong>do</strong> ao maior<br />

extremo de misérias e cerca<strong>do</strong> de to<strong>da</strong>s as ânsias e desgostos que sentir pode<br />

um coração que padecer pode um sentimento grande; sen<strong>do</strong> de tal quali<strong>da</strong>de<br />

meus infortúnios que nem consolação admitem, nem remédio esperam. Com<br />

dificul<strong>da</strong>de se guar<strong>da</strong> o que de muitos se deseja: pensão grande <strong>da</strong> humana<br />

fermosura, que na mulher própria vem a ser muitas vezes veneno <strong>do</strong>ce,<br />

cativeiro deseja<strong>do</strong>, desvelos pertendi<strong>do</strong>s.<br />

Havia em Bruxelas um mancebo espanhol de agradável presença, o<br />

qual se tinha <strong>da</strong><strong>do</strong> por meu amigo nesses dias em que as pertensões de<br />

Teo<strong>do</strong>ra me desvelavam; e como alegrias grandes, conforme disse<br />

Quintiliano 248 , sejam dificultosas de encobrir-se, lhe manifestei as que em meu<br />

peito caber não podiam, fia<strong>do</strong> na amizade que me mostrava. Aprovou-me a<br />

pertensão, <strong>da</strong>n<strong>do</strong>-me título de venturoso, pois aspiran<strong>do</strong> a tal empenho me via<br />

favoreci<strong>do</strong> e com esperanças de alcançá-lo: ofereceu-se a aju<strong>da</strong>r-me (se<br />

necessário fosse), sen<strong>do</strong> <strong>da</strong>í em diante sabe<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s secretos mais ocultos de<br />

meu peito, parecen<strong>do</strong>-me que o fruto de uma amizade ver<strong>da</strong>deira era achar<br />

alívio nos males, glória nos bens e consolação deles sem inveja; sen<strong>do</strong><br />

obrigação própria <strong>do</strong> amigo, como diz Aristóteles 249 , sentir em igual grau os<br />

Quintil., Dec. 2.<br />

Arist., Rhetor. 2.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!