17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte VI 915<br />

ele avaliava em menos, porém a de Eurides, sua esposa, e de seus filhos, que<br />

ele estimava em mais.<br />

- De que me aproveitou, cruel fortuna (dizia o ansia<strong>do</strong> Manfre<strong>do</strong>), que te<br />

mostrasses propícia a minha amorosa e arrisca<strong>da</strong> fugi<strong>da</strong>, tantos anos viven<strong>do</strong><br />

desconheci<strong>do</strong> em terra alheia, se no melhor tempo de meu inquieto descanso<br />

de novo me manifestas? Já te arrependes <strong>do</strong> favor? Já te cansa meu sossego?<br />

Já te parece muita minha pastoril felici<strong>da</strong>de? Exordiaste os favores para me<br />

deixares no melhor tempo infelice? Mas quan<strong>do</strong>, fortuna, foi tua ro<strong>da</strong> constante,<br />

se de seres mudável vives? Que escolherá minha pena em trance tão cruel, em<br />

que em ir e ficar sempre encontro o perigo? E em um e outro extremo não<br />

descubro o remédio? Insistir em escusar-me, sobre parecer desprezo, que<br />

como diz Demóstenes 915 é cousa feia fazer desestimação <strong>do</strong> que muitos<br />

desejam tanto, é fazer-me aborreci<strong>do</strong> aos mesmos que me amavam, que não é<br />

pequena desgraça o vir a experimentar o ódio nos próprios em quem conheci<br />

tantas vezes o amor, sen<strong>do</strong> o ódio, como disse Plutarco 916 , mais cego para<br />

ofender <strong>do</strong> que o amor para subornar. Além disto é <strong>da</strong>r motivos de suspeitar<br />

quem quiser son<strong>da</strong>r a altura e o profun<strong>do</strong> <strong>da</strong> causa de que podem nascer<br />

minhas escusas; porque nem a inocência vive isenta de ocasionar uma<br />

suspeita em ânimos odiosos e pouco afectos, porque a inocência pende <strong>da</strong>s<br />

obras próprias, porém a suspeita nasce <strong>do</strong>s juízos alheios; e que discursan<strong>do</strong><br />

os mo<strong>do</strong>neses sobre os retiros de minha vi<strong>da</strong> e a repeti<strong>da</strong> escusa de ir<br />

aparecer diante <strong>do</strong> empera<strong>do</strong>r, não possam vir a inferir que quem tanto se<br />

retira dá indícios de que deve. Oh mágoa grande, que entre Cila e Caribdis<br />

sempre navegue arrisca<strong>da</strong> minha ventura!<br />

Com este sentimento veio Manfre<strong>do</strong> consultar com Eurides, sua esposa,<br />

o penoso de seu cui<strong>da</strong><strong>do</strong> e o oneroso <strong>da</strong> <strong>do</strong>r que em seu coração vivia,<br />

confian<strong>do</strong> de seu bom juízo lhe <strong>da</strong>ria o mais acerta<strong>do</strong> parecer no que destes<br />

extremos seguiria. Assusta<strong>da</strong> com a impensa<strong>da</strong> nova se mostrou Eurides,<br />

roubou-lhe o sobressalto as rosas mais vivas de seu rosto, não a beleza, que a<br />

pena lhe socrestou o encarna<strong>do</strong>, mas não a despojou <strong>da</strong> neve, passan<strong>do</strong> de<br />

rosa a ser açucena. Assomou-se às janelas de seus fermosos olhos o receio,<br />

5 Demosth., in Olynth.<br />

6 Plut., De utilit. ab inim.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!