17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte II 375<br />

Dormiu Rogério, porque o constrangeu o cansaço; mas não <strong>do</strong>rmiu<br />

Dionísio, porque o despertava o cui<strong>da</strong><strong>do</strong>. Que, como disse Ovídio 372 , são os<br />

que atenuam as forças <strong>do</strong> corpo e os que perturbam as operações <strong>da</strong> alma.<br />

São os cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s rémoras <strong>do</strong>s senti<strong>do</strong>s, divertimentos <strong>do</strong>s discursos, leitos de<br />

abrolhos em que não há descanso, desperta<strong>do</strong>res importunos que não<br />

permitem sossego, encapela<strong>da</strong>s on<strong>da</strong>s que nunca param, trombetas que tocam<br />

sempre a viva guerra, <strong>do</strong>res insensíveis que atormentam a quem os sustenta,<br />

pagan<strong>do</strong>-lhes o gasalha<strong>do</strong> em desvelos e o hospício em tiranias como ingratos.<br />

Tal estava o coração de Dionísio nesta, ain<strong>da</strong> que breve, contu<strong>do</strong> para ele<br />

eterniza<strong>da</strong> noite, parecen<strong>do</strong>-lhe que as sombras se não moviam, porque as<br />

luzes não marchavam. Parecia-lhe ou que o carro <strong>da</strong> noite perdera o norte de<br />

seu caminho, ou se haviam desgoverna<strong>do</strong> os pólos de seu carro ou estrela<strong>do</strong>s<br />

círculos de suas ro<strong>da</strong>s, pois tão pouco seguiam seu caminho. Já lhe parecia<br />

que os alígeros cavalos <strong>do</strong> brilhante carro <strong>do</strong> sol ou paravam de cansa<strong>do</strong>s, ou<br />

tornavam atrás de ressenti<strong>do</strong>s por não descobrirem ao mun<strong>do</strong> a Teo<strong>do</strong>ra,<br />

antigamente tão própria pela beleza para ser vista como agora no esta<strong>do</strong><br />

presente tão miserável para ser chora<strong>da</strong>.<br />

- Oh noite penosa (dizia o ansia<strong>do</strong> Dionísio), quem te fez tão pesa<strong>da</strong><br />

para minhas penas, sen<strong>do</strong> de antes tão fugitiva a minhas alegrias? Quem te<br />

pôs os pesos <strong>do</strong> relógio de meus pesares para te moveres tão pouco, se em<br />

tempo de minhas venturas tiveste asas para voares tanto? Oh infeliz Teo<strong>do</strong>ra,<br />

que nem tiveste dita por esposa, pois me deixaste, nem por amante, pois te<br />

deixaram! Naceste no mun<strong>do</strong> para exemplo trágico <strong>da</strong>s lisonjas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> e <strong>do</strong>s<br />

desenganos <strong>da</strong> morte. Deu-te a natureza partes para ser queri<strong>da</strong>, se souberas<br />

estimar-te. Mas quem a si próprio se desestima, como há-de ser de outros<br />

estima<strong>do</strong>? Deixaste-me a mim, teu esposo, que me desvaneci de venturoso em<br />

possuir-te, para seguires os passos de um tirano que te privou <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> para<br />

deixar-te. Ele te deu a paga como ingrato e ele a recebeu como tirano. Que<br />

nem dele podia esperar-se outro galardão, nem de ti podia prometer-se mais<br />

venturosa sorte; nem a livian<strong>da</strong>de costumou <strong>da</strong>r outro fruto, nem a ingratidão<br />

costuma receber outro agradecimento. Que de terras te ausentaste, que de<br />

ci<strong>da</strong>des fugiste, que de reinos passaste? E quanto menos o temeste, por teu<br />

Ovid., Met. 6.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!