17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

618 Padre Mateus Ribeiro<br />

própria ao desejo; que sempre para acrescentar-se a pena a um infelice, traz a<br />

fortuna propícia a ocasião. Estava seu pai Octávio nessa [altura] em Bolonha,<br />

ocupa<strong>do</strong> nos concertos de seu casamento, e eu, desmontan<strong>do</strong> <strong>do</strong> cavalo, subi<br />

a cima, como quem na<strong>da</strong> temia: que pouca estimação faz <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> quem quasi<br />

desespera<strong>do</strong> se aventura a perdê-la. E ven<strong>do</strong> a Aurora, que sobressalta<strong>da</strong><br />

saía, não sei se a estimar ou se a repreender meu atrevimento, com voz mais<br />

ira<strong>da</strong> que respeitosa, lhe disse desta sorte:<br />

Cap. VI.<br />

Da prática que Hortênsio teve com Aurora e <strong>do</strong> mais que sucedeu<br />

- Despedi<strong>do</strong> já de Bolonha, e agora de tua presença para mais não ver­<br />

te, mudável e inconstante Aurora, vou buscar a morte em terra alheia; pois não<br />

é certo voltar à sua pátria, quem nasceu tão pouco venturoso nela. Foste no<br />

princípio de meus estu<strong>do</strong>s malogra<strong>do</strong>s a sereia que inquietaste a meus<br />

senti<strong>do</strong>s e agora serás a harpia cruel que dês trágico fim à minha vi<strong>da</strong>. Se até<br />

agora vivi lisonjea<strong>do</strong>, hoje me parto não menos desengana<strong>do</strong> que queixoso,<br />

pois te obrigaram mais os agravos de Júlio que as finezas de Hortênsio. Que<br />

há finezas tão mal afortuna<strong>da</strong>s que ofendem e agravos tão venturosos que<br />

obrigam. É possível que pudesse contigo mais quem derramou teu próprio<br />

sangue que quem te ofereceu sua própria vi<strong>da</strong>? Foi mais venturoso quem tanto<br />

te ofendeu <strong>do</strong> que quem tanto te amou? A seres menos discreta, não fora tua<br />

culpa tão grande, nem minha mágoa tão excessiva; pois aonde tua ignorância<br />

achasse desculpas ao desacerto, acharia juntamente minha <strong>do</strong>r alívios ao<br />

penar. Mas sen<strong>do</strong> tu tão ajuiza<strong>da</strong>, como eu conheço, nem tens escusas na<br />

mu<strong>da</strong>nça, nem eu posso admitir tréguas na <strong>do</strong>r.<br />

Não sei, Aurora, se me queixe de teu juízo, se de tua vontade. Pois<br />

ven<strong>do</strong> tantos erros na eleição, não posso facilmente julgar quem mais me<br />

ofende, se o entendimento, pelo que julgas, ou se a vontade, pelo que queres.<br />

Julga tu própria os motivos de minha queixa: que suposto que julgues<br />

apaixona<strong>da</strong>, nunca poderás livrar-te <strong>da</strong> culpa, por mais que preten<strong>da</strong>s isentar-<br />

te <strong>da</strong> pena. Desprezares as finezas, podia ser razão de esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> fermosura;<br />

porém remunerar os agravos, é o maior desaire <strong>da</strong> eleição. Menos queixoso

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!