17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte II 293<br />

Assim disse, e caiu desmaia<strong>da</strong> a aflita mãe sobre o cadáver <strong>da</strong><br />

malogra<strong>da</strong> filha, que a to<strong>do</strong>s nos causou tanta mágoa que testemunharam<br />

nossos olhos a compaixão. Acudiu-lhe Eugenia toman<strong>do</strong>-a em seus braços e<br />

com as cria<strong>da</strong>s a levaram a outro quarto aparta<strong>do</strong> <strong>do</strong> em que estava a defunta,<br />

enquanto se preparava seu enterro que se fez ao outro dia com a<br />

sumptuosi<strong>da</strong>de possível, a quem os quatro companheiros levámos aos ombros<br />

a depositar na capela de seus pais. Tratámos de despedir-nos deles para<br />

partirmos a Roma e ouvin<strong>do</strong> o excessivo <strong>da</strong> aflição em que a mãe estava, lhe<br />

disse eu desta sorte:<br />

- É tão geral, senhora Laura, em nós o sentimento <strong>da</strong> vossa per<strong>da</strong> e de<br />

vossa mágoa que qualquer de nós mais necessitava de quem aliviasse nossas<br />

tristezas que de poder consolar o vivo de vossa <strong>do</strong>r, estan<strong>do</strong> a chaga tão<br />

fresca e tão presente a mágoa dela. Mas como disse São Gregório Papa que<br />

só sabe consolar quem é participante <strong>da</strong> mesma <strong>do</strong>r, caben<strong>do</strong>-nos a nós tanta<br />

parte dela, bem podemos aliviar vossa pena, se pode achar-se alívio em pena<br />

que parece carecer de consolação.<br />

Levou a morte a senhora Felícia no que parecia agra<strong>do</strong> <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, lisonja<br />

<strong>da</strong> i<strong>da</strong>de, delícia <strong>do</strong> tempo, primavera <strong>do</strong>s anos, aurora <strong>da</strong> moci<strong>da</strong>de. Assim o<br />

parece se a consideramos conforme vemos; mas se ponderarmos a vi<strong>da</strong> que<br />

lhe decretou a Divina Providência desde seu nascimento, nem ela tinha mais<br />

vi<strong>da</strong> que lograr, nem lhe faltou o menor instante de viver. O Santo Job disse<br />

que assinou Deus o termo à nossa vi<strong>da</strong> <strong>do</strong> qual não é possível passar, porque<br />

o número de nossos dias tem ele deposita<strong>do</strong> nos decretos de sua Providência,<br />

a quem não podem encontrar nossos desejos. Não se há-de regular nossa vi<strong>da</strong><br />

pelo que ain<strong>da</strong> pudéramos viver, senão pelo que nos faltava para ao termo<br />

defini<strong>do</strong> chegar. Para o mesmo porto caminhamos to<strong>do</strong>s desde que nascemos:<br />

não se suspende a jorna<strong>da</strong> nem quan<strong>do</strong> <strong>do</strong>rmimos, nem quan<strong>do</strong> velamos. Pois<br />

que admiração é que chegue ao porto quem sempre navega, nem que chegue<br />

ao termo decreta<strong>do</strong> quem sempre caminha? A i<strong>da</strong>de mais flori<strong>da</strong> foi para ela a<br />

mais dilata<strong>da</strong>, que como o decreto divino lhe abreviou o caminho, pode chegar<br />

mais ce<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> nos parecia que chegaria mais tarde. Queixai-vos porque<br />

vo-la tiraram e não considerais que empresta<strong>da</strong> vo-la deram, como<br />

discretamente disse o Séneca; e assim fica sen<strong>do</strong> só restituição <strong>da</strong> dívi<strong>da</strong> o<br />

que julgais ser tirania <strong>da</strong> morte. Chorais porque morreu quem nasceu mortal;

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!