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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte V 857<br />

em lugar de poder navegar com elas, encontravam o vento ao frágil baixel de<br />

suas derrota<strong>da</strong>s esperanças, e finalmente eclipses que lhe usurpavam os<br />

resplan<strong>do</strong>res ao sol em que seus olhos se reviam. Com este sentimento<br />

assistia pouco em casa, sain<strong>do</strong>-se ao campo com amigos para ver se podia<br />

divertir a pena; porém era a tristeza tão eficaz que nenhum alívio recebia, nem<br />

o alegravam os pra<strong>do</strong>s com seus ver<strong>do</strong>res, nem as flores o agra<strong>da</strong>vam com<br />

seus matizes, o murmurar <strong>da</strong>s fontes o entristecia, a corrente <strong>do</strong> rio o<br />

molestava, sem descobrir a causa <strong>do</strong>nde tanta tristeza procedia.<br />

Tomou por último remédio o tratar-me com particular amizade com o<br />

pretexto <strong>da</strong> vizinhança, levan<strong>do</strong>-me muitas vezes a sua casa e obrigan<strong>do</strong>-me<br />

com cortesia de amigo a que jantasse com ele; o que eu por ver-me<br />

importuna<strong>do</strong> <strong>da</strong> instância de seus rogos aceitei algumas vezes e outras me<br />

escusava, fingin<strong>do</strong> ocupações que mo impediam. Com esta familiari<strong>da</strong>de<br />

recíproca que entre nós havia (sem eu ser sabe<strong>do</strong>r de seus intentos), teve ele<br />

confiança de ir buscar-me algumas vezes a minha casa, com divertimentos de<br />

escolástica conversação em que passavam os dias de sueto e os que os<br />

estu<strong>do</strong>s feriavam, com que ao descui<strong>do</strong> teve oportuni<strong>da</strong>de de ver a Diana sem<br />

a clausura <strong>da</strong>s zelosias lho dificultarem, que sempre o difícil faz parecer as<br />

cousas mais agradáveis aos olhos, sen<strong>do</strong> que Diana sempre era muito para ser<br />

vista.<br />

Viu, como digo, a Diana, porém sempre a furto, e foi de Diana visto de<br />

propósito, e nesta segun<strong>da</strong> vista esteve o <strong>da</strong>no, porque na primeira não era<br />

grande o perigo. Bem disse Quintiliano 816 que não havia cousa mais arrisca<strong>da</strong><br />

que os afectos <strong>do</strong> querer: porque, como nascem <strong>da</strong> vontade, tem neles débil<br />

voto o juízo. Era Camilo mancebo e mui galã, trajava custosamente, tinha <strong>do</strong>us<br />

pajens que o serviam e, como era rico, muitos amigos que o buscavam por<br />

liberal e <strong>da</strong>divoso: assistia aos estu<strong>do</strong>s mais por curiosi<strong>da</strong>de <strong>do</strong> que por<br />

necessi<strong>da</strong>de de os seguir. Conhecia Diana ser dele ama<strong>da</strong>, evidente perigo em<br />

mulher fermosa, moça e sem <strong>do</strong>te, em terra aonde não se observam as<br />

antiguas leis que Licurgo deu aos lacedemónios, em que proibiu que nenhuma<br />

filha se <strong>do</strong>tasse para que ca<strong>da</strong> uma se apurasse em seus merecimentos. E<br />

sen<strong>do</strong> de antes Diana tão honesta e recolhi<strong>da</strong>, como tenho referi<strong>do</strong>, veio<br />

6 Quint., Lib. 2. Decl.

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