17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte III 551<br />

rigorosa execução onde se não acha dívi<strong>da</strong> que executar. Se vos enganara nas<br />

promessas, se vos ofendera na leal<strong>da</strong>de, se vos faltara na fé ou se vos<br />

rejeitara por desvali<strong>do</strong>, haven<strong>do</strong>-vos queri<strong>do</strong> por priva<strong>do</strong>, razão tivéreis na<br />

queixa e desculpa no sentimento. Mas na<strong>da</strong> disto haven<strong>do</strong>, nem a queixa fica<br />

justa, nem a pena ao motivo adequa<strong>da</strong>.<br />

O desejo não tem poderes para causar obrigação na cousa deseja<strong>da</strong>:<br />

desejar a riqueza, a honra e felici<strong>da</strong>de não é direito para consegui-la. Os<br />

desejos nascem <strong>da</strong> vontade e o alcançar <strong>da</strong> ventura. Quem deseja, se é<br />

venturoso, já leva quasi a conten<strong>da</strong> venci<strong>da</strong>; mas os desejos em quem é<br />

desgraça<strong>do</strong> são assaltos que se dão ao coração sem ter armas para o<br />

vencimento. Quan<strong>do</strong> estáveis no valimento e pretendestes a Jacinta para<br />

esposa, faltou-vos a simpatia, que é a arma mais reforça<strong>da</strong> para afeiçoar a<br />

quem não demove o interesse; e agora que perdestes a privança, ficastes<br />

despoja<strong>do</strong> <strong>da</strong>s armas. E sen<strong>do</strong> o contrário tão poderoso, como queríeis sair<br />

desarma<strong>do</strong> a combater sobre Jacinta com um felice e poderoso? A ela sempre<br />

lhe deveis o mostrar-se convosco pie<strong>do</strong>sa, posto que não se mostrasse<br />

amante. E se com servi-la não conseguistes o querer-vos, ao menos<br />

alcançastes o livrar-vos. Quem há-de ser tão severo executor <strong>do</strong>s alvedrios<br />

alheios para sujeitá-los, há-de nascer nos braços <strong>da</strong> ventura; que to<strong>do</strong>s os<br />

serviços tem pouco preço, se lhe falta o cunho <strong>da</strong> ventura, que vai tu<strong>do</strong>. Do<br />

deve<strong>do</strong>r rigoroso aceita-se a paga em qualquer moe<strong>da</strong>. Pagou-vos Jacinta na<br />

pie<strong>da</strong>de de livrar-vos; <strong>da</strong>i-vos por satisfeito, pois se vos não pagou no ouro <strong>do</strong><br />

amor que desejáveis, ao menos satisfez a dívi<strong>da</strong> na prata <strong>da</strong> pie<strong>da</strong>de, com que<br />

se empenhou a valer-vos. Jacinta tinha pais a que devia os respeitos de filha; e<br />

para se casar sem seu consentimento, havia de ser o amor gigante que a<br />

obrigasse. Não é justo culpá-la de que obrou como filha, quan<strong>do</strong> não estava<br />

obriga<strong>da</strong> a proceder como amante.<br />

Se era rara na fermosura, cousa é que paga pensões invioláveis ao<br />

tempo, verdugo universal <strong>da</strong> natureza. Nasce a rosa para lisonja em berço de<br />

espinhos; e apenas um dia representou aos olhos o papel de rainha, quan<strong>do</strong> se<br />

vestiu o de cadáver; começan<strong>do</strong> em comédia na manhã e <strong>da</strong>n<strong>do</strong> fim em<br />

tragédia nos assomos <strong>da</strong> tarde. O sol se multiplica a seus resplan<strong>do</strong>res o<br />

nascimento, também multiplica a seus raios o sepulcro. A terra se reveste de<br />

gala em Abril, também se enluta em Dezembro; os rios se vão poderosos no

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!