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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte IV 675<br />

que se adiantou em mim com tanto excesso a alegria ao discurso que me<br />

desconheci de contente, pelo que de antes me tinha avalia<strong>do</strong> de triste.<br />

Era a noite escura porque a cerração <strong>da</strong>s nuvens tinha embarga<strong>do</strong> o<br />

luzimento às estrelas: que há luzes tão limita<strong>da</strong>s que qualquer cortina é<br />

poderosa para encobri-las. Era eu hóspede <strong>do</strong> capitão Flamínio e Zelin<strong>da</strong> ia em<br />

um camarote retira<strong>da</strong>, a qual tinha <strong>da</strong><strong>do</strong> ao capitão algumas jóias de preço e<br />

lhe prometeu seis mil cruza<strong>do</strong>s no dia em que nos pusesse em Taranto; e ele<br />

prometeu de nos pôr em seguro, ain<strong>da</strong> que se aventurasse a perder a vi<strong>da</strong>,<br />

promessa que satisfez com to<strong>da</strong> a pontual ver<strong>da</strong>de. Que, como diz Cícero 572 , é<br />

obrigação de ânimos honra<strong>do</strong>s não faltarem na ver<strong>da</strong>de <strong>do</strong> que justamente se<br />

promete. Seguiu-se à tenebrosa cerração <strong>da</strong> noite a escura sombra <strong>do</strong> dia,<br />

prognóstico <strong>da</strong> tempestade futura, que logo sobreveio, que com ameaçar-nos<br />

perigo, nos serviu de remédio; pois na seguinte noite, entre os brami<strong>do</strong>s<br />

contínuos <strong>da</strong>s implacáveis on<strong>da</strong>s, rigorosa fúria <strong>do</strong>s ventos e escuras trevas de<br />

que a noite se vestia, passámos de largo à vista <strong>da</strong> marítima ci<strong>da</strong>de de<br />

Galipolis sem sermos senti<strong>do</strong>s. Com o que evitámos a arrisca<strong>da</strong> moléstia de<br />

registrar-se a nau e ser visita<strong>da</strong> com as demoras e perigos que referi<strong>do</strong> tenho.<br />

Era o capitão Flamínio mui experimenta<strong>do</strong> em as navegações e mui animoso<br />

para acometer qualquer empresa, por difícil que fosse; e por isso se aventurou<br />

a patrocinar esta arrisca<strong>da</strong> fugi<strong>da</strong> de Zelin<strong>da</strong>, a que outro de menos valor não<br />

se atrevera. Assim aproveitan<strong>do</strong>-se <strong>da</strong> própria tormenta, que a outro intimi<strong>da</strong>ra,<br />

para navegar com ela, sem reparar no grande escuro e tormentoso vento que a<br />

tempestade causava, entrou pela boca <strong>do</strong> Helesponto, canal tão estreito que,<br />

ten<strong>do</strong> duas léguas de compri<strong>do</strong>, tem só uma milha de largo. Empenhou-se<br />

temerário ao risco de poder o furor <strong>da</strong> tormenta <strong>da</strong>r com a nau à costa, só a fim<br />

de evitar maior risco de registar nas duas fortalezas de Sesto e Abi<strong>do</strong>, em que<br />

se aventurava a poder Zelin<strong>da</strong> ser descoberta e ficarmos to<strong>do</strong>s perdi<strong>do</strong>s.<br />

Muitas vezes favorece a fortuna as ousadias, diz Xenofonte 573 , sen<strong>do</strong>,<br />

como costuma dizer Demócrito 574 , <strong>do</strong> valor o acometer e <strong>da</strong> fortuna o<br />

patrocinar. Correm no Helesponto as águas com tanta força e com tão<br />

Cie, 3. Offic.<br />

Xenophon., apud Stob.<br />

Dem., apud. Eund.

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