17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte I 173<br />

ocultamente em uma nau hamburguesa, que no porto estava já para largar as<br />

velas e, sem procurar a derrota que levava, que a nenhum parti<strong>do</strong> se nega<br />

quem an<strong>da</strong> batalhan<strong>do</strong> nas mãos <strong>da</strong> ventura, com desejos de ver-me<br />

distancia<strong>do</strong> de Londres, me entreguei à inconstância <strong>do</strong>s mares.<br />

Com vento bonançoso partiu a nau (se no mar pudera haver bonança<br />

segura) navegan<strong>do</strong> os primeiros dias à igual<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s desejos; porém<br />

repentinamente uma noite começou um nubla<strong>do</strong> escuro a servir de pavelhão (a)<br />

triste a tantas luminárias de estrelas que com trémulas luzes se descobriam. A<br />

fúria grande de contrários ventos desfiou as on<strong>da</strong>s que para se<br />

desempenharem, desprezan<strong>do</strong> serem campos e paramos de cristal, se<br />

quiseram transformar em serra de neve. Pouca distância, disse o sábio<br />

Anecarsis (é referi<strong>do</strong> por Diógenes 240 ), que havia entre a vi<strong>da</strong> e morte <strong>do</strong>s<br />

navegantes, sen<strong>do</strong> a navegação causa <strong>da</strong> morte, como lhe chamou Plínio<br />

Sénior; porque sen<strong>do</strong> o mar tão inconstante e pouco seguro à custa de<br />

contínuos recessos e à vista de evidentes perigos, aprende a temer seu rigor,<br />

como disse Propércio, que a ele se aventura quem de sua aparente sereni<strong>da</strong>de<br />

se confia. Ficou a noite escura, cujas sombras se em qualquer outra ocasião<br />

são bastantes a causar temor, como diz o padre S. Agostinho 241 , nesta podiam<br />

intimi<strong>da</strong>r os ânimos mais intrépi<strong>do</strong>s e valerosos. Eram implacáveis em seu<br />

desafio os brami<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s on<strong>da</strong>s e <strong>do</strong>s ventos, de cuja violência a nau impeli<strong>da</strong><br />

ameaçava a ca<strong>da</strong> instante lamentável sepulcro no mais profun<strong>do</strong> <strong>do</strong>s mares.<br />

Fuzilavam os relâmpagos entre continua<strong>do</strong>s chuveiros, crecen<strong>do</strong> ca<strong>da</strong> vez<br />

mais a tormenta, e desmaian<strong>do</strong> o piloto com ignorar a derrota em que se<br />

achava nem rumo que seguia: acrecentava a noite a confusão de to<strong>do</strong>s de tal<br />

mo<strong>do</strong> que com poucas esperanças <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> não víamos mais que prováveis<br />

indícios <strong>da</strong> avizinha<strong>da</strong> morte. E suposto que Plutarco 242 disse que o varão<br />

sábio nem mu<strong>da</strong>va cores, nem temia muito, não me maravilho de que o filósofo<br />

Aristipo perdesse as cores <strong>do</strong> rosto naquela grande tempestade que teve<br />

navegan<strong>do</strong> para Corinto, ven<strong>do</strong> arrisca<strong>da</strong> a vi<strong>da</strong> ao rigor <strong>da</strong>s on<strong>da</strong>s e ao furor<br />

Árvores que formam uma aboba<strong>da</strong>.<br />

' Diog., Lib. 1.<br />

D. Aug., Lib. Queest. Evang.<br />

' Plutara, Dejustit. moral, in fine.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!