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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte I 193<br />

causa, <strong>da</strong>n<strong>do</strong> sua infelici<strong>da</strong>de matéria ao vulgo para historiarem seus discursos<br />

razões de seu discrédito, veio a cair em tão mortal enfermi<strong>da</strong>de que morreu em<br />

pouco tempo, desaniman<strong>do</strong> a gala <strong>da</strong> maior fermosura que possuía Madrid em<br />

tão breves dias.<br />

A trágica nova de sua morte deu último fim a minhas malogra<strong>da</strong>s<br />

esperanças, abriu os olhos a meu a<strong>do</strong>rmeci<strong>do</strong> sentimento, deu vivas cores às<br />

mortas sombras de meu delito. Aqui foi maravilha não me despenhar a <strong>do</strong>r a<br />

algum desespera<strong>do</strong> intento, consideran<strong>do</strong>-me causa de tantos males: pois de<br />

meu inconsidera<strong>do</strong> amor, que quis fazer violência à ventura e contrastar a<br />

sorte, naceu tão lamentável tragédia, tão irreparável <strong>da</strong>no. Eu fui a ocasião de<br />

tantas mortes, o fabrica<strong>do</strong>r de tantos infortúnios, deixan<strong>do</strong>-me aconselhar de<br />

meus próprios apetites à vista de tão manifestos desenganos; agora conheço o<br />

mal, quan<strong>do</strong> não tem reparo; enten<strong>do</strong> os perigos, quan<strong>do</strong> não admitem<br />

remédio; alcanço os desvios, quan<strong>do</strong> não há lugar de evitar os <strong>da</strong>nos.<br />

Ultimamente, por <strong>da</strong>r fim à narração que tanto me atormenta, saí <strong>da</strong><br />

corte sem temer encontros que, como já a vi<strong>da</strong> me aborrecia, não me<br />

acovar<strong>da</strong>vam temores, nem receios <strong>da</strong> morte; e deixan<strong>do</strong> as galas que trajava,<br />

vesti<strong>do</strong> neste saco pobre em que me vedes, me dispus a acabar o restante <strong>da</strong><br />

vi<strong>da</strong> em abstinência e solidão, não queren<strong>do</strong> admitir companhia, nem ser visto<br />

de quem possa conhecer-me; tal é a confusão em que me pôs o sentimento de<br />

minhas culpas que deram ocasião a tantos males. Minha habitação é aonde a<br />

noite me encontra, <strong>do</strong>micílio as covas <strong>do</strong>s montes ou a espessura <strong>do</strong>s vales,<br />

companhia o sentimento que jamais me deixa, alívio as lágrimas, que outro não<br />

procuro. Nem espereis, senhor, que vos ouça, por mais que intenteis consolar-<br />

me; que quem já como eu vivo tão desengana<strong>do</strong> <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, tão costuma<strong>do</strong> às<br />

tristezas, tão escan<strong>da</strong>liza<strong>do</strong> <strong>da</strong>s loucuras <strong>do</strong> amor, <strong>da</strong>s fermosuras <strong>da</strong> terra, é<br />

perder tempo querer <strong>da</strong>r-lhe alívio em males que não podem admitir remédio.<br />

E dizen<strong>do</strong> estas ou semelhantes palavras, se ausentou de mim com tal<br />

ligeireza que ain<strong>da</strong> que quisera <strong>da</strong>r-lhe alcance, me parece ficaria bal<strong>da</strong><strong>do</strong> o<br />

seguimento.<br />

- Notável sucesso foi esse (disse o Ermitão), que se to<strong>do</strong>s os<br />

desengana<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s vai<strong>da</strong>des <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> lhe voltassem as costas, como esse<br />

discreto espanhol tinha feito, mais ocupa<strong>da</strong>s estariam as serras e mais<br />

acompanha<strong>do</strong>s os bosques de arrependi<strong>do</strong>s que as ci<strong>da</strong>des povoa<strong>da</strong>s de

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