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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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718 Padre Mateus Ribeiro<br />

nela; e sain<strong>do</strong> hoje em terra, entrei nesta Santíssima Casa, aonde recor<strong>do</strong> as<br />

memórias de meu antigo esta<strong>do</strong>. E consideran<strong>do</strong>-me no presente em que me<br />

vedes tão incapaz de aparecer em minha pátria, nem diante de minha mãe,<br />

irmã e cunha<strong>do</strong> Salviano, pois ven<strong>do</strong>-me de antes venturoso, me vejo hoje <strong>da</strong><br />

fortuna persegui<strong>do</strong>, depois de padecer tantos trabalhos, rompeu meu<br />

sentimento em tantas lágrimas de magoa<strong>do</strong>: que tem desculpas o chorar,<br />

quan<strong>do</strong> os motivos são tão poderosos para demoverem. Chorou Eneias à vista<br />

<strong>da</strong>s ruínas de Tróia, sua pátria; chorou o grande Alexandre na morte de Clito e<br />

na de Heféstion; chorou Cipião Africano à vista <strong>do</strong>s incêndios de Cartago; e<br />

chorou el-rei D. Jaime de Aragão, o Conquista<strong>do</strong>r, de senti<strong>do</strong>, ven<strong>do</strong> que os<br />

ricos homens de seu exército o queriam deixar, e outros grandes <strong>do</strong> reino, com<br />

se partirem <strong>do</strong> sítio que tinha posto sobre a forte praça de Buriana que os<br />

mouros possuíam; e assim outros muitos choraram que deram asas à fama<br />

com seus triunfos. E à vista destes, que admiração pode causar que eu chore,<br />

ven<strong>do</strong>-me tão desluzi<strong>do</strong>? Bem disse Menandro 601 que mais se devia temer a<br />

menor afronta <strong>do</strong> que o maior perigo; porque este parava no corpo, porém a<br />

afronta na alma. O mesmo parecer seguiu Quintiliano 602 dizen<strong>do</strong> que podia<br />

antes tolerar-se a ira no rigor <strong>do</strong> que o vitupério na brandura.<br />

Lembra-me que refere Quinto Cúrcio 603 que ven<strong>do</strong>-se o brioso ateniense<br />

Dioxipo infama<strong>do</strong> diante <strong>do</strong> grande Alexandre de lhe levantarem que havia<br />

furta<strong>do</strong> <strong>da</strong> mesa <strong>do</strong> monarca uma riquíssima taça de ouro, que os invejosos<br />

inimigos de seu valor cautelosamente pelo desacreditarem esconderam,<br />

ven<strong>do</strong>-se ele sem culpa tão indecorosamente trata<strong>do</strong>, escreven<strong>do</strong> primeiro uma<br />

carta a Alexandre em que lhe manifestava sua inocência, não poden<strong>do</strong> sofrer o<br />

abatimento de sua fama, impaciente com um punhal se tirou a vi<strong>da</strong>. E lá disse<br />

o Plauto que durava mais a memória <strong>do</strong> vilipêndio <strong>do</strong> que a vi<strong>da</strong>: porque esta<br />

podia acabar-se em breve tempo, mas a memória <strong>da</strong> padeci<strong>da</strong> afronta ain<strong>da</strong><br />

depois <strong>da</strong> morte dura. Vive mais durável na lembrança <strong>do</strong>s homens o<br />

indecoroso de um infelice que o soberano de um generoso: porque as<br />

Menand., apud Stob.<br />

Quint., Decl. 15.<br />

Quint. Curt.

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