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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte II 353<br />

profanar com músicas o decoro de meu crédito e o respeito de tua pessoa, à<br />

vista desta ousadia rebentou a mina de meu coração e abriu brechas à minha<br />

voz meu sentimento, para que conheças que com ser de ti eu a ofendi<strong>da</strong>, sou<br />

incapaz de nem com os pensamentos ofender-te. Porque quem soube tanto<br />

tempo dissimular seus agravos sem queixar-se, saberá perder a vi<strong>da</strong> sem de<br />

suas obrigações esquecer-se.<br />

Suspenso me deixaram as queixas de Laura e mais quan<strong>do</strong> para<br />

testemunhar seu sentimento abrotaram as lágrimas em seus olhos, que são os<br />

ar<strong>do</strong>res mais eloquentes para persuadirem quanto intentam. Prosseguiu<br />

Vetúria, sua mãe, as razões e sentimentos <strong>da</strong> filha. Ao que eu respondi desta<br />

sorte:<br />

- Começaste, Laura, a queixar-te para suspender-me as queixas e com<br />

adiantares teu sentimento quiseste prevenir minha justa <strong>do</strong>r? Pois sabe que<br />

não há-de ser poderosa a retórica de tuas palavras para divertir minha pena;<br />

porque é ela tão eficaz que não pode ser diverti<strong>da</strong>. Queixas-te de Rosaura,<br />

porque alguma vez a visito em companhia de outros amigos. Nunca te dem<br />

cui<strong>da</strong><strong>do</strong> visitas tão públicas e acompanha<strong>da</strong>s, pois jamais para ofensa se<br />

buscam testemunhas. Se eu soubera que era teu amor tão fiscal de meus<br />

passos, jamais à corte fora; pois por te escusar o menor receio, me privara <strong>do</strong><br />

maior alívio. Mas como meu ânimo era sincero, na<strong>da</strong> cuidei menos que o que<br />

tu publicas mais. Rosaura veio à corte a pertender heranças litigiosas que de<br />

seus pais ficaram; tem muito de fácil em deixar visitar-se, mas na<strong>da</strong> de liviana<br />

em permitir ofender-se; e assim mais consiste a queixa em tua desconfiança<br />

que em minhas ousadias: que mal poderia ofender-te quem com extremos se<br />

desvelou em amar-te.<br />

Se algumas noites me recolho tarde, meus pais e a distância de caminho<br />

o ocasionaram, que como vivia em ti tão seguro meu coração, não me<br />

apressava porque não temia e sempre estava presente com os desejos, ain<strong>da</strong><br />

que estivesse ausente com as distâncias. Mas, ai Laura, que pouco confio já de<br />

minha ventura, suposto que não desconfio de tuas ver<strong>da</strong>des! Pois ouço<br />

celebrar-te com músicas, para que as repita com lágrimas. Bem conheço, de<br />

quem és, que não me ofendes; mas quem ouvir cantar à porta de um mari<strong>do</strong><br />

ausente, como se persuadirá que não dás ocasião a seres pertendi<strong>da</strong>? Que<br />

como nem to<strong>do</strong>s podem julgar o que eu de ti conheço, ela é a causa de minha

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