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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte IV 729<br />

Não esperou Leonisa que mais dissesse, assinan<strong>do</strong> a púrpura <strong>do</strong> rosto<br />

no sobressalto de ouvi-las, e me respondeu brevemente estas palavras:<br />

- Se queres, Aureliano, abonar teu querer não com palavras, mas com<br />

finezas, convém que deixes a amizade de teu amigo Alexandre, pois seu pai foi<br />

sempre inimigo declara<strong>do</strong> de meu tio, como sabes, e não convém que tua<br />

amizade possa comunicar meus segre<strong>do</strong>s a quem é tão contrário à nossa<br />

família. Verei agora se estimas em mais sua amizade, se meu gosto.<br />

Dizen<strong>do</strong> isto, voltou as costas sem mais querer ouvir-me, porque a sua<br />

gente a buscá-la vinha. Considerai, senhores, a suspensão em que eu ficaria,<br />

ven<strong>do</strong>-me cerca<strong>do</strong> de <strong>do</strong>us extremos, para que por um deles cortasse. Era<br />

Alexandre meu grande amigo desde os prelúdios de nossa i<strong>da</strong>de na tironice<br />

<strong>do</strong>s anos, haven<strong>do</strong>-nos cria<strong>do</strong> como irmãos na escola e no esta<strong>do</strong>. Era <strong>da</strong><br />

principal família na nobreza e morga<strong>do</strong> rico nas possessões, mui visto nas<br />

letras humanas e finalmente o particular amigo que tinha. E haver de quebrar<br />

com ele sem causa, porque nenhuma havia, nem razão ao discurso de tantos<br />

anos de ver<strong>da</strong>deira amizade, parecia desairoso proceder, mais ocasiona<strong>do</strong> às<br />

censuras de to<strong>do</strong>s que às desculpas <strong>do</strong>s discretos. Por outra parte, via o<br />

rigoroso preceito de Leonisa, legisla<strong>do</strong>ra de meus cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s, em que me<br />

ordenava sacrificasse nas aras de seu querer o estima<strong>do</strong> de meu pun<strong>do</strong>nor,<br />

em quebrar sem fun<strong>da</strong>mento com um amigo tão antigo e merece<strong>do</strong>r de ser<br />

preza<strong>do</strong>.<br />

Nestas tréguas penosas em que se ocupava meu discurso, sem<br />

deliberar-me no que faria, passei <strong>do</strong>us dias tão melancólico que veio Alexandre<br />

a reparar em minha tristeza pelo hábito em que estava de mostrar-me alegre.<br />

Importunou-me com rogos e perguntas os motivos que podiam <strong>da</strong>r-se de estar<br />

eu tão triste, e fez tanta instância que, ven<strong>do</strong> eu que o tempo ao fim havia de<br />

descifrar o oculto desta batalha que na oculta campanha de meu peito se <strong>da</strong>va<br />

entre a razão e o querer, pois persuadia ao mesmo que a razão condenava, lhe<br />

vim a manifestar ser a causa o que havia passa<strong>do</strong> com Leonisa. Ouviu-me<br />

atento Alexandre a inadverti<strong>da</strong> informação que lhe dei, mais arrojo de quem<br />

amava que discursa<strong>do</strong> acerto de quem entendia. E depois de suspender um<br />

pouco a resposta, me disse assim:

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