17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte VI 963<br />

ordinário se manifestam no rosto como em janelas a que aparecem as mágoas<br />

interiores; ele lhe respondeu que estava pesaroso de minha ausência, por<br />

perder em mim a companhia de um amigo honra<strong>do</strong> e proveitoso, que na<br />

academia lhe tinha granjea<strong>do</strong> muitos e assistin<strong>do</strong>-lhe com grande satisfação, e<br />

que a chama<strong>do</strong> de sua mãe intentava partir-se na manhã seguinte. Logo como<br />

discreta entendeu Fenisa que os motivos desta ausência eram tomar uma<br />

desespera<strong>da</strong> vingança de seu ingrato desdém, com que se havia mostra<strong>do</strong> tão<br />

esquiva às finezas que em meus escritos publicava.<br />

Consolou a seu irmão <strong>do</strong> pesar que mostrava com dizer-lhe que<br />

porventura não estaria minha parti<strong>da</strong> tão apressa<strong>da</strong> como dizia e que podia<br />

chegar-me novo aviso para que me dilatasse, porque de uma hora para outra<br />

se mu<strong>da</strong>m os pareceres e variam as ocasiões. Com isto se retirou e<br />

secretamente pela cria<strong>da</strong> que havia si<strong>do</strong> mensageira <strong>do</strong>s meus escritos, me<br />

man<strong>do</strong>u um reca<strong>do</strong> em que dizia que sem falta essa noite lhe viesse falar ao pé<br />

de um janela que caía sobre o muro <strong>do</strong> seu jardim. Sempre costuma seguir a<br />

admiração ao não espera<strong>do</strong>: escrupulizava o desusa<strong>do</strong> favor, o crédito à<br />

ver<strong>da</strong>de, arguin<strong>do</strong> instâncias ao felice, porque a um desgraça<strong>do</strong> não é fácil de<br />

crer uma ventura. Informei-me <strong>da</strong> mensageira se era sonho com que queria<br />

divertir-me ou se era ver<strong>da</strong>de com que pretendia obrigar-me. Porém confirmou<br />

ser o reca<strong>do</strong> que Fenisa lhe dera assim como o referia. Lá disse Quintiliano 984<br />

que há ver<strong>da</strong>des a quem fazem suspeitosas ou a enti<strong>da</strong>de ou o árduo <strong>do</strong>s<br />

acidentes, e que nunca alcançam cabal crédito senão depois de executa<strong>da</strong>s,<br />

parecer que seguiu também Plínio 985 .<br />

Quem havia de crer que Fenisa, a gala mais singular <strong>da</strong> beleza, a<br />

isenção maior <strong>da</strong> tirania, o mais senhoril desprezo <strong>do</strong>s cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s, o mais altivo<br />

desdém <strong>da</strong> fi<strong>da</strong>lguia, o escân<strong>da</strong>lo mais belo <strong>da</strong> ingratidão, to<strong>da</strong> rosa pela<br />

fermosura e to<strong>da</strong> espinhos pelo rigor, e que em poucos anos de i<strong>da</strong>de lograva<br />

em seu rosto as flores <strong>da</strong>s despedi<strong>da</strong>s de Abril e as primícias <strong>da</strong>s entra<strong>da</strong>s de<br />

Maio, e finalmente quem suspendia as ousadias ao mais delica<strong>do</strong> pincel, ain<strong>da</strong><br />

que o de Apeles fosse, para poder copiar assombros de fermosura que não<br />

tem imitação, depois de tantas esquivanças havia de querer falar-me e de novo<br />

Quint., Lib. 4.<br />

Plin. Sen., Lib. 8.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!