17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

530 Padre Mateus Ribeiro<br />

parece lhe protestavam que ain<strong>da</strong> não era tempo de declarar-se, pela<br />

resistência grande que faziam, a usar de seus brilhantes privilégios o dia.<br />

Enfim, como quem mais pode, sempre vence, luziu o dia, apesar <strong>da</strong>s nuvens, e<br />

reforçan<strong>do</strong> o sol a vanguar<strong>da</strong> <strong>do</strong>s raios, desfez o espesso e desterrou o raro,<br />

de sorte que <strong>da</strong> mais escura noite nasceu o mais alegre dia.<br />

Tinha eu caminha<strong>do</strong> bastante jorna<strong>da</strong>, e molesta<strong>do</strong> <strong>do</strong> cansaço e <strong>da</strong><br />

pena que me acompanhava neste caminho, ven<strong>do</strong> o ameno de uma fonte que<br />

em leito de espa<strong>da</strong>na e pavelhão de verdes ramos mais murmurava <strong>do</strong> que<br />

<strong>do</strong>rmia, me retirei a tomar algum alívio para poder continuar a jorna<strong>da</strong> que a<br />

Ravena, minha pátria, e a ver minha mãe se dirigia. Aqui consideran<strong>do</strong> as<br />

mu<strong>da</strong>nças de minha fortuna, larguei as rédeas ao sentimento, provocan<strong>do</strong>-me<br />

a sole<strong>da</strong>de <strong>do</strong> sítio e o arroio que <strong>da</strong> fonte nascia, que tão veloz caminhava, e<br />

assim lhe disse:<br />

- Bem parece, apressa<strong>do</strong> arroio, que não sentes nem o bem que<br />

perdes, nem o <strong>da</strong>no que buscas, pois te ausentas <strong>do</strong> berço em que nasces,<br />

para buscar no mar a sepultura em que morres! Deixas a pátria pelas terras<br />

estranhas, o abrigo <strong>da</strong> fonte que te cria pelo desabri<strong>do</strong> <strong>da</strong>s on<strong>da</strong>s que te<br />

esperam. Oh quanto melhor te fora parares nativo arroio que aspirares em<br />

terras alheias a ser rio, pois te conservaras no que te deu a natureza, sem<br />

experimentares os disfavores <strong>da</strong> ventura! Quanto melhor me fora viver na<br />

companhia de minha mãe que procurar valimento de príncipes estranhos. Na<br />

pátria tinha amigos e era estima<strong>do</strong>; hoje me vejo sem amigos e persegui<strong>do</strong>.<br />

Que o empera<strong>do</strong>r Tibério matasse a Sejano, seu vali<strong>do</strong>, e Cómo<strong>do</strong> a Perrénio,<br />

seu priva<strong>do</strong>, não foi a maior prova de sua cruel<strong>da</strong>de, porque seus deprava<strong>do</strong>s<br />

procedimentos lho tinham mereci<strong>do</strong>.<br />

Mas em que ofendi eu ao duque para que como a sedicioso delinquente<br />

me procure com prémios para tirar-me a vi<strong>da</strong>? Este prémio alcancei de deixar<br />

minha pátria e mãe para servi-lo? Mas quem <strong>do</strong>s valimentos <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> pode<br />

fazer confianças? São as vontades <strong>do</strong>s reis e príncipes mudáveis e é edificar<br />

sobre areia privança que se fun<strong>da</strong> em humanas vontades, chuva de estio e sol<br />

de Inverno, canto de rouxinol de pouca dura, exalação que se apaga quan<strong>do</strong><br />

resplandece, rosa que aljofra<strong>da</strong> nasce e na tarde desmaia<strong>da</strong> se murcha, mimo<br />

<strong>da</strong> aurora e lástima <strong>da</strong> noite, gala <strong>do</strong> pra<strong>do</strong> e despojos <strong>do</strong> campo. Tal o esperar<br />

firmezas arbítrios <strong>da</strong> mu<strong>da</strong>nça é engano.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!