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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte III 473<br />

de seus combates? As naus impeli<strong>da</strong>s <strong>do</strong> furor <strong>da</strong>s on<strong>da</strong>s, mal resistin<strong>do</strong> a<br />

quem mais podia, seguiam violenta<strong>da</strong>s a derrota, não a que os pilotos queriam,<br />

mas a que a tormenta man<strong>da</strong>va, e perden<strong>do</strong>-nos de vista, em poucas horas<br />

foram tão vários os rumos em que seguimos que a de Lotário nunca foi mais<br />

vista, nem houve nova certa se a sumergiu o mar ou a destroçou a costa, pois<br />

dela se não teve té o presente notícia. Segui eu os rumos <strong>da</strong> fortuna, que nas<br />

<strong>do</strong> mar é o roteiro mais certo não seguir roteiro: avizinhou-se a noite, se já no<br />

escuro <strong>da</strong> tormenta se não tinha despedi<strong>do</strong> o dia; cerraram-se as trevas mais<br />

que nunca tristes; fuzilaram os relâmpagos para nos mostrarem mais o perigo,<br />

não para nos aliviarem a pena; os brami<strong>do</strong>s <strong>do</strong> mar cresciam a desafio com os<br />

ventos; fraquejavam as antenas; amontoavam-se as on<strong>da</strong>s converten<strong>do</strong>-se em<br />

montes, assaltan<strong>do</strong> os costa<strong>do</strong>s com tal ímpeto que muralhas reforça<strong>da</strong>s mal<br />

resistiriam seus combates, quanto mais brea<strong>da</strong>s tábuas de uma nau mal<br />

segura.<br />

Pareceu-nos a noite a mais dilata<strong>da</strong> sobre a mais penosa: não se viu<br />

estrelas, que as tinha prisioneiras o nubla<strong>do</strong> escuro em cárcere de sombras;<br />

rasgou-se o farol com as cargas cerra<strong>da</strong>s <strong>do</strong> vento, que como a mais luzi<strong>do</strong><br />

nele se empregavam e ficou participan<strong>do</strong> <strong>da</strong> desgraça quem se isentava como<br />

favoreci<strong>do</strong> <strong>da</strong> ventura. Os marinheiros assusta<strong>do</strong>s com o temor desconfiavam<br />

de evitar o perigo, e assim desalenta<strong>da</strong>s as esperanças, ain<strong>da</strong> o pouco que<br />

obravam luzia menos, porque tu<strong>do</strong> o que se faz sem esperança leva consigo o<br />

desgosto por companhia. É a alegria e gosto aju<strong>da</strong> <strong>da</strong>s operações, nunca<br />

parecen<strong>do</strong> vitais as que se obram com o desgosto e tristeza. Assim disse o<br />

Séneca 458 que convém quem obra estar alegre e confia<strong>do</strong>, porque o ânimo <strong>da</strong>s<br />

esperanças desfaleci<strong>do</strong> na<strong>da</strong> obra com acerto. Por isso disse São Bernar<strong>do</strong> 459<br />

que desejava sempre ver os ânimos alegres; pois assim como a tristeza é<br />

veneno <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, assim é morte <strong>da</strong>s acções que com ela se emprendem. Não de<br />

outra sorte os marinheiros e oficiais <strong>da</strong> combati<strong>da</strong> nau acudiam a suas<br />

obrigações, tão desconfia<strong>do</strong>s <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> e tão senhorea<strong>do</strong>s <strong>da</strong> desconfiança <strong>do</strong><br />

perigo evidente em que se viam que tu<strong>do</strong> quanto trabalhavam luzia pouco,<br />

porque o temor <strong>da</strong> morte em to<strong>do</strong>s avultava muito.<br />

Senec, Epist. 23.<br />

S. Bem., Ser. 4. Sup. Ps. Qui habitat.

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