17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte II 317<br />

Atento ouviu o vice-rei a Juliano, que é prelúdio <strong>da</strong> ventura de um réu o<br />

atender o juiz a ouvi-lo; pois é cousa dura, como disse Aristóteles 321 , o não<br />

poder uma pessoa nem com as armas, nem com as palavras defender-se, o<br />

que sem ser ouvi<strong>do</strong> mal pode conseguir-se. Quasi que quis assomar-se aos<br />

olhos a compaixão, mas soube-a dissimular com colar ao rosto a viseira <strong>da</strong><br />

severi<strong>da</strong>de para encobri-la; que é razão de esta<strong>do</strong> <strong>da</strong> majestade ter a mágoa<br />

no coração como particular e mostrar o rigor no exterior como público juiz e<br />

superior. Tal se ostentou o vice-rei com o preso, dizen<strong>do</strong>:<br />

- Bem pudera eu, ingrato e atrevi<strong>do</strong> Juliano, man<strong>da</strong>r-te logo <strong>da</strong>r o<br />

castigo que teu delito merece; mas dilatá-lo-ei para informar-me se ao crédito<br />

de Lucin<strong>da</strong> falta alguma cousa para cabalmente satisfazer-se: a quem podes<br />

agradecer este breve espaço de tempo que tua vi<strong>da</strong> durar.<br />

E, dizen<strong>do</strong> isto, o man<strong>do</strong>u levar ao cárcere público de Nápoles, onde<br />

ficou a bom reca<strong>do</strong> preso.<br />

Sempre as dilações à execução <strong>do</strong> castigo são como recebi<strong>do</strong>s<br />

embargos <strong>da</strong> pie<strong>da</strong>de: que o primeiro degrau <strong>do</strong> templo <strong>da</strong> clemência é<br />

suspender por qualquer espaço os rigores <strong>da</strong> justiça. Se o grande Alexandre<br />

tão acelera<strong>da</strong>mente não man<strong>da</strong>ra tirar a vi<strong>da</strong> ao inocente Orsines por<br />

testemunhos <strong>do</strong> eunuco Bagoas, nunca deixara esse labéu a suas glórias. Pois<br />

é certo que se primeiro o ouvira, não o matara, ou se a execução dilatara,<br />

Orsines sem culpa não morrera. Assim se entendeu que a compaixão<br />

encerra<strong>da</strong> no peito <strong>do</strong> vice-rei tomou por motivo, e com razão, o crédito e<br />

reputação <strong>da</strong> pessoa ofendi<strong>da</strong>: que há castigos que servem só de punir o delito<br />

e não de satisfazer o <strong>da</strong>no. Com estes pretextos obra talvez a pie<strong>da</strong>de,<br />

valen<strong>do</strong>-se <strong>da</strong> máscara <strong>da</strong> justiça; que é a melhor razão de esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> favor o<br />

saber valer-se <strong>da</strong> justiça para a clemência, pois sem faltar no que deve às<br />

demonstrações de justo, obra muitas o que o desejo compassivo. Neste esta<strong>do</strong><br />

ficam em Nápoles os negócios, esperan<strong>do</strong>-se a chega<strong>da</strong> <strong>do</strong> senhor Camilo e<br />

<strong>da</strong> senhora Lucin<strong>da</strong>, sua filha, para com isso se sentenciar Juliano. Sobre o<br />

que os pareceres são vários no vulgo; porque uns o fazem sem dúvi<strong>da</strong> com<br />

sua chega<strong>da</strong> sentencia<strong>do</strong> à morte e outros apelan<strong>do</strong> para sua pie<strong>da</strong>de o fazem<br />

livrar com vi<strong>da</strong>.<br />

Arist., Rhetor. 1.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!