17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte IV 619<br />

me partira de tua vista se só te considerara ingrata, mas <strong>do</strong>bra-se meu<br />

sentimento quan<strong>do</strong> te julgo só para <strong>da</strong>no meu desentendi<strong>da</strong>; pois que cerran<strong>do</strong><br />

os olhos ao desacerto que aprovas, obras não só como ingrata ao que me<br />

deves, mas juntamente como néscia ao que admites.<br />

Confias de Júlio que a solicitar-te com tantas instâncias para esposa o<br />

persuade o amor e não o interesse? Ou que haja de ser amante quem já<br />

nasceu inimigo? E sen<strong>do</strong> (como ensina Aristóteles) o costume a segun<strong>da</strong><br />

natureza, haja Júlio de mu<strong>da</strong>r juntamente a natureza e o costume? E o que não<br />

acabaram tantos anos de hostili<strong>da</strong>des, haja de acabar um dia de desposório?<br />

Se de antes o amavas, para que me enganavas? E se o aborrecias, para que<br />

em meu <strong>da</strong>no te sacrificas? Mas bem conheço que uniu em ti minha desgraça<br />

quereres o mesmo que aborreces e seguires o próprio de que foges, pois<br />

contra um infelice fazem liga os mesmos impossíveis. Fica-te embora para<br />

sempre, e permita o Céu que te logres dilata<strong>do</strong>s anos, para que conheças que<br />

me deves mais finezas quan<strong>do</strong> ofendi<strong>do</strong> <strong>do</strong> que eu te devo prémios quan<strong>do</strong><br />

mais obriga<strong>do</strong>.<br />

Com isto quis sair <strong>da</strong> sala em que lhe falava, ao tempo que ela<br />

intentan<strong>do</strong> responder-me, violenta<strong>da</strong> de um acidente, caiu desmaia<strong>da</strong> nos<br />

braços de uma cria<strong>da</strong> que com ela presente assistia. Tão endureci<strong>do</strong> estava<br />

meu coração que não reparei em ausentar-me, deixan<strong>do</strong>-a com as cores<br />

perdi<strong>da</strong>s, emudeci<strong>da</strong> a voz e desalenta<strong>do</strong> o vital, se a cria<strong>da</strong> me não dera<br />

vozes, dizen<strong>do</strong> parecer excesso de cruel<strong>da</strong>de, deixan<strong>do</strong> a sua senhora com a<br />

vi<strong>da</strong> arrisca<strong>da</strong>, ausentar-me sem ouvi-la. Pareceu-me a petição pie<strong>do</strong>sa, que<br />

ao fim de poucas rogativas necessita um coração entre amante e ofendi<strong>do</strong>.<br />

Suspendi a saí<strong>da</strong>, mais de compassivo que de arrependi<strong>do</strong>; porque nem estava<br />

inexorável ao pie<strong>do</strong>so, nem de to<strong>do</strong> flexível ao comedi<strong>do</strong>, como tão magoa<strong>do</strong>.<br />

Veio apressa<strong>da</strong> outra cria<strong>da</strong> com água, com que em miú<strong>do</strong> orvalho rocian<strong>do</strong>-<br />

Ihe o desmaia<strong>do</strong> rosto, abriu os olhos para derramar copiosas lágrimas: que é<br />

proprie<strong>da</strong>de <strong>da</strong> aurora banhar-se nelas, e até no lacrimável pareceu aurora.<br />

Acudiu o coração com esta epítima (a) ao desafogo <strong>da</strong> <strong>do</strong>r, para na<strong>da</strong> moderar-<br />

Ihe o sentimento <strong>da</strong> aflição, como diz Euripides, que se de to<strong>do</strong> não tivera este<br />

Port. Rest.: remédio tópico confortativo.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!