17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Alívio de tristes e consolação de queixosos - Parte I 209<br />

suave, as iguarias mais saborosas não podem alegrar a quem se teme, não<br />

costumam satisfazer a quem se receia, antes em meio <strong>da</strong>s maiores delícias<br />

que goza lhe dão penoso rebate as adversi<strong>da</strong>des e males [de] que foge; como<br />

não direi que o contínuo sobressalto que a vossos ofensores como sombra<br />

segue é castigo rigoroso e pena mereci<strong>da</strong> de seu delito? Nem vosso desleal<br />

ofensor sofrerá menos desvelos, consideran<strong>do</strong> as muitas livian<strong>da</strong>des dessa<br />

desleal companhia que o segue; porque não é de crer que haja de guar<strong>da</strong>r<br />

fideli<strong>da</strong>de a um estranho quem se mostrou tão falta a seu próprio esposo: ele<br />

lhe <strong>da</strong>rá tantos motivos de sentimento que porventura não serão os menores<br />

verdugos de sua alegria. Que confiança terá de que lhe seja firme quem a seu<br />

mesmo esposo se mostrou inconstante? E assim se vossa ingrata esposa dele<br />

é ama<strong>da</strong>, tenho quasi por impossível não lhe servir de um contínuo tormento<br />

que com temores de lhe ser falsa o inquiete; e se porventura já não ama, que<br />

maior castigo quereis a esta mulher que haver de seguir e servir como escrava<br />

a pessoa de quem em lugar de ser ama<strong>da</strong> se há-de considerar aborreci<strong>da</strong>? E<br />

nas lembranças <strong>do</strong> sossego que perdeu em vossa companhia terá muito que<br />

sentir e muito que sofrer.<br />

Viverão sem <strong>do</strong>micílio próprio que possam avaliar por asilo seguro,<br />

continuamente peregrinan<strong>do</strong> e sempre temen<strong>do</strong>. Não refiro os perigos em que<br />

continuamente hão-de ver-se, caminhan<strong>do</strong> terras estranhas com perigos de<br />

saltea<strong>do</strong>res nos campos, de olhos ociosos nos povoa<strong>do</strong>s; que não é limita<strong>do</strong><br />

risco para quem caminha com mulher fermosa e moça, aonde em gente<br />

inquieta desejos de gozá-la podem ocasionar tantos perigos à sua vi<strong>da</strong>. Não<br />

trato <strong>do</strong>s assaltos de piratas no mar ou <strong>da</strong>s justiças na terra, as companhias<br />

falsas, os ânimos cautelosos com quem a maior inocência jamais vive segura,<br />

quanto mais uma malícia tão culpa<strong>da</strong>; finalmente me persua<strong>do</strong> a que tem na<br />

duração de tão inquieta e penosa vi<strong>da</strong> maior castigo <strong>do</strong> que lhe pudera <strong>da</strong>r<br />

qualquer breve morte.<br />

- Tanto tem vossos acerta<strong>do</strong>s discursos (disse o Peregrino) alivia<strong>do</strong><br />

meu sentimento, que vos afirmo me sinto consola<strong>do</strong> de sorte que já me não<br />

inquietam vinganças, nem desvelam castigos. E pois que o amor <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> me<br />

tem desengana<strong>do</strong> no melhor <strong>do</strong>s anos, <strong>do</strong> pouco que deve ser busca<strong>do</strong> de<br />

quem seus enganos conhece, tratarei de hoje em diante de empregar meu<br />

amor em Deus, a quem to<strong>da</strong>s as finezas se devem e com tanta vantagem as

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!