17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

682 Padre Mateus Ribeiro<br />

pobreza e humilde <strong>da</strong> família, se era diamante na fermosura, não o ficava<br />

sen<strong>do</strong> na estimação.<br />

Cursava eu neste tempo os estu<strong>do</strong>s <strong>da</strong>s Humanas Letras com muita<br />

satisfação e ain<strong>da</strong> com inveja de outros discípulos a quem se adiantava meu<br />

talento. Entrei na Filosofia, finalizei-a com aplauso e fruto de meus desvelos,<br />

em tempo que tinha vinte e <strong>do</strong>us anos de i<strong>da</strong>de; minha irmã Estela vinte. Havia<br />

em Perúsia um mancebo ilustríssimo no sangue e mui rico no morga<strong>do</strong> que<br />

possuía, chama<strong>do</strong> Salviano, filho único de uma senhora viúva, que se chamava<br />

Laurência, <strong>da</strong> mais ilustre e antigua fi<strong>da</strong>lguia <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de, que neste só filho, que<br />

de seu defunto esposo lhe ficara, consolava as sau<strong>do</strong>sas lembranças de seu<br />

defunto esposo. Era Salviano mui cortês e ajuiza<strong>do</strong>, mui liberal, com que tinha<br />

adquiri<strong>do</strong> muitos amigos. Que é a liberali<strong>da</strong>de, como diz Cícero, a arte com que<br />

as vontades se obrigam e os amigos se granjeiam. Seria Salviano de vinte e<br />

cinco anos de i<strong>da</strong>de quan<strong>do</strong> pôs os olhos em minha irmã Estela, fican<strong>do</strong> em<br />

Salviano limita<strong>do</strong>s to<strong>do</strong>s os encarecimentos para exagerá-la; porque os<br />

maiores hipérboles eram pequenos panegíricos para louvá-la. Deixou-se ver<br />

Estela, quan<strong>do</strong> pudera encobrir-se, não preven<strong>do</strong> os perigos, e por isso não<br />

escondeu as luzes; levou-se <strong>da</strong>s lisonjas, ten<strong>do</strong> por crédito <strong>da</strong> fermosura o ser<br />

de tal sujeito corteja<strong>da</strong>, não advertin<strong>do</strong> que traz a desigual<strong>da</strong>de o abatimento<br />

no mesmo que se julga soberania. Ofereceu-se Salviano que seria seu esposo;<br />

mas duvi<strong>do</strong>sa se mostrou minha irmã <strong>do</strong> parti<strong>do</strong>, acção em que se mostrou o<br />

muito que era ajuiza<strong>da</strong>, não <strong>da</strong>n<strong>do</strong> crédito facilmente à ventura com escrúpulos<br />

de poder ser engana<strong>da</strong>. Respondeu-lhe que se os intentos que publicava eram<br />

ver<strong>da</strong>deiros, os tratasse com meu pai, porque sem seu consentimento<br />

nenhuma promessa admitia.<br />

Impaciente se mostrou Salviano <strong>da</strong>s dilações ao desejo; replicou uma<br />

vez e outra, mas sem fruto: porque foi mais poderosa em Estela a cautela de<br />

assegurar-se <strong>do</strong> que em Salviano a promessa repeti<strong>da</strong> para demovê-la.<br />

Resoluto enfim o amante a <strong>da</strong>r notícia a meu pai de seus intentos, e<br />

juntamente a mim, por parecer-lhe que meu pai não <strong>da</strong>ria resposta sem<br />

consultá-la comigo, nos man<strong>do</strong>u chamar um dia, para que em sua casa<br />

fossemos falar-lhe sobre um negócio que lhe importava comunicar connosco.<br />

Como era pessoa tão ilustre e de to<strong>do</strong>s tão respeita<strong>do</strong>, obedecemos a ir buscá-<br />

lo, duvi<strong>da</strong>n<strong>do</strong> que negócio poderia ser este, porque de seu amor estávamos

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!