17.04.2013 Views

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

996 Padre Mateus Ribeiro<br />

- Que pouco venturoso posso dizer que nasci, pois não ten<strong>do</strong> que<br />

formar queixas <strong>da</strong> natureza, tive por madrasta a fortuna; e quan<strong>do</strong> pudera ser<br />

de muitos inveja<strong>do</strong>, venho a ficar agora de to<strong>do</strong>s invejoso. Que seja poderosa<br />

uma moça vassala de meu pai para desprezar-me! Que haja eu de perder por<br />

grande, o que outro poderá alcançar por ser menos! Que quan<strong>do</strong> se costuma<br />

dizer que à grandeza tu<strong>do</strong> é possível, ache eu to<strong>do</strong> o impossível na grandeza!<br />

Oh pena incapaz de ser cri<strong>da</strong>! Oh <strong>do</strong>r impossível de publicar-se! Que montes<br />

Rifeus produziram esta neve com alma, este penhasco duro com vi<strong>da</strong>? Tão<br />

altiva para nascer vassala que chega com seu brio a avassalar ao mais altivo?<br />

Que não fossem poderosas tantas finezas para lavrarem a dureza deste<br />

diamante? Que não bastasse tão vivo rendimento de minha vontade para<br />

render uma vontade tão cruel? Que estu<strong>da</strong>sse na academia de sua isenção<br />

lições de tão briosa e tão tirana que fiquem meus brios parecen<strong>do</strong> as mais<br />

humildes sujeições? Que com oferecer-me para ser seu esposo, me desestime<br />

como se fora escravo, e que sen<strong>do</strong> filho de um potenta<strong>do</strong>, me julgue por<br />

incapaz de ser seu esposo? Se me reprova por grande, por que não me teme<br />

ofendi<strong>do</strong>? Não receia que se converta em aborrecimento por despreza<strong>do</strong> um<br />

querer que foi tão fino por amante? E que chegue a parecer delírio, o que de<br />

antes eleição de ajuiza<strong>do</strong>?<br />

Ela não há-de casar com outro, pois se não prezou de casar comigo;<br />

bem poderei considerá-la religiosa, mas não casa<strong>da</strong>, pois em pouco estimará a<br />

vi<strong>da</strong> quem chegar a pretendê-la por esposa, que não se diferençará o tálamo<br />

<strong>do</strong> sepulcro. Vingarei meu sentimento em suas esperanças, curarei minhas<br />

penas com suas mágoas e meus desgostos com seus pesares. Não imagine<br />

esta tirana que há-de fazer maior minha desgraça com acrescentar em outro a<br />

ventura, porque não há-de gloriar-se outro de possuir com segurança o que eu<br />

não pude alcançar com merecimentos. Pois considere que quanto subi<br />

aman<strong>do</strong>, posso descer de um salto aborrecen<strong>do</strong>; porque o amor sobe por<br />

degraus e o aborrecimento de um golpe desce tu<strong>do</strong>. Acerto foi que não me<br />

visse Bolonha descoberto, senão desconheci<strong>do</strong>, porque não me visse agora<br />

retirar tão desluzi<strong>do</strong>, que só <strong>da</strong>s sombras escuras <strong>da</strong> noite posso confiar meus<br />

pesares; porque as luzes <strong>do</strong> dia são teatro e proscénio para quem venturoso<br />

representa suas alegrias, e não para quem sente em seu coração tão vivas<br />

tristezas. Esta noite me partirei a Módena, mas meu sentimento <strong>da</strong>rá depois

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!