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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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270 Padre Mateus Ribeiro<br />

as letras, servin<strong>do</strong> a um fi<strong>da</strong>lgo de pajem no estu<strong>do</strong>, por meu pai não poder<br />

sustentar-me nele, que em poucos anos aju<strong>da</strong>n<strong>do</strong> o desvelo ao natural e o<br />

desejo de valer ao repeti<strong>do</strong> cui<strong>da</strong><strong>do</strong> de estu<strong>da</strong>r, de vinte e cinco anos de i<strong>da</strong>de<br />

fui gradua<strong>do</strong> em leis e com aplausos de opositor às cadeiras desta facul<strong>da</strong>de,<br />

com invejas <strong>do</strong>s que comigo estu<strong>da</strong>vam e adianta<strong>do</strong> tanto me viam.<br />

Já minhas esperanças se prometiam despacha<strong>da</strong>s com os lugares<br />

melhores, que é talvez a fama corretora <strong>da</strong>s venturas e a primeira que<br />

despacha na estimação, a quem engrandece. Quem diria, senhores, que tal<br />

mu<strong>da</strong>nça se desse que <strong>da</strong>s universi<strong>da</strong>des decesse às montanhas, de julga<strong>do</strong>r<br />

a temer ser julga<strong>do</strong>, de professor <strong>da</strong>s Leis a temer seus rigores e de aplaudi<strong>do</strong><br />

por letra<strong>do</strong> a ser temi<strong>do</strong> por ban<strong>do</strong>leiro; tal mu<strong>da</strong>nça <strong>da</strong> fortuna só em mim<br />

pudera achar-se, porque nasci para exemplo de sua inconstância. Socorria eu<br />

a meus pais com o que podiam granjear meus contínuos estu<strong>do</strong>s, que como<br />

tão lisonjea<strong>do</strong> <strong>da</strong> fama to<strong>do</strong>s se me <strong>da</strong>vam por amigos e me ofereciam<br />

dádivas, consultan<strong>do</strong>-me em negócios e pedin<strong>do</strong>-me arrazoa<strong>do</strong>s em causas de<br />

importância, ten<strong>do</strong> como por oráculos meus escritos, e assim nem a mim me<br />

faltava com que passar a vi<strong>da</strong> com autori<strong>da</strong>de, nem <strong>do</strong> que eu lhes enviava a<br />

meus pais e irmã com que poderem viver com mais largueza.<br />

Sucedeu pois, para desgraça de to<strong>do</strong>s, que o conde Roberto,<br />

ilustríssimo no sangue, rico e grandioso no esta<strong>do</strong>, aparenta<strong>do</strong> com o melhor<br />

de Itália, mancebo arroja<strong>do</strong> nas ousadias e temerário nas empresas, visse um<br />

dia, an<strong>da</strong>n<strong>do</strong> à caça, a minha irmã Claudiana, e informa<strong>do</strong> de quem eram seus<br />

pais, desprezan<strong>do</strong> o humilde <strong>do</strong> exercício camponês em que viviam, suborna<strong>do</strong><br />

<strong>da</strong> rara fermosura de sua vista, quis solicitar seu amor tão publicamente que<br />

não reparan<strong>do</strong> no deslustre que à fama de minha irmã causava com as<br />

contínuas assistências em lugar pequeno, aonde até os pensamentos se<br />

registam, quanto mais as acções indecorosas se murmuram; nem reparan<strong>do</strong><br />

no respeito que se devia à presença de meus pais, continuou tão insolente em<br />

<strong>da</strong>r-lhe músicas de noite, em passeá-la de dia, que ven<strong>do</strong> os mensageiros que<br />

man<strong>da</strong>va trazerem de minha irmã as respostas tão desabri<strong>da</strong>s, como merecia<br />

seu desaforo, por ser naturalmente Claudiana de vi<strong>da</strong> recolhi<strong>da</strong> e zelosa de<br />

sua reputação e honesta fama; que desespera<strong>do</strong> se resolveu a furtá-la de casa<br />

de meus pais, intentan<strong>do</strong> que conquistasse a violência a inteireza que não<br />

podia vencer a brandura.

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