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o caso mateus ribeiro - Repositório Aberto da Universidade do Porto

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382 Padre Mateus Ribeiro<br />

Livres corriam os rios <strong>da</strong>s vagarosas prisões de neve e grilhões de<br />

cristal em que tanto tempo os tinha embarga<strong>do</strong> o Inverno, rigoroso executor e<br />

acre<strong>do</strong>r inexorável, e <strong>da</strong>s próprias correntes, que de antes o prendiam, faziam<br />

correntes com que caminhavam ou, para melhor dizer, corriam; que em passos<br />

tão apressa<strong>do</strong>s mais parece o movimento fugi<strong>da</strong> de quem se teme que jorna<strong>da</strong><br />

de quem caminha. Murmuravam as fontes mais por costume que por causa<br />

(que não necessita desta quem tem o murmurar por costume) e com ambições<br />

de aspirarem a rios se esqueciam de serem fontes; que sempre se descui<strong>da</strong><br />

em conhecer-se, quem ambicioso a mais subir se arroja.<br />

Tinham feito tréguas entre si o Inverno e o Estio para suspenderem as<br />

armas <strong>da</strong>s setas <strong>do</strong> frio e os raios <strong>do</strong> calor com que sempre à campanha<br />

saíam; e as árvores, que tinham senti<strong>do</strong> as hostili<strong>da</strong>des <strong>do</strong> frio no despojo <strong>da</strong>s<br />

galas, agora na suspensão <strong>da</strong>s armas recompensan<strong>do</strong> o roubo de novo se<br />

vestiam, deixan<strong>do</strong> em discreta suspensão para saber avaliar-se se foi menos o<br />

que perderam, se o que de novo lograram. Neste pois alegre tempo, que se lhe<br />

não competia o título de século <strong>do</strong>ura<strong>do</strong>, ao menos não se lhe podia negar o<br />

privilégio de século flori<strong>do</strong>, agra<strong>do</strong> <strong>da</strong> vista, lisonja <strong>do</strong> tempo, delícias <strong>do</strong> ano,<br />

recreio <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, breve quan<strong>do</strong> se logra e dilata<strong>do</strong> quan<strong>do</strong> se sente perdi<strong>do</strong>, de<br />

pouca duração nas posses como to<strong>da</strong>s as alegrias <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, de quem diz São<br />

Cipriano que como sombra passam pelo pouco que perseveram; pediu um dia<br />

Dionísio a seu companheiro Felisberto quisesse acompanhá-lo a uma romaria<br />

que tinha prometi<strong>do</strong> havia já tempo à milagrosa casa e admirável santuário,<br />

honra de Itália e tesouro inestimável <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> to<strong>do</strong>, a camera angelical <strong>da</strong><br />

Virgem Nossa Senhora <strong>do</strong> Loreto, sita junto à ci<strong>da</strong>de de Recanate e vizinha ao<br />

mar Adriático, milagroso hospício de to<strong>da</strong> a cristan<strong>da</strong>de.<br />

- Suposto que minha i<strong>da</strong>de (respondeu Felisberto) me pudera desculpar<br />

<strong>do</strong> aforismo geral de Plutarco em que diz: Uma <strong>da</strong>s obrigações <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>deira<br />

amizade é querer o mesmo que o amigo quer para mostrar que a vontade é<br />

uma só pelo amor, sen<strong>do</strong> duas distantes pela natureza; não sen<strong>do</strong> tanto de<br />

temer a velhice para si como por vir acompanha<strong>da</strong>, como disse Euripides, de<br />

to<strong>da</strong>s as moléstias juntas, contu<strong>do</strong> por ser a jorna<strong>da</strong> tão meritória e a romaria<br />

de tanta devoção que mil vezes me persuadiu o desejo a emprendê-la, me<br />

ofereço a fazer-vos companhia porque me lembra que ensina o padre São

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