12.06.2017 Views

Código de Processo Penal Comentado (2016) - Guilherme de Souza Nucci

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

grave <strong>de</strong>lito. Para a substituição do exame <strong>de</strong> corpo <strong>de</strong> <strong>de</strong>lito, imposto por lei, necessitar-se-ia da prova<br />

testemunhal, que é meio <strong>de</strong> prova direto, como <strong>de</strong>termina a lei. Não nos parece tenha sido obtido, no caso narrado<br />

pelo autor, <strong>de</strong>poimentos consistentes comprovando a ocorrência da morte da vítima. Por isso, cremos (sem a<br />

pretensão <strong>de</strong> analisar o caso concreto da Comarca <strong>de</strong> Uberlândia, utilizado apenas como referência ilustrativa) que<br />

a prova indiciária (meio <strong>de</strong> prova indireto) é, <strong>de</strong> todas, a mais frágil para a composição da materialida<strong>de</strong> do <strong>de</strong>lito. A<br />

lei estipulou que a prova testemunhal po<strong>de</strong> suprir o exame <strong>de</strong> corpo <strong>de</strong> <strong>de</strong>lito, querendo com isso dizer que o crime<br />

– ou fato relevante a ele relacionado, como alguém arrastando o corpo, no caso <strong>de</strong> homicídio – precisa ter sido<br />

visto por alguém, que, então, possa reproduzi-lo em juízo. Afora essa possibilida<strong>de</strong>, outras provas carecem <strong>de</strong><br />

consistência para a formação da materialida<strong>de</strong>, gerando dúvida intransponível, merecedora <strong>de</strong> gerar a absolvição <strong>de</strong><br />

qualquer acusado, em homenagem ao mais forte dos princípios processuais penais: in dubio pro reo. Anote-se,<br />

ainda, a lição <strong>de</strong> Rogério Lauria Tucci: “Embora igualmente utilizáveis em processo penal, não se prestam, também,<br />

à comprovação do corpo <strong>de</strong> <strong>de</strong>lito, os indícios, que lato sensu consi<strong>de</strong>rados, representam a probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

convicção judicial, mesmo à falta <strong>de</strong> qualquer prova direta, inclusive a testemunhal” (Do corpo <strong>de</strong> <strong>de</strong>lito no direito<br />

processual penal brasileiro, p. 190).<br />

41-A. Outra hipótese <strong>de</strong> corpo <strong>de</strong> <strong>de</strong>lito formado in<strong>de</strong>vidamente: <strong>de</strong> um caso concreto, apreciado<br />

pelo Tribunal <strong>de</strong> Justiça <strong>de</strong> S. Paulo, verificou-se ter uma parturiente sofrido uma cesareana. O bebê foi retirado<br />

com vida e a mãe dirigiu-se ao quarto. Durante os dias que se seguiram, fortes dores a acometeram no abdômen. O<br />

médico indicado para o parto não tinha a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> lhe fazer o acompanhamento, tratando-se <strong>de</strong> hospital<br />

público. Outros profissionais <strong>de</strong>veriam ter verificado <strong>de</strong> pronto <strong>de</strong> on<strong>de</strong> viriam tais dores anormais. Uma semana<br />

<strong>de</strong>pois, a mulher falece. Descobre-se, no prontuário, que um objeto estranho fora esquecido no ventre da<br />

parturiente; houve infecção e, daí, a morte. Não se fez laudo <strong>de</strong> exame necroscópico, nem direto nem indireto.<br />

Testemunhas foram chamadas a <strong>de</strong>por e narraram o caso com suas opiniões e visões particulares, apontando para o<br />

médico, autor do parto, a culpa. Apenas com tais <strong>de</strong>poimentos, o órgão acusatório <strong>de</strong>nunciou o médico por<br />

homicídio culposo. Várias indagações restaram em aberto: a) o homicídio (doloso ou culposo) é crime que <strong>de</strong>ixa<br />

vestígios, sendo imprescindível a realização da perícia (art. 158); b) a mulher faleceu num hospital, razão mais que<br />

suficiente para a realização do laudo; c) como se estabelece exatamente o nexo <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> entre o objeto<br />

esquecido no ventre materno e sua morte sem o laudo pericial; d) as testemunhas, conforme dispõe o art. 167 do<br />

CPP somente po<strong>de</strong>m suprir a perícia se os vestígios <strong>de</strong>sapareceram; não era o caso, pois a mulher foi enterrada e<br />

nunca se cogitou realizar a perícia nos termos do art. 159 do CPP. Em suma, a utilização <strong>de</strong> testemunhas para<br />

estabelecer o nexo causal entre conduta e resultado, nessa hipótese, é prova ilícita, pois em flagrante oposição ao<br />

texto legal do CPP. A obrigatorieda<strong>de</strong> da perícia constitui cenário da prova legal, vale dizer, imposta pelo legislador,<br />

não constituindo mera faculda<strong>de</strong> dos operadores do Direito.<br />

Art. 168. Em caso <strong>de</strong> lesões corporais, se o primeiro exame pericial tiver sido incompleto, 42 proce<strong>de</strong>r-se-á a<br />

exame complementar por <strong>de</strong>terminação da autorida<strong>de</strong> policial ou judiciária, <strong>de</strong> ofício, 43 ou a requerimento do<br />

Ministério Público, do ofendido ou do acusado, 44 ou <strong>de</strong> seu <strong>de</strong>fensor.<br />

§ 1.º No exame complementar, os peritos terão presente o auto <strong>de</strong> corpo <strong>de</strong> <strong>de</strong>lito, a fim <strong>de</strong> suprir-lhe a <strong>de</strong>ficiência<br />

ou retificá-lo. 45<br />

§ 2.º Se o exame tiver por fim precisar a classificação do <strong>de</strong>lito 46-47 no art. 129, § 1.º, I, do <strong>Código</strong> <strong>Penal</strong>, <strong>de</strong>verá<br />

ser feito logo que <strong>de</strong>corra o prazo <strong>de</strong> 30 (trinta) dias, contado da data do crime. 48<br />

§ 3.º A falta <strong>de</strong> exame complementar po<strong>de</strong>rá ser suprida 49 pela prova testemunhal.<br />

42. Exame complementar incompleto: justamente pelo fato <strong>de</strong> muitas provas periciais serem préconstituídas,<br />

vale dizer, elaboradas durante a fase extrajudicial, quando ainda não há contraditório, nem ampla<br />

<strong>de</strong>fesa, é possível que as partes ou mesmo o juiz <strong>de</strong>seje maiores esclarecimentos por conta <strong>de</strong> alguma <strong>de</strong>ficiência

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!