12.06.2017 Views

Código de Processo Penal Comentado (2016) - Guilherme de Souza Nucci

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

estabelecimento penal, on<strong>de</strong> se encontre o preso, esteja aparelhado para receber o magistrado, seus auxiliares e as<br />

partes (promotor e <strong>de</strong>fensor), já que a presença da <strong>de</strong>fesa passou a ser obrigatória (art. 185, caput) e ambos po<strong>de</strong>m<br />

interferir no interrogatório (art. 188). Não sendo possível receber o juiz e as partes no presídio, por falta das<br />

condições indispensáveis, continua-se a realizar o interrogatório nos mol<strong>de</strong>s das <strong>de</strong>mais audiências, ou seja, no<br />

fórum, requisitando-se a apresentação do réu. Registre-se, ainda, que a lei, corretamente nesse ponto, <strong>de</strong>manda o<br />

respeito ao princípio constitucional da publicida<strong>de</strong>, motivo pelo qual as salas próprias para a audiência <strong>de</strong>vem<br />

situar-se fora das muralhas on<strong>de</strong> se encontram os presos, a fim <strong>de</strong> que qualquer pessoa do povo – logicamente<br />

i<strong>de</strong>ntificada e com a fiscalização necessária – possa ingressar no prédio e assistir ao ato. Salvo, pois, quando o juiz<br />

<strong>de</strong>cretar sigilo no processo, o interrogatório continua a ser, como ocorre no fórum, audiência pública. Salientemos<br />

que, sendo o réu o último a ser ouvido, na audiência <strong>de</strong> instrução e julgamento, após o advento da Lei 11.719/2008,<br />

nota-se que a melhor e mais prática forma <strong>de</strong> concluir os trabalhos é requisitá-lo para que esteja presente no fórum.<br />

Porém, tratando-se <strong>de</strong> pessoa perigosa, bem como preenchidos os requisitos legais, po<strong>de</strong>-se realizar tanto a<br />

audiência quanto o interrogatório por vi<strong>de</strong>oconferência, como analisaremos nas notas a seguir.<br />

11. Interrogatório por vi<strong>de</strong>oconferência e ampla <strong>de</strong>fesa: há, certamente, imensas dificulda<strong>de</strong>s para a<br />

movimentação <strong>de</strong> réus presos entre os estabelecimentos on<strong>de</strong> se encontram e os fóruns on<strong>de</strong> <strong>de</strong>vem ser ouvidos.<br />

Em particular, o maior queixoso sempre foi o Po<strong>de</strong>r Executivo, encarregado <strong>de</strong> realizar essa movimentação,<br />

garantindo a segurança <strong>de</strong> todos. Há cerca <strong>de</strong> quase duas décadas, surgiram os primeiros passos em direção à<br />

vi<strong>de</strong>oconferência (ou o <strong>de</strong>nominado interrogatório on-line), como instrumento para sanar os dissabores<br />

enfrentados pelo Po<strong>de</strong>r Público para a apresentação dos acusados presos nos locais <strong>de</strong> seus julgamentos. É<br />

interessante observar a existência <strong>de</strong>, pelo menos, dois prismas para a adoção da vi<strong>de</strong>oconferência: a) os que a<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m como forma <strong>de</strong> barateamento do custo para a movimentação diária <strong>de</strong> presos pelos tribunais do país; b)<br />

os que a sustentam como maneira e símbolo <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização da máquina judiciária, na era do computador e da<br />

mais avançada tecnologia. Logicamente, há os que estão presentes nos dois grupos concomitantemente. O primeiro<br />

argumento, em relação ao custo do Estado para proporcionar a ampla <strong>de</strong>fesa, constitucionalmente assegurada, é<br />

lamentável. O processo penal e o aparato punitivo estatal são dispendiosos por natureza. Um presídio não é uma<br />

empresa e não há <strong>de</strong> dar lucro ao Estado, assim como a apresentação do réu preso para acompanhar seu julgamento<br />

é um <strong>de</strong>ver assumido pelo Estado Democrático <strong>de</strong> Direito. Não importam os custos, embora se possa otimizar a<br />

máquina judiciária e obter o maior aproveitamento possível. Quanto ao grupo <strong>de</strong>fensor da mo<strong>de</strong>rnização, é preciso<br />

consi<strong>de</strong>rar a sensibilida<strong>de</strong> humana presente no contato entre agressor e agredido (no processo <strong>de</strong> reconhecimento,<br />

por exemplo), bem como a proximida<strong>de</strong> entre réu e julgador (no interrogatório). Uma tela <strong>de</strong> aparelho <strong>de</strong> TV ou <strong>de</strong><br />

computador jamais irá suprir o contato direto que o magistrado <strong>de</strong>ve ter com o acusado, até mesmo para constatar<br />

se ele se encontra em perfeitas condições físicas e mentais. Qual réu, <strong>de</strong>tido numa penitenciária a quilômetros <strong>de</strong><br />

distância, sentir-se-á à vonta<strong>de</strong> para <strong>de</strong>nunciar os maus-tratos que vem sofrendo a um juiz encontrado atrás da lente<br />

<strong>de</strong> uma câmara? Qual acusado terá oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se soltar diante do magistrado, confessando <strong>de</strong>talhes <strong>de</strong> um<br />

crime complexo, voltado a um aparelho e não a um ser humano? Por outro lado, qual julgador terá oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

sentir as menores reações daquele que mente ou ter a percepção <strong>de</strong> que o réu conta a verda<strong>de</strong> visualizando-o por<br />

uma tela? Enfim, o ato processual do interrogatório é importante <strong>de</strong>mais para ser banalizado e relegado ao singelo<br />

contato dos maquinários da tecnologia. Não somos, em absoluto, contrários ao progresso e ao <strong>de</strong>senvolvimento<br />

trazido pela informática, mas é preciso um limite para tudo. Não fosse assim e po<strong>de</strong>ríamos cancelar as audiências,<br />

conseguir os <strong>de</strong>poimentos das testemunhas pela Internet, receber as petições dos promotores e advogados por e-<br />

mail e julgar o caso sem sair do gabinete e sem ter contato com qualquer pessoa. A tecnologia já nos proporciona,<br />

se <strong>de</strong>sejarmos, tal situação. É verda<strong>de</strong> que caminhamos para isso, em especial, após a edição da Lei 11.419/2006,<br />

cuidando da informatização do processo judicial. Merece aplausos. Porém, entre receber uma petição por e-mail e<br />

interrogar um réu por vi<strong>de</strong>oconferência, parece-nos haver distância consi<strong>de</strong>rável. Entre promover uma citação por

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!