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Código de Processo Penal Comentado (2016) - Guilherme de Souza Nucci

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valores ao Estado, para assegurar o direito <strong>de</strong> permanecer em liberda<strong>de</strong>, no transcurso do processo criminal.<br />

Consi<strong>de</strong>ra-se a fiança uma espécie do gênero caução, que significa garantia ou segurança. Diz-se ser a caução<br />

fi<strong>de</strong>jussória, quando a garantia dada é pessoal, isto é, assegurada pelo empenho da palavra <strong>de</strong> pessoa idônea, <strong>de</strong> que<br />

o réu vai acompanhar a instrução e apresentar-se, em caso <strong>de</strong> con<strong>de</strong>nação. Esta seria a autêntica fiança. Com o<br />

passar dos anos, foi substituída pela <strong>de</strong>nominada caução real, implicando o <strong>de</strong>pósito ou a entrega <strong>de</strong> valores,<br />

<strong>de</strong>sfigurando a fiança. Ainda assim, é a caução real a feição da atual fiança, conforme se vê no <strong>Código</strong> <strong>de</strong> <strong>Processo</strong><br />

<strong>Penal</strong> (cf. Luiz Otavio <strong>de</strong> Oliveira Rocha e Marco Antonio Garcia Baz, Fiança criminal e liberda<strong>de</strong> provisória, p.<br />

109; Espínola Filho, <strong>Código</strong> <strong>de</strong> <strong>Processo</strong> <strong>Penal</strong> brasileiro anotado, v. 3, p. 487; Tourinho Filho, Comentários ao<br />

<strong>Código</strong> <strong>de</strong> <strong>Processo</strong> <strong>Penal</strong>, v. 1, p. 557; Mirabete, <strong>Código</strong> <strong>de</strong> <strong>Processo</strong> <strong>Penal</strong> interpretado, p. 431).<br />

7. Objetivo da fiança: tem por fim, primordialmente, assegurar a liberda<strong>de</strong> provisória do indiciado ou réu,<br />

enquanto <strong>de</strong>corre o processo criminal, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que preenchidas <strong>de</strong>terminadas condições. Entregando valores seus ao<br />

Estado, estaria vinculado ao acompanhamento da instrução e interessado em se apresentar, em caso <strong>de</strong> con<strong>de</strong>nação,<br />

para obter, <strong>de</strong> volta, o que <strong>de</strong>positou. Além disso, a fiança teria a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> garantir o pagamento das custas e<br />

também da multa (se for aplicada). Atualmente, no entanto, o instituto da fiança ainda se encontra <strong>de</strong>smoralizado.<br />

Embora seus valores tenham sido revistos pela Lei 12.403/2011, por culpa exclusiva do constituinte, inseriu-se na<br />

Constituição Fe<strong>de</strong>ral a proibição <strong>de</strong> fiança para <strong>de</strong>terminados casos graves, como os crimes hediondos e<br />

assemelhados, <strong>de</strong>ntre outros. Ora, tais <strong>de</strong>litos comportam liberda<strong>de</strong> provisória, sem fiança, gerando uma<br />

contradição sistêmica. Para o acusado por homicídio qualificado (<strong>de</strong>lito hediondo), o juiz po<strong>de</strong> conce<strong>de</strong>r liberda<strong>de</strong><br />

provisória, sem arbitrar fiança; para o réu <strong>de</strong> homicídio simples (não hediondo), caberia liberda<strong>de</strong> provisória com<br />

fixação <strong>de</strong> fiança. Diante disso, o autor <strong>de</strong> infração penal mais grave não precisa recolher valor algum ao Estado<br />

para obter a liberda<strong>de</strong> provisória; o agente <strong>de</strong> crime mais leve fica condicionado a fazê-lo. Infelizmente, tal erro<br />

somente se po<strong>de</strong> corrigir com uma revisão constitucional.<br />

8. Aperfeiçoamento do instituto da fiança: segundo cremos, todos os <strong>de</strong>litos <strong>de</strong>veriam ser afiançáveis.<br />

Os mais leves, como já ocorre atualmente, comportariam a fixação da fiança pela própria autorida<strong>de</strong> policial,<br />

enquanto os mais graves, somente pelo juiz. Mas, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o homicídio qualificado até um mero furto simples<br />

<strong>de</strong>veriam ser objeto <strong>de</strong> fixação <strong>de</strong> fiança. Por ora, enquanto não se altera o texto constitucional, <strong>de</strong>vem os juízes<br />

arbitrar fiança, sempre que possível, gerando essa cultura na sistemática processual penal, pois útil e razoável.<br />

9. Fixação pela autorida<strong>de</strong> policial: somente po<strong>de</strong> ocorrer em infrações penais consi<strong>de</strong>radas mais leves,<br />

como as punidas com penas privativas <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> máxima não superior a quatro anos. Aboliu-se, pela edição da<br />

Lei 12.403/2011, a distinção entre reclusão e <strong>de</strong>tenção, para efeito <strong>de</strong> fiança, algo correto e proveitoso.<br />

Lembremos que o cálculo do máximo em abstrato previsto para o caso concreto (prisão em flagrante) <strong>de</strong>ve<br />

envolver o concurso <strong>de</strong> crimes. Portanto, se o indiciado for <strong>de</strong>tido por furto simples e receptação simples, em<br />

concurso material, não cabe a aplicação <strong>de</strong> fiança pela autorida<strong>de</strong> policial, pois o máximo abstrato da pena atinge<br />

oito anos <strong>de</strong> reclusão. Da mesma forma, insere-se eventual causa <strong>de</strong> diminuição da pena – utilizando a menor<br />

redução possível – para prever o máximo possível. No estelionato, a pena máxima é <strong>de</strong> cinco anos. O <strong>de</strong>legado não<br />

po<strong>de</strong>ria arbitrar fiança. Porém, cuidando-se <strong>de</strong> tentativa <strong>de</strong> estelionato, diminuído um terço (mínimo possível)<br />

<strong>de</strong>sse montante, passa-se a um valor abaixo <strong>de</strong> quatro anos, permitindo à autorida<strong>de</strong> policial fixar a fiança. Ainda<br />

assim, a autorida<strong>de</strong> policial <strong>de</strong>ve conce<strong>de</strong>r a fiança na fase do inquérito, pois, em juízo, é sempre atribuição do<br />

magistrado fixá-la (po<strong>de</strong> ser o tribunal, quando o processo estiver em grau <strong>de</strong> recurso, ou mesmo o relator, nos<br />

crimes <strong>de</strong> competência originária). Nos <strong>de</strong>mais casos, o pedido <strong>de</strong>ve ser dirigido ao juiz, como prevê o parágrafo<br />

único <strong>de</strong>ste artigo.<br />

10. Arbitramento pelo magistrado: requerida a fixação da fiança, por pleito do indiciado/réu ou do<br />

Ministério Público, o juiz tem o prazo <strong>de</strong> 48 horas para <strong>de</strong>cidir. Ultrapassado tal período, configura-se

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