12.06.2017 Views

Código de Processo Penal Comentado (2016) - Guilherme de Souza Nucci

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

7. Autoria: é a i<strong>de</strong>ntificação do agente da infração penal. O ofendido po<strong>de</strong> indicar, diretamente, quem seja o<br />

agressor, como po<strong>de</strong> aventar possibilida<strong>de</strong>s, já que a lei faculta-lhe presumir quem seja o autor.<br />

8. Valor probatório da palavra da vítima: trata-se <strong>de</strong> ponto extremamente controverso e <strong>de</strong>licado na<br />

avaliação da prova. Primeiramente, convém mencionar que as <strong>de</strong>clarações do ofendido constituem meio <strong>de</strong> prova,<br />

tanto quanto o é o interrogatório do réu, quando este resolve falar ao juiz. Entretanto, não se po<strong>de</strong> dar o mesmo<br />

valor à palavra da vítima, que se costuma conferir ao <strong>de</strong>poimento <strong>de</strong> uma testemunha, esta, presumidamente,<br />

imparcial. Por outro lado, a prática forense nos mostra haver vítimas muito mais <strong>de</strong>sprendidas e imparciais do que<br />

as próprias testemunhas, <strong>de</strong> forma que suas <strong>de</strong>clarações po<strong>de</strong>m se tornar fontes valorosas <strong>de</strong> prova. Assim, cumpre<br />

apenas <strong>de</strong>stacar alguns pontos <strong>de</strong> cautela para o juiz analisar a fala do ofendido. Lembra-nos, inicialmente, Altavilla<br />

ser a vítima pessoa diretamente envolvida pela prática do crime, pois algum bem ou interesse seu foi violado, razão<br />

pela qual po<strong>de</strong> estar coberta por emoções perturbadoras do seu processo psíquico, levando-a à ira, ao medo, à<br />

mentira, ao erro, às ilusões <strong>de</strong> percepção, ao <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> vingança, à esperança <strong>de</strong> obter vantagens econômicas e à<br />

vonta<strong>de</strong> expressa <strong>de</strong> se <strong>de</strong>sculpar – neste último caso, quando termina contribuindo para a prática do crime<br />

(Psicologia judiciária, v. 2, p. 155-157). Por outro lado, há aspectos ligados ao sofrimento pelo qual passou a<br />

vítima, quando da prática do <strong>de</strong>lito, po<strong>de</strong>ndo, então, haver distorções naturais em suas <strong>de</strong>clarações. A pessoa<br />

sequestrada, por exemplo, diante da dor e da aflição suportadas, po<strong>de</strong> elevar sobremaneira o período em que ficou<br />

sob po<strong>de</strong>r do sequestrador, justamente porque per<strong>de</strong> a noção real <strong>de</strong> tempo, estando com a liberda<strong>de</strong> privada. Outro<br />

aspecto a ser consi<strong>de</strong>rado são as exposições pormenorizadas do fato criminoso, nem sempre frutos da verda<strong>de</strong>,<br />

pois o ofendido tem a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inventar muitas circunstâncias, até, como já se frisou, para atenuar a sua<br />

responsabilida<strong>de</strong> na ocorrência do <strong>de</strong>lito. O sujeito agressivo, sempre provocando terceiros, em outro exemplo, ao<br />

ser fisicamente atacado, po<strong>de</strong>rá construir na sua mente um universo <strong>de</strong> escusas para a sua atitu<strong>de</strong> inicial, que o leva<br />

a omitir tal afronta, criando, em seu lugar, outros dados inexistentes. Outro elemento curioso da psicologia humana<br />

é a tendência natural <strong>de</strong> pessoas violentadas ou agredidas por entes queridos <strong>de</strong> amenizar ou <strong>de</strong>sculpar, totalmente,<br />

o ataque sofrido. A ânsia <strong>de</strong> permanecer com os seres amados, mormente porque dá como certo e acabado o crime<br />

ocorrido, faz com que se voltem ao futuro, querendo, <strong>de</strong> todo modo, absolver o culpado. É a situação enfrentada,<br />

muitas vezes, por mulheres agredidas por seus maridos, por filhos violentados por seus pais e, mesmo, por<br />

genitores idosos atacados ou enganados por seus <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes. Ao magistrado só resta exercitar ao máximo a sua<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> observação, a sua sensibilida<strong>de</strong> para captar verda<strong>de</strong>s e inverda<strong>de</strong>s, a sua particular tendência <strong>de</strong> ler nas<br />

entrelinhas e perceber a realida<strong>de</strong> na linguagem figurada ou propositadamente distorcida. Acima <strong>de</strong> tudo, não <strong>de</strong>ve o<br />

juiz permitir qualquer forma <strong>de</strong> preconceito em sua avaliação sobre a palavra da vítima, nem <strong>de</strong>ve ser rigoroso<br />

<strong>de</strong>mais, <strong>de</strong>sacreditando-a por completo. O ofendido nada mais é do que o réu visto ao contrário, vale dizer, a<br />

pessoa que foi agredida querendo justiça, enquanto o outro, a ser julgado, preten<strong>de</strong>ndo mostrar a sua inocência,<br />

almeja <strong>de</strong>spertar as razões para que não lhe seja feita injustiça com uma con<strong>de</strong>nação. Em conclusão, pois,<br />

sustentamos po<strong>de</strong>r a palavra isolada da vítima dar margem à con<strong>de</strong>nação do réu, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que resistente e firme, além<br />

<strong>de</strong> harmônica com as <strong>de</strong>mais circunstâncias colhidas ao longo da instrução. Em sentido contrário, afirmando ser<br />

impossível aceitar a palavra isolada da vítima para escorar um <strong>de</strong>creto con<strong>de</strong>natório: Paulo Heber <strong>de</strong> Moraes e João<br />

Batista Lopes (Da prova penal, p. 118). Na jurisprudência: TJRS: “A palavra segura da vítima, corroborada pelo<br />

<strong>de</strong>poimento <strong>de</strong> sua mãe e da psicóloga do CREAS, bem como pelo relatório psicológico e pela fragilida<strong>de</strong> da<br />

versão <strong>de</strong>fensiva, comprova os atos libidinosos praticados pelo réu, seu pai, quando ela possuía 11 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>”<br />

(Apelação Crime 70064006927 – RS, 7.ª C. C., rel. Jucelana Lur<strong>de</strong>s Pereira dos Santos, 28.05.2015, por maioria,<br />

em rejeitar a preliminar <strong>de</strong> ofício, e à unanimida<strong>de</strong>, em rejeitar a preliminar da <strong>de</strong>fesa.). TJMG: “Em <strong>de</strong>litos<br />

patrimoniais, cometidos, em regra, na clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>, a palavra da vítima possui especial relevo probatório a<br />

esclarecer como os fatos criminosos ocorreram e os seus envolvidos” (Ap. Crim. 1.0024.13.239826-4/001 – MG,<br />

7.ª C. C., rel. Sálvio Chaves, 21.05.2015, v.u.); “As palavras da vítima, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que se mostrem extremamente firmes

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!