12.06.2017 Views

Código de Processo Penal Comentado (2016) - Guilherme de Souza Nucci

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

contra o Estado para a reparação do dano. Neste caso, porém, <strong>de</strong>ve haver processo <strong>de</strong> conhecimento para a<br />

<strong>de</strong>monstração do erro judiciário e para o estabelecimento do montante da in<strong>de</strong>nização. Logicamente, juntando o<br />

autor cópia do acórdão que <strong>de</strong>feriu a revisão criminal, a produção <strong>de</strong> provas fica facilitada.<br />

48. Responsabilida<strong>de</strong> objetiva do Estado: não havendo parte passiva na ação revisional – nem a Fazenda<br />

Pública, nem o Ministério Público –, é natural que tenha a lei estabelecido uma responsabilida<strong>de</strong> objetiva do Estado<br />

frente ao erro judiciário. Aliás, <strong>de</strong> acordo com o disposto pelo art. 5.º, LXXV, da Constituição Fe<strong>de</strong>ral: “o Estado<br />

in<strong>de</strong>nizará o con<strong>de</strong>nado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”.<br />

Entretanto, há outros princípios constitucionais, que merecem observância. O <strong>de</strong>vido processo legal não prescin<strong>de</strong><br />

do contraditório e da ampla <strong>de</strong>fesa. Por isso, apesar <strong>de</strong> ser o Estado obrigado a in<strong>de</strong>nizar o erro judiciário,<br />

reservando-se a discussão acerca do quantum ao juízo cível, é fundamental possa haver a intervenção estatal na<br />

ação <strong>de</strong> revisão criminal. Tal medida se explica pelo fato <strong>de</strong> ser uma ação <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconstituição da coisa julgada,<br />

po<strong>de</strong>ndo gerar o título executivo contra a Fazenda Pública. Nada mais justo que este órgão seja citado e possa<br />

apresentar suas razões, com o fim <strong>de</strong> manter a <strong>de</strong>cisão con<strong>de</strong>natória, buscando <strong>de</strong>monstrar ao Judiciário não ter<br />

ocorrido erro algum. Se isto se <strong>de</strong>r na ação <strong>de</strong> revisão criminal, vale dizer, a improcedência, o título não se forma<br />

contra a Fazenda e inexistirá in<strong>de</strong>nização a pagar. Do modo como, hoje, se apresenta a lei ordinária, impedindo que<br />

órgãos estatais intervenham no polo passivo da revisional, afronta-se o <strong>de</strong>vido processo legal, o que é inadmissível<br />

no Estado Democrático <strong>de</strong> Direito. Entenda-se, por fim, que, sendo consi<strong>de</strong>rada proce<strong>de</strong>nte a revisão criminal,<br />

gera-se uma responsabilida<strong>de</strong> objetiva <strong>de</strong> reparação do dano ao Estado, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> se apurar a culpa <strong>de</strong><br />

quem quer que tenha produzido tal erro.<br />

49. Confissão como causa da con<strong>de</strong>nação: em atenção ao <strong>de</strong>vido processo legal e à ampla <strong>de</strong>fesa, não<br />

se admite que a confissão, no processo penal, constitua prova plena da culpa do réu. Fosse assim e, uma vez que<br />

admitisse, no interrogatório, serem verda<strong>de</strong>iros os fatos alegados na <strong>de</strong>núncia, estaria encerrada a instrução,<br />

passando o juiz, diretamente, à fase da sentença. Não seria preciso nomear <strong>de</strong>fensor ao acusado, nem se proce<strong>de</strong>r à<br />

instrução. Logicamente, a confissão constitui uma prova direta, mas não se po<strong>de</strong> olvidar que não é absoluta. Foi-se<br />

o tempo em que era consi<strong>de</strong>rada a rainha das provas. Atualmente, <strong>de</strong>ve-se provar, <strong>de</strong>vidamente, o alegado na<br />

<strong>de</strong>núncia ou queixa. Portanto, se o erro judiciário fundou-se em <strong>de</strong>cisão que <strong>de</strong>sprezou tais postulados e aceitou<br />

somente a confissão para a con<strong>de</strong>nação, cremos que houve equívoco e o Estado é responsável. Caso a confissão<br />

judicial tenha sido uma das provas relevantes para a con<strong>de</strong>nação, po<strong>de</strong>-se aceitar o argumento <strong>de</strong> que o réu<br />

contribuiu, sobremaneira, para o seu próprio prejuízo, <strong>de</strong> modo que não lhe cabe in<strong>de</strong>nização.<br />

50. Ocultação <strong>de</strong> prova em seu po<strong>de</strong>r: se o réu escon<strong>de</strong>r prova que o beneficie, propositadamente, é<br />

natural que foi con<strong>de</strong>nado por conta <strong>de</strong> suas próprias atitu<strong>de</strong>s. Não houve responsabilida<strong>de</strong> do Estado, nem mesmo<br />

objetiva, pois o juiz foi ludibriado, tendo prejudicado a pessoa que gerou o engano. Mas, se as provas po<strong>de</strong>riam ser<br />

conseguidas por inúmeras outras formas, tendo havido inépcia do Estado em buscá-las, certamente houve culpa<br />

concorrente e cabe a in<strong>de</strong>nização.<br />

51. Acusação privada: é preciso não per<strong>de</strong>r <strong>de</strong> vista que o erro judiciário, seja a ação penal pública, seja<br />

privada, é julgada pelo Po<strong>de</strong>r Judiciário, <strong>de</strong> modo que o equívoco é sempre do Estado e nunca do particular. O fato<br />

da iniciativa da ação penal privada ter sido conferida ao ofendido não significa que ele é o titular do direito <strong>de</strong> punir.<br />

Ao contrário, este é sempre estatal. Por isso, parece-nos inaplicável este dispositivo. Anote-se a correta visão <strong>de</strong><br />

Ada, Magalhães e Scarance: “Essa posição do <strong>Código</strong>, bastante esdrúxula – pois mesmo na queixa-crime é o Estado<br />

que a recebe e, con<strong>de</strong>nando, comete o erro judiciário, pouco importando a titularida<strong>de</strong> da ação – não po<strong>de</strong><br />

prevalecer perante as regras constitucionais sobre a responsabilida<strong>de</strong> objetiva do Estado, que é obrigado a in<strong>de</strong>nizar<br />

por erro judiciário, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da titularida<strong>de</strong> da ação penal” (Recursos no processo penal, p. 334).

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!