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Código de Processo Penal Comentado (2016) - Guilherme de Souza Nucci

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1. Conceito <strong>de</strong> indício: o indício é um fato secundário, conhecido e provado, que, tendo relação com o fato<br />

principal, autorize, por raciocínio indutivo-<strong>de</strong>dutivo, a conclusão da existência <strong>de</strong> outro fato secundário ou outra<br />

circunstância. É prova indireta, embora não tenha, por causa disso, menor valia. O único fator – e principal – a ser<br />

observado é que o indício, solitário nos autos, não tem força suficiente para levar a uma con<strong>de</strong>nação, visto que esta<br />

não prescin<strong>de</strong> <strong>de</strong> segurança. Assim, valemo-nos, no contexto dos indícios, <strong>de</strong> um raciocínio indutivo, que é o<br />

conhecimento amplificado pela utilização da lógica para justificar a procedência da ação penal. A indução nos<br />

permite aumentar o campo do conhecimento, razão pela qual a existência <strong>de</strong> vários indícios torna possível formar<br />

um quadro <strong>de</strong> segurança compatível com o almejado pela verda<strong>de</strong> real, fundamentando uma con<strong>de</strong>nação ou mesmo<br />

uma absolvição. Trataremos, em nota abaixo, do conceito <strong>de</strong> indução e <strong>de</strong> sua utilização no processo penal.<br />

Art. 239. Consi<strong>de</strong>ra-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por<br />

indução, 2-3 concluir-se a existência <strong>de</strong> outra ou outras circunstâncias. 4-6<br />

2. Indução: é o “raciocínio no qual <strong>de</strong> dados singulares ou parciais suficientemente enumerados se infere<br />

uma verda<strong>de</strong> universal”, nas palavras <strong>de</strong> Jacques Maritain (A or<strong>de</strong>m dos conceitos – Lógica menor, p. 283). Tivemos<br />

oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> escrever sobre o tema, anteriormente, razão pela qual somos da opinião <strong>de</strong> que o legislador<br />

empregou o termo exato neste artigo, vale dizer, o raciocínio utilizado pelo magistrado, utilizando os indícios para<br />

chegar a uma conclusão qualquer no processo, é realmente indutivo. Ressalvamos que há alguns doutrinadores<br />

sustentando ter havido um erro <strong>de</strong> redação, usando-se a palavra indução em lugar do que consi<strong>de</strong>ram correto, que<br />

seria <strong>de</strong>dução (por todos nessa crítica, veja-se Tornaghi, Compêndio <strong>de</strong> processo penal, t. III, p. 945). A objeção é<br />

incorreta, pois a <strong>de</strong>dução é um raciocínio mais simples, que não permite a ampliação do conhecimento, mas<br />

estabelece a conjunção do que já é conhecido, afirmando, pois, a noção que se tem <strong>de</strong> algo. A indução faz crescer<br />

o conhecimento do ser humano, unindo-se dados parciais para formar um quadro mais amplo. Ainda assim, é<br />

preciso ressaltar não produzir a indução verda<strong>de</strong>s absolutas, mas nenhuma <strong>de</strong>cisão judicial po<strong>de</strong> chamar a si tal<br />

qualida<strong>de</strong>. O juiz <strong>de</strong>ci<strong>de</strong>, ainda que fundamentado em provas diretas, como a confissão judicial ou a pericial, com<br />

uma gran<strong>de</strong> probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acerto, mas jamais em caráter absoluto, visto que confissões po<strong>de</strong>m ser falsas, assim<br />

como o perito po<strong>de</strong> ter-se equivocado. Anote-se o alerta <strong>de</strong> Fábio Ulhoa Coelho: “A comprovação processual <strong>de</strong><br />

um acontecimento não significa a sua efetiva verificação. É claro que o homem <strong>de</strong>senvolveu várias técnicas <strong>de</strong><br />

reprodução <strong>de</strong> fatos (perícias, <strong>de</strong>poimento <strong>de</strong> testemunhas oculares, documentação fotográfica, cinematográfica<br />

etc.), mas o julgador imparcial, obrigatoriamente ausente no momento da ocorrência, tem da realida<strong>de</strong> apenas a<br />

versão processualmente construída. E, para o direito, interessa apenas esta versão. Se uma parte não conseguir<br />

provar um <strong>de</strong>terminado acontecimento, a <strong>de</strong>cisão jurídica <strong>de</strong>ve consi<strong>de</strong>rá-lo inocorrente. Portanto, para a aplicação<br />

<strong>de</strong> uma norma jurídica a um caso concreto, leva-se em conta simplesmente a versão processual <strong>de</strong>sse caso”<br />

(Lógica jurídica – Uma introdução, p. 70). Dessa forma, ao pronunciar uma sentença, o julgador leva em conta<br />

tanto a indução, quanto a <strong>de</strong>dução, a intuição e o silogismo. Quanto ao processo indutivo, ele seleciona os dados<br />

singulares interessantes ao seu conceito <strong>de</strong> justo, conforme sua experiência <strong>de</strong> vida e seus valores, <strong>de</strong>terminando a<br />

formação <strong>de</strong> um raciocínio próprio. Para con<strong>de</strong>nar ou absolver o réu, julgando proce<strong>de</strong>nte ou improce<strong>de</strong>nte uma<br />

causa, o magistrado po<strong>de</strong> trabalhar com a indução generalizadora <strong>de</strong> dois modos diversos, fazendo a conclusão<br />

caminhar para um lado (con<strong>de</strong>nação ou procedência) ou para outro (absolvição ou improcedência). Ele po<strong>de</strong> usar,<br />

ainda, inicialmente a intuição (sentindo se o réu é ou não culpado), caminhar para a indução e findar com a <strong>de</strong>dução.<br />

Exemplo: no caso <strong>de</strong> furto, raciocinando o juiz: a) o réu confessou, na polícia, a prática do crime; b) ostenta<br />

antece<strong>de</strong>ntes criminais; c) a apreensão da res furtiva foi feita em seu po<strong>de</strong>r; d) instrumentos normalmente usados<br />

para a prática <strong>de</strong> furto foram encontrados no seu domicílio; e) o réu tem um nível <strong>de</strong> vida elevado, incompatível<br />

com sua renda <strong>de</strong>clarada; f) foi visto nas imediações do local on<strong>de</strong> o furto foi cometido no dia do fato. Ninguém o<br />

viu furtando, nem ele, em juízo, admitiu essa prática. Mas esses indícios (prova indireta) fazem com que o juiz

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