12.06.2017 Views

Código de Processo Penal Comentado (2016) - Guilherme de Souza Nucci

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

ealmente, em juízo, e não meramente infirmada sob o crivo do contraditório, como parece ser a tendência<br />

majoritária da jurisprudência pátria, apesar <strong>de</strong> existirem doutas opiniões em contrário (por todos, Antonio<br />

Magalhães Gomes Filho, Direito à prova no processo penal, p. 149).<br />

4. Sistemas <strong>de</strong> processo penal: há, basicamente, três sistemas regentes do processo penal: a) inquisitivo,<br />

b) acusatório, c) misto. O sistema inquisitivo é caracterizado pela concentração <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r nas mãos do julgador,<br />

que exerce, também, a função <strong>de</strong> acusador; a confissão do réu é consi<strong>de</strong>rada a rainha das provas; não há <strong>de</strong>bates<br />

orais, predominando procedimentos exclusivamente escritos; os julgadores não estão sujeitos à recusa; o<br />

procedimento é sigiloso; há ausência <strong>de</strong> contraditório e a <strong>de</strong>fesa é meramente <strong>de</strong>corativa. O sistema acusatório<br />

possui nítida separação entre o órgão acusador e o julgador; há liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> acusação, reconhecido o direito ao<br />

ofendido e a qualquer cidadão; predomina a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa e a isonomia entre as partes no processo; vigora a<br />

publicida<strong>de</strong> do procedimento; o contraditório está presente; existe a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> recusa do julgador; há livre<br />

sistema <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> provas; predomina maior participação popular na justiça penal e a liberda<strong>de</strong> do réu é a regra.<br />

O sistema misto, surgido após a Revolução Francesa, uniu as virtu<strong>de</strong>s dos dois anteriores, caracterizando-se pela<br />

divisão do processo em duas gran<strong>de</strong>s fases: a instrução preliminar, com os elementos do sistema inquisitivo, e a<br />

fase <strong>de</strong> julgamento, com a predominância do sistema acusatório. Num primeiro estágio, há procedimento secreto,<br />

escrito e sem contraditório, enquanto, no segundo, presentes se fazem a oralida<strong>de</strong>, a publicida<strong>de</strong>, o contraditório, a<br />

concentração dos atos processuais, a intervenção <strong>de</strong> juízes populares e a livre apreciação das provas. Nosso sistema<br />

é misto. Defen<strong>de</strong>m muitos processualistas pátrios que o nosso sistema é o acusatório, porque se baseiam,<br />

certamente, nos princípios constitucionais vigentes (contraditório, separação entre acusação e órgão julgador,<br />

publicida<strong>de</strong>, ampla <strong>de</strong>fesa, presunção <strong>de</strong> inocência etc.). O que esses <strong>de</strong>fensores certamente confun<strong>de</strong>m é a prática<br />

forense, que muitos nem sequer possuem, e o que i<strong>de</strong>alizam para o futuro. A Constituição Fe<strong>de</strong>ral prevê princípios<br />

norteadores do sistema acusatório, mas também traz regras pertinentes ao sistema inquisitivo, bastando mencionar<br />

a autorização constitucional para a <strong>de</strong>cretação do sigilo da investigação e/ou do processo. Um sistema processual<br />

não se compõe <strong>de</strong> princípios constitucionais. O juiz não aplica, no seu cotidiano, a Constituição Fe<strong>de</strong>ral, pois nem<br />

saberia como conduzir um processo criminal. Vigora o <strong>Código</strong> <strong>de</strong> <strong>Processo</strong> <strong>Penal</strong>. Diante disso, cuida-se <strong>de</strong> pura<br />

<strong>de</strong>magogia afirmar ser o nosso sistema puramente acusatório. O mínimo que os <strong>de</strong>fensores <strong>de</strong>ssa i<strong>de</strong>ia precisariam<br />

fazer é admitir o óbvio: a persecução penal, no Brasil, hoje, possui duas fases. A primeira é inquisitiva e chega a<br />

produzir provas <strong>de</strong>finitivas contra o réu (vi<strong>de</strong> o caso <strong>de</strong> certas perícias, componentes importantes para a<br />

materialida<strong>de</strong> e, às vezes, para a autoria). Assim sendo, olvida-se, nessa análise, o disposto no <strong>Código</strong> <strong>de</strong> <strong>Processo</strong><br />

<strong>Penal</strong>, que prevê a colheita inicial da prova por meio do inquérito policial, presidido por um bacharel em Direito,<br />

que é o <strong>de</strong>legado, com todos os requisitos do sistema inquisitivo (sigilo, ausência <strong>de</strong> contraditório e ampla <strong>de</strong>fesa,<br />

procedimento eminentemente escrito, impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> recusa do condutor da investigação etc.). Somente após<br />

ingressa-se com a ação penal e, em juízo, passam a vigorar as garantias constitucionais mencionadas, aproximandose<br />

o procedimento do sistema acusatório. Ora, fosse verda<strong>de</strong>iro e genuinamente acusatório, não se levariam em<br />

conta, para qualquer efeito, as provas colhidas na fase inquisitiva, o que não ocorre em nossos processos na esfera<br />

criminal. O juiz leva em consi<strong>de</strong>ração muito do que é produzido durante a investigação, como a prova técnica (aliás,<br />

produzida uma só vez durante o inquérito e tornando à <strong>de</strong>fesa extremamente difícil a sua contestação e/ou<br />

renovação, sob o crivo do contraditório), os <strong>de</strong>poimentos colhidos e, sobretudo – e lamentavelmente –, a confissão<br />

extraída do indiciado. Quantos não são os feitos em que se vê, na sentença con<strong>de</strong>natória, o magistrado fazendo<br />

expressa referência à prova colhida na fase inquisitiva, <strong>de</strong>sprezando o que foi obtido em juízo? Por tudo isso,<br />

ensina Rogério Lauria Tucci que “o mo<strong>de</strong>rno processo penal <strong>de</strong>lineia-se inquisitório, substancialmente, na sua<br />

essencialida<strong>de</strong>; e, formalmente, no tocante ao procedimento <strong>de</strong>senrolado na segunda fase da persecução penal,<br />

acusatório” (Direitos e garantais individuais no processo penal brasileiro, p. 42; Do corpo <strong>de</strong> <strong>de</strong>lito no direito<br />

processual penal brasileiro, p. 117 e 160; Teoria do direito processual penal, p. 38). Nosso sistema é

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!