12.06.2017 Views

Código de Processo Penal Comentado (2016) - Guilherme de Souza Nucci

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

sensação <strong>de</strong> libertação provocada pela admissão da culpa. Ocorre quando o indivíduo já está sendo acusado e, tendo<br />

por finalida<strong>de</strong> não mais se digladiar com o Estado, ren<strong>de</strong>se, confessando. É uma necessida<strong>de</strong> imposta pela aversão<br />

ao duelo judiciário; 4.º) necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se explicar: afora o remorso e o arrependimento, existe, ainda,<br />

preenchendo o fundamento <strong>de</strong> muitas confissões, a necessida<strong>de</strong> do agente <strong>de</strong> justificar, perante a comunida<strong>de</strong> on<strong>de</strong><br />

vive, o ato criminoso praticado. Por isso, confessa, dando suas razões e aguardando aceitação e legitimação para o<br />

que fez. É o exemplo <strong>de</strong> quem mata o traficante do seu bairro e termina admitindo sua culpa para obter a aprovação<br />

social; 5.º) interesse: qualquer vantagem ou proveito po<strong>de</strong> justificar uma confissão. Des<strong>de</strong> o recebimento <strong>de</strong> uma<br />

quantia em dinheiro, para assumir o crime em lugar <strong>de</strong> outro, até a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se impor <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um presídio,<br />

ganhando notorieda<strong>de</strong>, po<strong>de</strong> levar o acusado à confissão. Não são poucos os casos <strong>de</strong> pessoas movidas unicamente<br />

pelo interesse, admitindo a prática <strong>de</strong> fatos, que não lhe dizem respeito. O interesse po<strong>de</strong> provocar confissões<br />

verda<strong>de</strong>iras, embora, na maior parte dos casos, sejam falsas; 6.º) lógica: o agente racional e inteligente não aprecia<br />

negar o óbvio, <strong>de</strong> modo que, percebendo serem suficientes as provas contra si, termina admitindo os fatos. Há<br />

muitos casos retratando situações <strong>de</strong> admissões <strong>de</strong> culpa originárias da aversão do agente em prosseguir negando o<br />

óbvio. Aliás, essa é uma das razões motivadoras para a confissão do acusado, quando ouvido em interrogatório, ao<br />

final <strong>de</strong> audiência <strong>de</strong> instrução. Ele acompanhou toda a produção da prova oral e percebeu ter sido indicado por<br />

todos como o autor do <strong>de</strong>lito, motivo pelo qual, por questão <strong>de</strong> lógica, admite a prática da infração penal ao ser<br />

inquirido; 7.º) orgulho ou vaida<strong>de</strong>: o <strong>de</strong>masiado amor-próprio e o <strong>de</strong>sejo imo<strong>de</strong>rado <strong>de</strong> atrair a atenção e a<br />

admiração alheias fazem com que alguns agentes confessem os <strong>de</strong>litos cometidos. Há aqueles que se promovem à<br />

custa do crime, adquirindo, na comunida<strong>de</strong>, os títulos <strong>de</strong> justiceiros ou vigilantes, motivos <strong>de</strong> glória e promoção<br />

pessoal, supondo-se paladinos da justiça; 8.º) esperança ou medo: a expectativa <strong>de</strong> obter algum benefício, ou o<br />

receio <strong>de</strong> ser mais severamente apenado, po<strong>de</strong> levar o indivíduo à admissão da culpa. Justamente por isso, não <strong>de</strong>ve<br />

o magistrado instigar o réu a confessar, “prometendo-lhe” atenuantes ou benefícios processuais. A confissão po<strong>de</strong><br />

ser, nesse caso, falsa; 9.º) expiação ou masoquismo: ignorar a existência <strong>de</strong> pessoas possuidoras do <strong>de</strong>sejo<br />

interior <strong>de</strong> causar mal a si mesmas é <strong>de</strong>sconhecer a natureza humana. Por isso, <strong>de</strong>ve o magistrado ser sensível ao<br />

fato <strong>de</strong> que réus po<strong>de</strong>m ter a necessida<strong>de</strong> – porventura patológica – <strong>de</strong> confessar um crime por eles não cometido;<br />

10.º) altruísmo: o <strong>de</strong>sprendimento e a abnegação <strong>de</strong> alguns po<strong>de</strong>m levá-los a assumir seus crimes, para que<br />

terceiros, injustamente acusados, não paguem pelo que não <strong>de</strong>vem. Essas confissões são, geralmente, verda<strong>de</strong>iras;<br />

11.º) forte po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> sugestão <strong>de</strong> terceiros: há pessoas facilmente sugestionadas por outras, <strong>de</strong>monstrando possuir<br />

autêntica falta <strong>de</strong> força <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> para resistir ao po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> convencimento alheio. As personalida<strong>de</strong>s fracas, <strong>de</strong><br />

mente estreita, com nítida tendência à covardia, po<strong>de</strong>m assumir crimes que não cometeram. Tal ocorre quando o<br />

interrogante é sagaz, inteligente e constrói raciocínios lógicos irrefutáveis para tais pessoas mentalmente frágeis,<br />

que terminam convencendo-se – ou não mais tendo justificativas para negar – <strong>de</strong> serem autoras <strong>de</strong> ilícitos alheios.<br />

Por vezes, como explica Gisli Gudjonsson, ocorre a “síndrome da <strong>de</strong>sconfiança da memória”, quando o confitente,<br />

acreditando ser culpado, porque sua memória falha no instante do interrogatório – mormente prolongado e<br />

cansativo –, não mais consegue contestar as evidências que lhe são apresentadas, admitindo algo que não realizou<br />

(False confessions, psychological effects of interrogation, p. 7, in Thornton, Report of the In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nt Civil<br />

Liberty Panel on Criminal Justice); 12.º) erro: a confissão po<strong>de</strong> ocorrer porque o acusado tem uma visão<br />

incorreta <strong>de</strong> como os fatos realmente se <strong>de</strong>ram e termina convencendo-se <strong>de</strong> que cometeu o <strong>de</strong>lito, embora não o<br />

tenha feito. Exemplo: “Tício, visando a matar Caio, atira contra ele, mas não o acerta. Terceira pessoa, entretanto,<br />

atirando no mesmo momento, atinge a vítima <strong>de</strong>sejada. Tício po<strong>de</strong> confessar ter matado Caio, porque assim lhe<br />

pareceu, embora tenha somente ficado na esfera da tentativa. Trata-se <strong>de</strong> uma confissão causada pelo erro” (<strong>de</strong><br />

nossa autoria, O valor da confissão como meio <strong>de</strong> prova no processo penal, p. 106). Réus suscetíveis <strong>de</strong> incidir<br />

nesse tipo <strong>de</strong> confissão, como regra falsa, são pessoas <strong>de</strong> baixo Q.I., <strong>de</strong>pressivas ou emocionalmente perturbadas,<br />

não possuidoras <strong>de</strong> condições perfeitas para enten<strong>de</strong>r o contexto on<strong>de</strong> estão inseridas, nem as perguntas exatas que

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!