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Código de Processo Penal Comentado (2016) - Guilherme de Souza Nucci

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3. Norma processual <strong>de</strong> aplicação imediata: a extinção do protesto por novo júri, provocada pela Lei<br />

11.689/2008, <strong>de</strong>ve ter aplicação imediata, tão logo entre em vigor o corpo <strong>de</strong> normas que alteraram a configuração<br />

do Tribunal do Júri. Segue-se, sem dúvida, o disposto no art. 2.º do <strong>Código</strong> <strong>de</strong> <strong>Processo</strong> <strong>Penal</strong>: “A lei processual<br />

penal aplicar-se-á <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, sem prejuízo da valida<strong>de</strong> dos atos realizados sob a vigência da lei anterior”. Significa,<br />

pois, que todo réu que estiver respon<strong>de</strong>ndo a processo, no contexto do júri, ao atingir a sentença con<strong>de</strong>natória,<br />

proferida em plenário, com pena fixada em 20 anos ou mais, já não terá direito <strong>de</strong> invocar o protesto por novo júri.<br />

Afinal, no momento processual em que alcançou a <strong>de</strong>cisão con<strong>de</strong>natória e, portanto, po<strong>de</strong>ria, em tese, fazer uso <strong>de</strong><br />

um recurso colocado à sua disposição pela legislação, em autêntica expectativa <strong>de</strong> direito, o mencionado recurso<br />

<strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> existir. Normas processuais aplicam-se <strong>de</strong> imediato, sem qualquer retroativida<strong>de</strong>. Essa é a regra.<br />

Naturalmente, não se <strong>de</strong>sconhece a exceção, que cuida do cenário das normas processuais penais materiais. São<br />

aquelas que, apesar <strong>de</strong> figurarem no contexto do processo penal, regendo atos praticados pelas partes durante a<br />

investigação ou durante o trâmite processual, possuem nítido conteúdo <strong>de</strong> Direito <strong>Penal</strong>. Essa essência <strong>de</strong> direito<br />

material é extraída das consequências que po<strong>de</strong>m provocar, quando utilizadas, o que lhes confere a <strong>de</strong>nominação <strong>de</strong><br />

instituto misto. Exemplos <strong>de</strong> normas processuais penais materiais são as que lidam com <strong>de</strong>cadência, perempção,<br />

perdão, renúncia, entre outros similares. Afinal, configurando-se a <strong>de</strong>cadência, a consequência no campo penal é<br />

evi<strong>de</strong>nte: ocorre a extinção da punibilida<strong>de</strong> (art. 107, IV, CP). Outras ilustrações <strong>de</strong> normais processuais penais<br />

materiais são as que se vinculam às formas <strong>de</strong> prisões cautelares, pois interferem, diretamente, na liberda<strong>de</strong><br />

individual. No mais, extrair um recurso qualquer do sistema processual, encurtar ou esten<strong>de</strong>r a instrução, permitir<br />

ou vedar <strong>de</strong>terminada prova, alterar prazos recursais, modificar o trâmite <strong>de</strong> certos recursos, enfim, transformar o<br />

processo é medida tipicamente instrumental, não se relacionando, em absoluto, com o direito material. Nada tem a<br />

ver a norma processual penal material com os direitos <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa do acusado, tais como ampla <strong>de</strong>fesa e<br />

contraditório. O réu não será con<strong>de</strong>nado e irá para a prisão porque se alterou uma norma processual. Será preso, se<br />

for o caso, porque foi julgado e consi<strong>de</strong>rado culpado. No entanto, o Direito <strong>Penal</strong> resta incólume, sem qualquer<br />

alteração. O protesto por novo júri não passava <strong>de</strong> uma segunda chance, concedida ao acusado, porque se entendia<br />

que a pena fora fixada em patamar elevado. Para a época talvez fosse mesmo, o que já não se coaduna com a<br />

realida<strong>de</strong>, pois inúmeras penas são mais severas do que 20 anos. E nem por isso os con<strong>de</strong>nados obtêm um novo<br />

julgamento. Não se po<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar o antigo direito ao protesto por novo júri como norma processual penal<br />

material somente pelo fato <strong>de</strong> que a sua interposição condicionava-se a um <strong>de</strong>terminado patamar <strong>de</strong> pena. Essa<br />

situação não tem o condão <strong>de</strong> transformar a norma processual pura em norma processual material. Note-se que,<br />

<strong>de</strong>ferido o protesto por novo júri, o réu que estava preso assim continuava e seguia a novo julgamento pronto a<br />

receber, sendo o caso, idêntica penalida<strong>de</strong>. Logo, po<strong>de</strong>ria continuar <strong>de</strong>tido como se nada tivesse sido alterado. E o<br />

acusado que estava em liberda<strong>de</strong>, nesse estado permanecia. Portanto, o protesto por novo júri não tinha qualquer<br />

ligação com a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> ir e vir. O protesto por novo júri não permitia a soltura do acusado, nem gerava a<br />

extinção da sua punibilida<strong>de</strong>. Em suma, <strong>de</strong>ferido ou não, nenhuma consequência no campo penal <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ava. A<br />

sua utilização não afetava o direito <strong>de</strong> punir do Estado. Aliás, cabia ao Tribunal do Júri, por intermédio <strong>de</strong> outro<br />

Conselho <strong>de</strong> Sentença, julgar novamente o caso. Nada mais. A sua extinção foi <strong>de</strong>terminada em boa hora,<br />

conferindo mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> ao sistema recursal no processo penal brasileiro e a norma puramente processual tem,<br />

indubitavelmente, aplicação imediata, colhendo todos os feitos em andamento, pouco importando quando o fato<br />

criminoso foi cometido. Na jurisprudência: STF: “I – O protesto por novo júri, que constituía prerrogativa <strong>de</strong><br />

índole processual e exclusiva do réu, cumpria função específica em nosso sistema jurídico: a invalidação do<br />

primeiro julgamento, que se <strong>de</strong>sconstituía para todos os efeitos jurídico-processuais, a fim <strong>de</strong> que novo julgamento<br />

fosse realizado, sem, contudo, afetar ou <strong>de</strong>sconstituir a sentença <strong>de</strong> pronúncia e o libelo-crime acusatório (HC<br />

67.737 – RJ e HC 70.953 – SP, Rel. Min. Celso <strong>de</strong> Mello). II – Esse recurso sui generis era cabível nas<br />

con<strong>de</strong>nações gravíssimas (vinte anos ou mais), com o escopo <strong>de</strong> realizar-se novo julgamento, sem invalidar

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