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Código de Processo Penal Comentado (2016) - Guilherme de Souza Nucci

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Suspeição 28.667-0/8, Mogi das Cruzes, Câmara Especial, rel. Yussef Cahali, 05.10.1995, v.u., RT 726/619).<br />

16. Amigo íntimo ou inimigo capital das partes: amiza<strong>de</strong> íntima é o forte e seguro vínculo <strong>de</strong> fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong><br />

e afeição nascido entre pessoas, implicando convívio amiú<strong>de</strong>. Logo, não se consi<strong>de</strong>ram laços superficiais,<br />

coleguismo profissional ou escolar, contatos sociais em clubes, associações ou outros lugares típicos <strong>de</strong> convívio,<br />

cordialida<strong>de</strong> no trato, nem tampouco pura afeição, simpatia ou ternura. Fosse assim e os motivos <strong>de</strong> suspeição<br />

cresceriam em medidas <strong>de</strong>sproporcionais à intenção da lei, que é a <strong>de</strong> evitar a atuação <strong>de</strong> magistrados efetivamente<br />

parciais na apreciação do caso. Inimiza<strong>de</strong> capital é a aversão contun<strong>de</strong>nte e inequívoca entre duas pessoas,<br />

implicando conhecimento geral ou, ao menos, em notorieda<strong>de</strong> parcial, que transcenda a terceiros. Não se concebe<br />

que dois indivíduos sejam inimigos capitais sem que ninguém saiba disso. Por outro prisma, não se incluem nessas<br />

situações meras rusgas, discussões calorosas, <strong>de</strong>sentendimentos no ambiente profissional ou escolar, disputas ou<br />

competições esportivas ou em outros setores, nem tampouco antipatia gratuita. É fundamental base solidificada <strong>de</strong><br />

atritos e mútuas agressões, físicas ou verbais, para que a aversão seja consi<strong>de</strong>rada profunda, logo, capital. As<br />

<strong>de</strong>cisões jurisdicionais que o magistrado tome contra o interesse das partes – <strong>de</strong>cretando a prisão cautelar do réu<br />

ou in<strong>de</strong>ferindo pedido nesse sentido feito pelo promotor, por exemplo, ainda que com fundamentação entusiasmada<br />

– não dá margem à inimiza<strong>de</strong>, mormente capital. Relata Espínola Filho a <strong>de</strong>cisão do Min. Mário Guimarães sobre o<br />

tema: “O procedimento acaso enérgico do juiz não justifica seja averbado <strong>de</strong> suspeito” (<strong>Código</strong> <strong>de</strong> <strong>Processo</strong> <strong>Penal</strong><br />

brasileiro anotado, v. 2, p. 259). E mais: tanto amiza<strong>de</strong> íntima, quanto inimiza<strong>de</strong> capital, são sentimentos<br />

recíprocos, sendo ilógico supor que alguém se torne amigo íntimo <strong>de</strong> outra pessoa, que não a consi<strong>de</strong>ra como tal,<br />

nem sequer inimigo capital po<strong>de</strong> ser unilateral e platônico. Costuma-se sustentar que esses especiais vínculos<br />

<strong>de</strong>vem ser mantidos com a parte e não com seu representante. Não abrangeria, pois, o representante do Ministério<br />

Público, nem o advogado, mas unicamente o réu e a vítima. Discordamos, com a <strong>de</strong>vida vênia. Em primeiro lugar,<br />

porque, no processo penal, a parte que ocupa o polo ativo é, via <strong>de</strong> regra, o Ministério Público, agindo em nome da<br />

socieda<strong>de</strong>. Contra esta é que o juiz não nutrirá particular vínculo <strong>de</strong> afeição ou ódio – e se o fizer, é caso<br />

patológico. Voltar-se-á, se for o caso, contra o seu representante. Por outro lado, o ofendido, quando não integra a<br />

relação processual, através do assistente <strong>de</strong> acusação, não po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado parte. Restaria apenas o réu,<br />

sabendo-se, ainda, que inúmeros casos <strong>de</strong> perda da parcialida<strong>de</strong> <strong>de</strong>correm da aversão existente, ou extrema afeição,<br />

entre juiz e <strong>de</strong>fensor. Por isso, se o objetivo maior é garantir a imparcialida<strong>de</strong> do magistrado, conforme preceito<br />

constitucional, é <strong>de</strong> ser aceita a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> arguição <strong>de</strong> exceção <strong>de</strong> suspeição, em caso <strong>de</strong> amiza<strong>de</strong> íntima ou<br />

inimiza<strong>de</strong> capital, entre juiz e promotor, bem como entre juiz e advogado. É o que resta sobejamente concretizado<br />

nas relações processuais existentes, não sendo possível ignorar o fato <strong>de</strong> o magistrado ser falível como todos, não<br />

conseguindo manter sua neutralida<strong>de</strong> se estima por <strong>de</strong>masia o promotor ou o o<strong>de</strong>ia com todas as forças. O mesmo<br />

se diga do <strong>de</strong>fensor. Dessa forma, se o juiz iniciou sua atuação em primeiro lugar, não cabe a alegação <strong>de</strong> que o réu<br />

contratou para sua <strong>de</strong>fesa um inimigo capital do magistrado para que este seja afastado. Se o fez, sendo alertado<br />

para o fato, assume o risco da perda da parcialida<strong>de</strong> do julgador, até porque a exceção <strong>de</strong> suspeição não é<br />

obrigatória. Entretanto, se o advogado já atuava no feito, trocando-se o juiz, é preciso que este se afaste ou po<strong>de</strong>rá<br />

ser interposta a <strong>de</strong>vida exceção. Sobre o assunto, mencionou Espínola Filho a lição <strong>de</strong> Heroti<strong>de</strong>s da Silva Lima, na<br />

linha que assumimos: “É preciso atentar para a realida<strong>de</strong> da vida. O magistrado po<strong>de</strong> ter motivos para ser agradável<br />

ao advogado e, favorecendo-o, favorecer diretamente a parte; e é sabido mesmo que certos indivíduos por esperteza<br />

ou por má-fé contratam <strong>de</strong>terminados advogados por saberem <strong>de</strong> suas ligações com os julgadores. Tem havido,<br />

infelizmente, casos que ferem a sensibilida<strong>de</strong> da opinião pública; advogados que <strong>de</strong>ixam certos cargos públicos são<br />

logo constituídos procuradores em questões <strong>de</strong> vulto e retumbantes, porque exerceram influência sobre juízes,<br />

nomeando-os e promovendo-os, <strong>de</strong>spertando-lhes sentimentos <strong>de</strong> gratidão. Às vezes, subitamente, certos<br />

escritórios se movimentam com a notícia <strong>de</strong> novos rumos na vida política. E <strong>de</strong>pois é preciso assinalar que o<br />

advogado tem interesse direto no êxito da questão submetida ao seu patrocínio, e pela vitória faz todo o esforço.

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