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Código de Processo Penal Comentado (2016) - Guilherme de Souza Nucci

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ser invocada por aquele que confiou as informações à testemunha psiquiatra, in casu, ao que parece, a vítima,<br />

pessoa que <strong>de</strong>tém, inclusive, o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> liberar o profissional do <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> guardar o sigilo. Assim, apesar da<br />

carência <strong>de</strong> elementos, do que se <strong>de</strong>nota dos autos, inexiste qualquer violação ao <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> sigilo profissional” (HC<br />

70052623014 – RS, 8.ª C., rel. Isabel <strong>de</strong> Borba Lucas, DJ 27.02.2013).<br />

45. Caso peculiar do advogado: estipula o Estatuto da Advocacia ser direito do advogado “recusar-se a<br />

<strong>de</strong>por como testemunha em processo no qual funcionou ou <strong>de</strong>va funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa<br />

<strong>de</strong> quem seja ou foi advogado, mesmo quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato<br />

que constitua sigilo profissional” (art. 7.º, XIX, com grifo nosso). Portanto, o advogado tem o direito <strong>de</strong> não <strong>de</strong>por<br />

como testemunha, ainda que seu cliente o libere do <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> sigilo e mesmo que seu <strong>de</strong>poimento produza algum<br />

interesse para o constituinte. Trata-se <strong>de</strong> medida salutar, pois o causídico <strong>de</strong>ve ser o único censor da sua<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> prestar <strong>de</strong>clarações. Afinal, muitas vezes, a liberação do <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> guardar segredo é pro forma,<br />

isto é, provocada por alguém – inclusive por autorida<strong>de</strong> policial ou judiciária – interessado em formar prova contra<br />

o cliente que, com temor <strong>de</strong> parecer culpado pela negativa <strong>de</strong> <strong>de</strong>sobrigação, termina concordando com o<br />

<strong>de</strong>poimento <strong>de</strong> seu ex-<strong>de</strong>fensor, por exemplo.<br />

46. Impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> liberação: há casos em que a <strong>de</strong>sobrigação pela parte interessada não po<strong>de</strong><br />

produzir efeito, porque o <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> guardar sigilo interessa à socieda<strong>de</strong> e não a alguém <strong>de</strong>terminado. É o caso, por<br />

exemplo, do juiz que ouve a confissão <strong>de</strong> um réu no interrogatório que presi<strong>de</strong>. Não po<strong>de</strong>, ainda que <strong>de</strong>sobrigado<br />

pelo acusado, <strong>de</strong>por em outro processo, afirmando ter sentido ser verda<strong>de</strong>ira ou falsa a confissão prestada. O<br />

interesse é público <strong>de</strong> que o magistrado preserve o sigilo funcional.<br />

47. Irrelevância da liberação para compor o <strong>de</strong>lito do art. 154 do <strong>Código</strong> <strong>Penal</strong>: lembra-nos, com<br />

pertinência, Hélio Tornaghi, que “a vonta<strong>de</strong> do interessado é, entretanto, irrelevante se o fato é notório, se se trata<br />

<strong>de</strong> mera futilida<strong>de</strong> ou se a publicida<strong>de</strong> é obrigatória por lei. Seria sem importância jurídica a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> um<br />

generalote que, tendo traído a pátria coram populo, pedisse a alguém para guardar segredo. Tampouco teria<br />

qualquer valor a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma senhora <strong>de</strong> que seu cabeleireiro não revelasse o fato <strong>de</strong> ela pintar os cabelos. E,<br />

finalmente, nada importaria que alguém preten<strong>de</strong>sse pedir segredo sobre uma citação constante <strong>de</strong> edital. Com<br />

respeito à notorieda<strong>de</strong>, todavia, é certo que <strong>de</strong>saparece a ilicitu<strong>de</strong> penal do ato praticado por quem veicula o fato<br />

antes oculto, uma vez que já não há mais segredo; permanece, entretanto, a proibição <strong>de</strong> <strong>de</strong>por”. Realmente, para<br />

a tipificação do <strong>de</strong>lito, se o fato é notório, não há mais relevância a tanto, embora não possam essas pessoas, do<br />

mesmo modo, prestar <strong>de</strong>poimento, salvo se <strong>de</strong>sobrigadas pelo interessado. Não teria cabimento um padre, que<br />

ouviu alguém em confissão, sob a assertiva <strong>de</strong> ser o fato <strong>de</strong> conhecimento público, apresentar-se para <strong>de</strong>por,<br />

narrando todos os <strong>de</strong>talhes do que ocorreu no interior do confessionário.<br />

47-A. Formação da materialida<strong>de</strong> do crime por meio <strong>de</strong> <strong>de</strong>poimentos ou documentos, em tese<br />

protegidos pelo sigilo: tivemos oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sustentar em nosso <strong>Código</strong> <strong>Penal</strong> comentado (nota 33 ao art.<br />

330), constituir crime <strong>de</strong> <strong>de</strong>sobediência o médico recusar-se a enviar o prontuário do paciente que aten<strong>de</strong>u, vítima<br />

<strong>de</strong> lesões corporais ou mesmo <strong>de</strong> tentativa <strong>de</strong> homicídio, a pretexto <strong>de</strong> estar preservando o sigilo médico. Ora, este<br />

direito diz respeito à intimida<strong>de</strong> e, no máximo, po<strong>de</strong> guardar correlação com fatos da vida particular do cliente, mas<br />

não po<strong>de</strong> servir <strong>de</strong> obstáculo à investigação <strong>de</strong> um crime <strong>de</strong> ação pública. Afinal, as lesões sofridas pela vítima não<br />

dizem respeito à intimida<strong>de</strong> do agente do crime, pois guardam relação com o interesse público. Por isso, para a<br />

formação do corpo <strong>de</strong> <strong>de</strong>lito, <strong>de</strong>ve o médico ou qualquer outra pessoa arrolada no art. 207 do <strong>Código</strong> <strong>de</strong> <strong>Processo</strong><br />

<strong>Penal</strong> colaborar, sob pena <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r por <strong>de</strong>sobediência. Acrescente-se a precisa lição <strong>de</strong> Rogério Lauria Tucci:<br />

“Do mesmo modo, o testemunho <strong>de</strong> qualquer das pessoas elencadas nos art. 207 e 355 das Codificações nacionais<br />

estudadas, ou seja, das proibidas <strong>de</strong> <strong>de</strong>por sobre fatos <strong>de</strong> que, ‘em razão <strong>de</strong> função, ministério, ofício ou profissão,<br />

<strong>de</strong>vam guardar segredo’ (grifado), apresenta-se eficaz, a nosso ver, à constatação e documentação do corpus

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