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2019-Direito Civil 3 - Fla_vio Tartuce - 2019

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“O que se deve fazer é justamente o oposto daquilo que atualmente ocorre em

nossa jurisprudência. O foco da análise deve se deslocar da questão da

imprevisibilidade e extraordinariedade (do acontecimento apontado como

‘causa’) para o desequilíbrio contratual em concreto. Trata-se, em essência, de

assegurar o equilíbrio contratual, e não de proteger as partes contra

acontecimentos que não poderiam ou não puderam antecipar no momento de sua

manifestação originária de vontade. A superação do voluntarismo exacerbado por

uma tábua axiológica de caráter solidarista consagrada em sede constitucional, se

não exige afastar inteiramente os requisitos da imprevisibilidade e

extraordinariedade, expressamente adotados pelos dispositivos legais constantes

do Código Civil brasileiro, impõe, todavia, que se reserve a tais expressões um

papel instrumental na atividade interpretativa voltada precipuamente à

preservação do equilíbrio do contrato. A imprevisibilidade e extraordinariedade

do acontecimento não devem representar um requisito autônomo, a ser perquirido

em abstrato com base em um acontecimento localizado a maior ou menor distância

do impacto concreto sobre o contrato, mas sim ficar intimamente associadas ao

referido impacto, o qual passa a consistir no real objeto da análise judicial.

Em outras palavras: se o desequilíbrio do contrato é exorbitante, isso por si só

deve fazer presumir a imprevisibilidade e extraordinariedade dos antecedentes

causais que conduziram ao desequilíbrio. O que se afigura indispensável à atuação

da ordem jurídica é que o desequilíbrio seja suficientemente grave, afetando

fundamentalmente o sacrifício econômico representado pelas obrigações

assumidas. Uma alteração drástica e intensa desse sacrifício recai

presumidamente sob o rótulo da imprevisibilidade e extraordinariedade, pois é de

se assumir que os contratantes não celebram contratos vislumbrando tamanha

modificação do equilíbrio contratual; se a tivessem vislumbrado, poderiam ter

disposto sobre o tema, para lhe negar efeitos por força de alguma razão inerente

ao escopo perseguido com aquele específico contrato (v.g., deliberada assunção

de risco por uma das partes). Os contratantes sujeitam-se, por essa razão, à

presunção de que não anteciparam a possibilidade do manifesto desequilíbrio –

presunção, em uma palavra, de imprevisão –, pela simples razão de que se espera

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