22.06.2013 Views

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

CAUSALIDADE 126 CAUSALIDADE<br />

como quando um terceiro vem somar-se a<br />

outros dois que carregam um peso com dificulda<strong>de</strong>,<br />

ajudando a sustentá-lo. Mas, para<br />

os estóicos, a causa por excelência é a sintética<br />

e, nesse sentido. Deus é causa e constitui o<br />

princípio ativo do mundo (DiÓG. L, VII, 134;<br />

SÊNECA, Ep., 65, 2). A <strong>filosofia</strong> medieval em pouco<br />

ou nada inovou o conceito da estrutura causai<br />

(porque substancial) do mundo. Sua principal<br />

contribuição é a elaboração do conceito <strong>de</strong><br />

causa primeira, em um sentido diferente do<br />

aristotélico, isto é, não como tipo <strong>de</strong> causa fundamental,<br />

mas como primeiro elo da ca<strong>de</strong>ia<br />

causai. A elaboração <strong>de</strong>sse conceito fora obra<br />

da Escolástica árabe e, em particular, <strong>de</strong> Avicena.<br />

Em lugar da estrutura substancial do universo,<br />

cuja C. constituiria a necessida<strong>de</strong> intrínseca,<br />

Avícena pòe a or<strong>de</strong>nação hierárquica das<br />

causas, que remontam à Causa Primeira. Diz S.<br />

Tomás (S. Th., II, 1, q. 19, a. 4): "Em todas as<br />

causas or<strong>de</strong>nadas, o efeito <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> mais da<br />

causa primeira do que da causa segunda, porque<br />

a causa segunda só age em virtu<strong>de</strong> da causa<br />

primeira". O teorema fundamental que rege<br />

essa concatenação universal causai e o sevi caráter<br />

hierárquico é o que S. Tomás exprime dizendo:<br />

"Quanto mais alta é uma causa, tanto<br />

mais amplo o seu po<strong>de</strong>r causai" (Ibid, I, q. 65,<br />

a. 3): teorema <strong>de</strong> franca origem neoplatônica,<br />

já que os neoplatônicos tinham reconhecido,<br />

juntamente com o caráter universal da necessida<strong>de</strong><br />

causai, a hierarquia das causas a partir da<br />

causa primeira (PROCLO, Inst. theol, 11). Um<br />

produto <strong>de</strong>ssa doutrina po<strong>de</strong> ser visto no ocasíonalismo<br />

(v.), segundo o qual a única e verda<strong>de</strong>ira<br />

causa é Deus, e as chamadas causas<br />

segundas ou finitas são apenas ocasiões <strong>de</strong> que<br />

Deus se serve para realizar os seus <strong>de</strong>cretos<br />

(MALEBRANCHE, Recherche <strong>de</strong> Ia vérité, VI, 2, 3).<br />

O conceito aristotélico-árabe <strong>de</strong> uma or<strong>de</strong>m<br />

necessária no mundo, no qual todos os eventos<br />

encontram seu lugar e sua concatenação causai,<br />

é <strong>de</strong>fendido, no Renascimento, pelos aristotélicos<br />

como pressuposto essencial do seu naturalismo.<br />

Assim, Pomponazzi preten<strong>de</strong> remeter<br />

até os acontecimentos mais extraordinários e<br />

miraculosos à or<strong>de</strong>m necessária da natureza e,<br />

para isso, utiliza o <strong>de</strong>terminismo astrológico<br />

dos árabes (De incantationibus, 10). A noção<br />

<strong>de</strong> uma or<strong>de</strong>m causai do mundo (às vezes<br />

remetida a Deus como primeira causa), segundo<br />

o conceito neoplatônico e medieval,<br />

forma ainda o pressuposto e o fundamento dos<br />

primórdios da organização da ciência, com Co-<br />

pérnico, Kepler e Galileu. Essas bases são expressas<br />

em termos mecanicistas por Hobbes e,<br />

em termos teológicos, por Spinoza, mas são<br />

sempre as mesmas. Hobbes julga que a relação<br />

causai se reduz à ação <strong>de</strong> um corpo sobre o<br />

outro e que, portanto, a causa é o que gera ou<br />

<strong>de</strong>strói certo estado <strong>de</strong> coisas em um corpo (De<br />

corp., IX, 1). A causa perfeita, isto é, aquela a<br />

que segue infalivelmente o efeito, é o agregado<br />

<strong>de</strong> todos "os aci<strong>de</strong>ntes ativos" que existirem:<br />

com ela, o efeito já está dado (Ibid., IX, 3). A<br />

concantenção dos movimentos constitui a or<strong>de</strong>nação<br />

causai do mundo. Por sua vez, Spinoza,<br />

ao ver em Deus a única substância, também vê<br />

nele a única causa da qual todas as coisas e<br />

todos os eventos do mundo (os "modos" da<br />

Substância) <strong>de</strong>rivam com necessida<strong>de</strong> geométrica<br />

(Et., I, 29). A necessida<strong>de</strong> causai que, para<br />

Hobbes, é uma concantenação dos movimentos,<br />

para Spinoza é uma concatenação <strong>de</strong> razões,<br />

isto é, <strong>de</strong> verda<strong>de</strong>s que constituem uma ca<strong>de</strong>ia<br />

ininterrupta. Além disso, para Hobbes o caráter<br />

mecânico da C. não diminui sua natureza racional,<br />

já que, aliás, Hobbes vê no mecanismo a<br />

única explicação racional do mundo, no corpo<br />

e no movimento os dois únicos princípios <strong>de</strong><br />

explicação, não reconhecendo outras realida<strong>de</strong>s<br />

fora <strong>de</strong>les. Isso acontece porque para ele,<br />

assim como para Spinoza, prevalece a i<strong>de</strong>ntificação,<br />

aceita por Descartes, entre causa e razão.<br />

A causa é o que dã a razão do efeito, <strong>de</strong>monstra<br />

ou justifica sua existência ou suas<br />

<strong>de</strong>terminações. É assim que Descartes a concebe<br />

quando, <strong>de</strong>finindo como analítico o método<br />

que emprega, afirma que ele "<strong>de</strong>monstra<br />

como os efeitos <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m das causas" (Secon<strong>de</strong>s<br />

repouses). Isso significa que a causa é o<br />

que permite <strong>de</strong>duzir o efeito. E o significado<br />

daquele "princípio <strong>de</strong> razão suficiente" formulado<br />

por Leibniz como base das verda<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

fato é que explicar por meio da causa é "dar a<br />

razão" daquilo que existe. "Nada acontece",<br />

disse Leibniz (Théod., § 44), "sem que haja uma<br />

causa ou pelo menos uma razão <strong>de</strong>terminante,<br />

isto é, algo que possa servir para dar a razão a<br />

priori <strong>de</strong> por que algo existe ao invés <strong>de</strong> não<br />

existir e <strong>de</strong> por que existe <strong>de</strong>sse modo e não<br />

<strong>de</strong> outro". Sem dúvida, esse ponto <strong>de</strong> vista<br />

não constituía uma novida<strong>de</strong> na história da noção<br />

<strong>de</strong> causa; a preeminência, reconhecida por<br />

Aristóteles, da substância como essência racional<br />

(logos) ou forma significava, precisamente,<br />

a exigência <strong>de</strong> que a causa constituísse a razão<br />

da coisa ou, em outras palavras, que tornasse

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!