22.06.2013 Views

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

RAZÃO 825 RAZÃO<br />

(PLATÃO, Tini., 70a; ARISTÓTELES, Et. nic, I, 13,<br />

1102 b, 15). Em ambos os casos, R. tem, ao mesmo<br />

tempo, função negativa e positiva: negativa<br />

em relação às crenças infundadas e aos apetites<br />

animais; positiva no sentido <strong>de</strong> dirigir as<br />

ativida<strong>de</strong>s humanas <strong>de</strong> maneira uniforme e constante.<br />

Mas foi principalmente com os estóicos<br />

que prevaleceu a doutrina da R. como único<br />

guia dos homens. Para eles, havia uma espécie<br />

<strong>de</strong> divisão simétrica entre os animais e os homens:<br />

os animais são guiados pelo instinto,<br />

que os leva a conservar-se e a procurar o que<br />

é vantajoso; aos homens foi dado o guia mais<br />

perfeito, que é a R.; <strong>de</strong>sse modo, para eles, viver<br />

segundo a natureza significa viver segundo<br />

a R. (Dióc;. L, VII, 1, 15-86). Esses conceitos<br />

constituíram um dos eixos da cultura clássica.<br />

Cícero dizia: "A R., única diferença que nos distingue<br />

do bruto, por meio da qual po<strong>de</strong>mos<br />

conjecturar, argumentar, rebater, discutir, levar<br />

a termo e concluir, certamente é comum a todos;<br />

diferente em termos <strong>de</strong> preparação, mas<br />

igual quanto a ser faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r" (De<br />

leg., I, 10, 30). Sêneca exaltava a R. por sua<br />

imutabilida<strong>de</strong> e universalida<strong>de</strong>:. "A R. é imutável<br />

e firme no seu juízo porque não é escrava,<br />

mas senhora, dos sentidos. A R. é igual à R. assim<br />

como o justo ao justo; portanto também a<br />

virtu<strong>de</strong> é igual à virtu<strong>de</strong> porque a virtu<strong>de</strong> outra<br />

coisa não é senão a reta R. r (Ip., 66). Deste<br />

ponto <strong>de</strong> vista também a metafísica estóica da<br />

R., para a qual ela é — como diz o próprio<br />

Sêneca (Ibicl.) — "uma parte do espírito divino<br />

infundida no corpo do homem", não nega sua<br />

autonomia, mas, ao contrário, exalta-a e confirma-a.<br />

Certamente foi nesses conceitos que S.<br />

Agostinho se inspirou ao fazer o elogio da R.,<br />

que constitui os últimos capítulos <strong>de</strong> De online:<br />

"A R. é o movimento da mente que po<strong>de</strong> distinguir<br />

e correlacionar tudo o que se apren<strong>de</strong>"<br />

(De orei., II, 11, 30). É a força criadora do mundo<br />

humano: inventou a linguagem, a escrita, o<br />

cálculo, as artes, as ciências; é o que <strong>de</strong> imortal<br />

existe no homem (Ibicl., II, 19, 50). O entusiasmo<br />

<strong>de</strong> S. Agostinho pela razão se explica facilmente:<br />

para ele, a vida é busca, e a R. é o<br />

princípio que institui e dirige a busca, tornando-a<br />

fecunda.<br />

No entanto, o neoplatonismo já subordinara<br />

a R. ao intelecto, consi<strong>de</strong>rando-o superior á<br />

razão porque dotado do caráter intuitivo ou<br />

imediato que o transforma na visão direta da<br />

verda<strong>de</strong>. Segundo Plotino, a R. emana do intelecto,<br />

"que está presente em todas as coisas<br />

que são" (Enn., III, 2, 2). Em outros termos, ela<br />

é a função formadora e plasmadora do intelecto;<br />

para dispor todas as coisas do mundo (boas<br />

e más) em sua or<strong>de</strong>m apropriada, ela <strong>de</strong>ve<br />

adaptar-se ã matéria (Ibicl., III, 2, 11-12). Nesse<br />

sentido, a R. é a técnica da criação e do governo<br />

do mundo, pois graças a ela os seres criados<br />

não se clestroem entre si, mas concordam e<br />

combinam-se da melhor maneira. Plotino diz:<br />

"Graças à R., cada ser age ou sofre ações segundo<br />

necessida<strong>de</strong>s, e não ao acaso e <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nadamente"<br />

(Ibicl., II, 3, 16). Esse conceito <strong>de</strong><br />

superiorida<strong>de</strong> cio intelecto foi herdado pela<br />

escolástica medieval. R. e intelecto são i<strong>de</strong>ntificados<br />

no significado geral <strong>de</strong> princípio orientador<br />

(cf.. p. ex., S. TOMÁS m: AQUINO, ,S. Th., I, q.<br />

29, a. 3, ad. 4 y ; q. 79, a. 8). Mas em seguida a<br />

razão é subordinada ao intelecto por seu caráter<br />

discursivo, que parece inferior ao caráter<br />

intuitivo daquele (v. adiante). Mais tar<strong>de</strong>, o<br />

próprio Bacon consi<strong>de</strong>rava a R. como uma<br />

ativida<strong>de</strong> especial do intelecto (ao lado da memória<br />

e da fantasia), mais precisamente a função<br />

cuja tarefa é dividir e compor as noções<br />

abstratas "segundo a lei da natureza e a evidência<br />

das próprias coisas" (De augm. scíetit.. II,<br />

1). Assim, é só com Descartes que a R. volta a<br />

ser o guia fundamental do homem.<br />

I<strong>de</strong>ntificando razão e bom senso, Descartes<br />

restabelece o conceito clássico <strong>de</strong> R., e com<br />

base nele formula o problema novo do método.<br />

"A capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> bem julgar e <strong>de</strong> distinguir<br />

o verda<strong>de</strong>iro do falso, que recebe o nome <strong>de</strong><br />

senso ou R., é por natureza igual em todos os<br />

homens; portanto, a disparida<strong>de</strong> <strong>de</strong> nossas opiniões<br />

não provém do fato cie que umas são<br />

mais racionais que as outras, mas apenas <strong>de</strong><br />

conduzirmos nossos pensamentos por caminhos<br />

diferentes, sem levar as coisas em consi<strong>de</strong>ração.<br />

Não basta ter o espírito são; o principal<br />

é aplicá-lo bem" (Discours, I). Estas palavras<br />

famosas reintrocluziram no mundo<br />

mo<strong>de</strong>rno o conceito antigo (e especialmente<br />

estóico) <strong>de</strong> R. como guia <strong>de</strong> lodo o gênero<br />

humano. Assim, Spinoza surpreendia-se ao ver<br />

que às vezes queriam "submeter a R., máximo<br />

ciom <strong>de</strong> Deus e luz realmente divina, às palavras",<br />

não se consi<strong>de</strong>rando crime "falar inclignamente<br />

<strong>de</strong>sse verda<strong>de</strong>iro testemunho do Verbo<br />

<strong>de</strong> Deus, que é a R., <strong>de</strong>clarando-a corrupta,<br />

cega e impura" (Tmct. theologico-jwliticus,<br />

cap. 15). Leibniz, por sua vez, insistia na velha<br />

tese <strong>de</strong> que a R. pertence ao homem e somente<br />

ao homem (your. ess., IV, 17, 2), e I.ocke atri-

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!