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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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ENTUSIASMO 336 ENUMERAÇÃO<br />

ral e intelectual, como se vê, tem o mesmo caráter<br />

do outro: dá aos sentidos e ao pensamento<br />

um po<strong>de</strong>r sobre-humano, elimina os limites<br />

em que o homem se acha "ordinariamente"<br />

encerrado e é assumido como justificação da<br />

infalibilida<strong>de</strong> ou da impecabilida<strong>de</strong> do homem.<br />

Quando, a partir da segunda meta<strong>de</strong> do séc.<br />

XVII, com o Empirismo e o Iluminismo, esses<br />

limites são claramente reconhecidos, o E. também<br />

é reconhecido pelo que é: uma justificação<br />

do dogmatismo e da intolerância; é o que<br />

faz Locke, em famoso capítulo <strong>de</strong> Ensaio (IV,<br />

19). O E., que não se funda nem na razão nem<br />

na revelação divina, não é senão uma presunção<br />

<strong>de</strong> infalibilida<strong>de</strong>: a luz a que os entusiastas<br />

fazem menção é "um ignisfatuus que os fará<br />

girar continuamente <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>sse círculo: é uma<br />

revelação, porque eles acreditam nisso firmemente;<br />

e acreditam firmemente porque é uma<br />

revelação" Qbid., IV, 19, 10). Segundo Locke,<br />

esse círculo é tudo o que o E. consegue encontrar<br />

como apoio. Leibniz concordava com<br />

Locke aduzindo certo número <strong>de</strong> exemplos <strong>de</strong><br />

E. fanático e observava: "As dissensões <strong>de</strong>ssas<br />

pessoas entre si <strong>de</strong>veriam convencê-las <strong>de</strong><br />

que seu pretenso testemunho interno não é<br />

absolutamente divino e que precisa <strong>de</strong> outros<br />

sinais para justificar-se" (Nouv. ess., IV, 29,<br />

§ 16). Mais tar<strong>de</strong>, Leibniz a<strong>de</strong>ria às idéias expressas<br />

por Shaftesbury (Recueil <strong>de</strong> diverses pièces<br />

surlapbilosophie, Ia religíon naturelle, Vhistoire,<br />

les mathématiques, etc, <strong>de</strong> Leibniz, Clarke,<br />

Newton, etc, Lausanne, 3 a - ed., 1759, II, pp.<br />

311-34).<br />

A Carta sobre o E. (1708) <strong>de</strong> Shaftesbury estabelece<br />

pela primeira vez a oposição entre E. e<br />

ironia, que foi um dos temas preferidos do iluminismo<br />

setecentista e é um dos temas do iluminismo<br />

<strong>de</strong> todos os tempos. Shaftesbury insistiu<br />

na capacida<strong>de</strong> liberadora do riso: "Estou seguro<br />

<strong>de</strong> que só existe um caminho para salvaguardar<br />

os homens e preservar o tino do mundo: a<br />

liberda<strong>de</strong> espiritual. Ora, o espírito nunca será<br />

livre se não houver ironia livre, porque contra<br />

as gran<strong>de</strong>s extravagâncias e os humores biliosos<br />

outro remédio não há além <strong>de</strong>sse" {A Letter<br />

concerningEnthusiasm, 2; trad. it., Garin, p. 44).<br />

A razão e o que nela se apoia nada têm a temer<br />

do ridículo, mas o ridículo é uma arma po<strong>de</strong>rosa<br />

contra a aparência que não é substância, logo<br />

contra o saber ilusório e a virtu<strong>de</strong> hipócrita. A<br />

obra <strong>de</strong> Voltaire inspirou-se nessa concepção<br />

fundamental. O próprio Voltaire afirmava que o<br />

E. "é sobretudo a herança da <strong>de</strong>voção mal-<br />

entendida" e só concedia aos poetas o "entusiasmo<br />

razoável" (Dictionnaire philosophique,<br />

art. Enthousiasme, 1765). As Cartas Persas <strong>de</strong><br />

Montesquieu são outra manifestação da mesma<br />

tendência. Em Kant a crítica do E. era crítica do<br />

fanatismo, e a luta contra o fanatismo era o objetivo<br />

fundamental <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong> filosófica (v.<br />

FANATISMO). Mas, por uma das não raras ironias<br />

da história, essa luta <strong>de</strong>veria prenunciar uma<br />

das maiores explosões <strong>de</strong> E. fanático conhecidas<br />

pela <strong>filosofia</strong>: o Romantismo. Por isso, não<br />

é <strong>de</strong> surpreen<strong>de</strong>r a <strong>de</strong>fesa do E. num dos manifestos<br />

do Romantismo europeu, De VAllemagne,<br />

<strong>de</strong> Madame <strong>de</strong> Staêl (ed. <strong>de</strong> 1813, p. 603).<br />

Na <strong>filosofia</strong> contemporânea, Jaspers <strong>de</strong>finiu<br />

o E. <strong>de</strong> acordo com o conceito tradicional e<br />

apreciou-o positivamente. "Na atitu<strong>de</strong> entusiástica",<br />

disse ele, "o homem se sente tocado em<br />

sua substância mais íntima, em sua essencialida<strong>de</strong><br />

ou — o que dá no mesmo — sente-se<br />

arrebatado e comovido pela totalida<strong>de</strong>, pela<br />

substancialida<strong>de</strong>, pela essencialida<strong>de</strong> do mundo"<br />

(Psychologie <strong>de</strong>r Weltanschauungen, I, C;<br />

trad. it., pp. 138 ss.). Contudo, Jaspers distinguiu<br />

o E. do fanatismo, no sentido <strong>de</strong> que,<br />

enquanto o entusiasta "se obstina em manter<br />

firmes suas idéias, mas tem vivacida<strong>de</strong> e vitalida<strong>de</strong><br />

para aperceber-se do novo", o fanático<br />

"fica fechado em <strong>de</strong>terminada fórmula ou<br />

numa idéia fixa" (Ibid., p. 162).<br />

ENUMERAÇÃO (in. Enumeration; fr. Énumération;<br />

ai. Aufzãhlung; it. Enumerazione).<br />

A quarta regra do método enunciada por Descartes<br />

na segunda parte do Discurso-. "Fazer<br />

em tudo E. tão completas e revisões tão gerais<br />

que se esteja seguro <strong>de</strong> nada omitir". Assim<br />

expressa, essa regra refere-se mais ao controle<br />

dos resultados do procedimento racional do<br />

que à <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong>sses resultados. Tem maior<br />

alcance a regra correspon<strong>de</strong>nte (a VII) <strong>de</strong><br />

Regulae ad directionem ingenii, em que a E. é<br />

i<strong>de</strong>ntificada com a indução: "Essa E. ou indução<br />

é, portanto, a investigação <strong>de</strong> tudo o que<br />

se refere a dada questão, tão diligente e cuidadosa<br />

que a partir <strong>de</strong>la concluímos com certeza<br />

e evidência que nada negligenciamos... Por<br />

enumeração suficiente ou indução enten<strong>de</strong>mos<br />

somente aquela da qual se conclui uma verda<strong>de</strong><br />

com mais certeza do que com qualquer<br />

outro gênero <strong>de</strong> prova, salvo pela simples intuição".<br />

Com isso parece que Descartes faz referência<br />

ao procedimento que Bacon chamara<br />

<strong>de</strong> "E. simples", em que via uma forma imper-

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