22.06.2013 Views

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

EXISTENCIAUSMO 403 EXISTENCIALISMO<br />

espirituais, em <strong>de</strong>trimento do que é terrestre,<br />

material, mundano, etc. O E. reconhece, sem<br />

pudores, a importância e o peso que têm para<br />

o homem a exteriorida<strong>de</strong>, a materialida<strong>de</strong>, a<br />

"mundanida<strong>de</strong>" em geral, don<strong>de</strong> as condições<br />

da realida<strong>de</strong> humana que estão compreendidas<br />

sob esses termos: necessida<strong>de</strong>s, uso e produção<br />

das coisas, sexo, etc. O romantismo consi<strong>de</strong>ra<br />

insignificantes certos aspectos negativos<br />

da experiência humana, como a dor, o fracasso,<br />

a doença, a morte, porque não dizem respeito<br />

ao princípio infinito que se manifesta no<br />

homem e, portanto, "não existem" para ele. O<br />

E. consi<strong>de</strong>ra tais aspectos particularmente significativos<br />

para a realida<strong>de</strong> humana e insiste<br />

neles ao interpretá-la.<br />

A antítese entre os temas fundamentais do<br />

E. e os do romantismo é índice das diferentes<br />

categorias <strong>de</strong> que as duas correntes lançam<br />

mão para interpretar a realida<strong>de</strong>, enten<strong>de</strong>ndose<br />

por categoria um instrumento <strong>de</strong> análise, ou<br />

seja, um instrumento <strong>de</strong> <strong>de</strong>scrição e interpretação<br />

da realida<strong>de</strong>. Dissemos que a análise existencial<br />

é análise <strong>de</strong> relações: estas se acentuam<br />

em torno do homem, mas imediatamente vão<br />

para além <strong>de</strong>le, porque o vinculam (<strong>de</strong> diversos<br />

modos, que é preciso <strong>de</strong>terminar) à realida<strong>de</strong><br />

e ao mundo <strong>de</strong> que faz parte ou, em<br />

outras palavras, aos outros homens ou às coisas.<br />

Ora, essas relações não têm natureza estática,<br />

não são, p. ex., apenas relações <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>,<br />

semelhança, etc. As relações do homem<br />

com as coisas são constituídas pelas possibilida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> que o homem dispõe (em maior<br />

medida ou menor grau, conforme as diversas<br />

situações naturais e históricas) para usar as coisas<br />

e manipulá-las (com o trabalho), a fim <strong>de</strong><br />

prover as suas necessida<strong>de</strong>s. E as relações com<br />

os outros homens consistem em possibilida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> colaboração, solidarieda<strong>de</strong>, comunicação, amiza<strong>de</strong>,<br />

etc, que têm também graus e formas<br />

diferentes, conforme as diversas condições naturais,<br />

sociais e históricas. Ora, dizer que alguma<br />

coisa é possível significa prever e projetar<br />

ativamente. Portanto as possibilida<strong>de</strong>s humanas<br />

geralmente têm mesmo um caráter <strong>de</strong> antecipação<br />

(porque voltado para o futuro) das<br />

expectativas ou dos projetos, e as normas que<br />

as disciplinam — <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as normas da ciência e<br />

da técnica até as dos costumes, da moral, do direito,<br />

da religião, etc. — servem para dar certo<br />

fundamento e certa garantia <strong>de</strong> êxito às expectativas<br />

e aos projetos. Assim, p. ex., as normas<br />

técnicas servem para garantir que certo objeto<br />

(uma casa, uma máquina) possa ser construído<br />

ou produzido <strong>de</strong> modo a satisfazer <strong>de</strong>terminada<br />

necessida<strong>de</strong>; as normas morais servem para<br />

garantir que as relações humanas possam<br />

<strong>de</strong>senrolar-se da forma mais pacífica e or<strong>de</strong>nada<br />

possível, etc. As expectativas ou projetos,<br />

porém, continuam sendo o que são:<br />

possibilida<strong>de</strong>s cuja realização é mais ou menos<br />

segura, mas nunca infalível (uma casa<br />

po<strong>de</strong> cair, sua comodida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser maior ou<br />

menor; uma máquina po<strong>de</strong> sair com <strong>de</strong>feito ou<br />

inútil; as relações humanas po<strong>de</strong>m passar da<br />

or<strong>de</strong>m à <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m, da paz à hostilida<strong>de</strong>, etc).<br />

Por isso, a categoria <strong>de</strong>scritiva e interpretativa<br />

fundamental <strong>de</strong> que o E. se vale é a da possibilida<strong>de</strong>.<br />

As várias tendências do E. po<strong>de</strong>m ser reconhecidas<br />

e distinguidas a partir do significado<br />

que dão à categoria da possibilida<strong>de</strong> e do uso<br />

que <strong>de</strong>la fazem. Assim, é possível distinguir<br />

três tendências principais, cujos fundamentos<br />

são, respectivamente: 1 Q impossibilida<strong>de</strong> do<br />

possível; 2 a necessida<strong>de</strong> do possível; 3 a possibilida<strong>de</strong><br />

do possível.<br />

I a Já em meados do séc. XIX, Kierkegaard<br />

insistira na importância da categoria da possibilida<strong>de</strong>,<br />

e por isso é a ele que os filósofos da<br />

existência costumam reportar-se. Mas Kierkegaard<br />

também insistira no aspecto nadificante<br />

do possível, que torna problemáticas e negativas<br />

tanto as relações do homem com o mundo<br />

quanto as relações do homem consigo mesmo<br />

e com Deus. De fato, segundo Kierkegaard, as<br />

relações do homem com o mundo são dominadas<br />

pela angústia, que leva o homem a perceber<br />

que a possibilida<strong>de</strong> corrói e <strong>de</strong>strói as expectativas<br />

ou capacida<strong>de</strong>s humanas além <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>stroçar cálculos e habilida<strong>de</strong>s com a ação do<br />

acaso e das possibilida<strong>de</strong>s insuspeitas (Conceito<br />

da angústia, 1844). A relação do homem<br />

consigo mesmo, que constitui o eu, é dominada<br />

pela <strong>de</strong>sesperaçâo, ou seja, pela condição na<br />

qual o homem se encontra porque percorreu<br />

uma possibilida<strong>de</strong> após outra sem <strong>de</strong>ter-se ou<br />

porque esgotou suas limitadas possibilida<strong>de</strong>s, e<br />

o futuro se fecha diante <strong>de</strong>le (A doença mortal,<br />

1849). A própria relação com Deus — que parece<br />

oferecer ao homem um caminho <strong>de</strong> salvação<br />

da angústia e do <strong>de</strong>sespero (porque "para<br />

Deus tudo é possível") —, por não ter garantias<br />

absolutas e por ser dominada pelo paradoxo,<br />

não po<strong>de</strong> oferecer certeza nem repouso (Temor<br />

e tremor, 1843; Diário, passim). Desse<br />

modo, ao analisar a existência humana com

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!