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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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EMOÇÃO 314 EMOÇÃO<br />

úteis e a persistir nesse <strong>de</strong>sejo, além <strong>de</strong> produzir<br />

a excitação dos espíritos vitais que facilita os<br />

movimentos corpóreos úteis à consecução <strong>de</strong>ssas<br />

coisas (Ibid., 52). Para Descartes, há só seis<br />

E. simples e primitivas: admiração, amor, ódio,<br />

<strong>de</strong>sejo, alegria e tristeza; todas as outras são<br />

compostas por essas seis ou são espécies <strong>de</strong>las.<br />

Ele rejeita a distinção tomista entre paixões pertencentes<br />

à parte concupiscível e paixões não<br />

pertencentes à parte concupiscível (Ibid., 68); o<br />

estranho é que nem o temor nem a esperança<br />

são admitidos no rol das E. fundamentais. Entretanto,<br />

nele está incluída a admiração, que é<br />

"a súbita surpresa da alma, que a impele a consi<strong>de</strong>rar<br />

com atenção os objetos que lhe pareçam<br />

raros e extraordinários" (Ibid., 70). Essa é<br />

a única E. não acompanhada <strong>de</strong> movimentos<br />

corpóreos, porque não tem como objeto o bem<br />

e o mal, mas só o conhecimento da coisa que<br />

causa admiração. O que não significa que é<br />

<strong>de</strong>sprovida <strong>de</strong> força, pois a surpresa da novida<strong>de</strong>,<br />

típica <strong>de</strong>ssa E., reforça enormemente todas<br />

as outras (Ibid., 72).<br />

Se para Descartes a E. diz respeito à alma só<br />

em termos <strong>de</strong> sua relação com o corpo, para<br />

Spinoza ela é um modo <strong>de</strong> ser total que envolve<br />

alma e corpo, que são dois aspectos <strong>de</strong> uma<br />

única realida<strong>de</strong>. Segundo Spinoza, as E. <strong>de</strong>rivam<br />

do esforço (conatus) da mente em perseverar<br />

no próprio ser por um período in<strong>de</strong>finido.<br />

Esse esforço chama-se vonta<strong>de</strong> quando<br />

se refere só à mente: chama-se <strong>de</strong>sejo (appetitus)<br />

quando se refere à mente e ao corpo (Et.,<br />

III, 9 e, scol.). O <strong>de</strong>sejo é assim a E. fundamental.<br />

A ele estão ligadas as outras duas E. primárias,<br />

alegria e dor; a alegria é a E. graças à qual<br />

a mente, sozinha ou unida ao corpo, eleva-se<br />

para uma perfeição maior; e a dor é a E. graças<br />

à qual a mente <strong>de</strong>sce para uma perfeição menor<br />

(Ibid., III, 11, scol.). O amor e o ódio são,<br />

apenas a alegria e a dor acompanhadas da idéia<br />

<strong>de</strong> suas causas externas; assim, quem ama<br />

esforça-se necessariamente por manter consigo<br />

e conservar a coisa amada, e quem o<strong>de</strong>ia<br />

esforça-se por afastar e <strong>de</strong>staiír a coisa odiada<br />

(Ibid., III, 13, schol.). Nessas observações, as<br />

E. são vinculadas ao esforço da mente e do<br />

corpo para a perfeição; na verda<strong>de</strong>, para Spinoza<br />

corpo e mente são duas manifestações da<br />

Substância, são eternas como a Substância; portanto,<br />

não po<strong>de</strong>m ser realmente ameaçados por<br />

nada, <strong>de</strong> tal sorte que as E. não po<strong>de</strong>m ser a<br />

advertência <strong>de</strong>ssa ameaça. Don<strong>de</strong> o pouco peso<br />

que o medo e a esperança têm na análise <strong>de</strong><br />

Spinoza. Ambas as E. são relacionadas com o<br />

amor e ódio (Ibid., III, 18, scol. 2) e atribuídas a<br />

"causas aci<strong>de</strong>ntais" (Ibid., III, 50). De resto, todas<br />

as E., enquanto afeições ou modificações passivas<br />

(passiones), estão <strong>de</strong>stinadas a <strong>de</strong>saparecer<br />

como tais, pois são idéias confusas <strong>de</strong>stinadas<br />

a tornar-se idéias distintas; uma vez idéias<br />

distintas, <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> ser afeições (Ibid., V, 3)<br />

para tornar-se idéias sub specie aeternitatis, na<br />

or<strong>de</strong>m geométrica da Substância divina. São,<br />

então, <strong>de</strong>terminações da natureza divina e <strong>de</strong>la<br />

<strong>de</strong>rivam (Ibid., V, 29, scol.).<br />

Esse ponto <strong>de</strong> vista coinci<strong>de</strong> substancialmente<br />

com o dos estóicos, visto resolver-se<br />

em negar a função das E. na economia da vida<br />

humana no mundo. E a mesma negação está<br />

implícita na doutrina <strong>de</strong> Leibniz, que vê nas E.<br />

somente sinais <strong>de</strong> imperfeição que impe<strong>de</strong>m a<br />

alma <strong>de</strong> ser um Deus: "Tem-se razão em chamar,<br />

como os antigos, <strong>de</strong> perturbações ou<br />

paixões aquilo que consiste em pensamentos<br />

confusos que têm algo <strong>de</strong> involuntário e <strong>de</strong><br />

incógnito; o que, na linguagem comum, atribui-se<br />

não sem razão à luta do corpo e do<br />

espírito, porque os nossos pensamentos confusos<br />

representam o corpo- ou a carne e fazem<br />

nossa imperfeição" (Op., ed. Erdmann, 1, p.<br />

188). Essa noção das E. como "pensamentos<br />

confusos" que, para a alma, <strong>de</strong>rivam <strong>de</strong> sua relação<br />

com o corpo, constituindo, portanto, a imperfeição<br />

do espírito criado finito, foi adotada<br />

por toda a escola <strong>de</strong> Leibniz e Wolff. Essa noção<br />

obviamente implica que as E. não têm caráter<br />

próprio e específico se comparadas com<br />

as representações cognitivas: portanto, não têm<br />

sequer significado, a não ser representar a imperfeição<br />

da alma humana.<br />

Uma linha <strong>de</strong> pensamento que vai <strong>de</strong> Pascal<br />

aos moralistas franceses e ingleses (La Rochefoucauld,<br />

Vauvenargues, Shaftesbury, Butler),<br />

até Rousseau e Kant, levou ao reconhecimento<br />

da categoria "sentimento" como princípio autônomo<br />

<strong>de</strong> E. e à elaboração da noção mo<strong>de</strong>rna<br />

<strong>de</strong> "paixão" como E. dominante, capaz <strong>de</strong> penetrar<br />

e controlar toda a personalida<strong>de</strong> humana.<br />

Já se viu que para Hobbes todas as formas<br />

da ação voluntária passam pelas E. e são <strong>de</strong>terminadas<br />

por elas: a própria vonta<strong>de</strong> é apenas<br />

uma E. que consegue prevalecer. Essa tese é<br />

compartilhada por toda a corrente a que aludimos.<br />

Pascal foi o primeiro a dar primazia "às razões<br />

do coração, que a razão não conhece"<br />

(Pensées, 277); insistiu no valor e na função do<br />

"sentimento" como um princípio em si, que

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