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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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FE 433 FELAPTO<br />

moral, ou "F, histórica", que é fé nas leis<br />

estatutárias, que são as que indicam o modo<br />

como Deus quer ser honrado e obe<strong>de</strong>cido.<br />

(Religion, III, I, § 6).<br />

Aquilo que os escolásticos chamavam <strong>de</strong><br />

caráter prático da F., para Kant (e para os mo<strong>de</strong>rnos)<br />

tornou-se o caráter compromissivo da F.,<br />

ou seja, o caráter graças ao qual a F. é antes <strong>de</strong><br />

mais nada um ato existencial, uma orientação<br />

dada à vida do indivíduo, capaz <strong>de</strong> transformála<br />

e não isenta <strong>de</strong> riscos. Estes traços aparecem<br />

claros na última gran<strong>de</strong> teoria da fé que a <strong>filosofia</strong><br />

elaborou: a <strong>de</strong> Kierkegaard. Para ele, o<br />

cristianismo inverteu a relação entre F. e ciência.<br />

Na Antigüida<strong>de</strong> clássica, a F. é algo inferior<br />

à ciência porque se refere ao verossímil; no<br />

cristianismo, a F. é superior à ciência porque indica<br />

a certeza mais elevada, certeza que se refere<br />

ao paradoxo, portanto ao inverossímil: ela<br />

é "a consciência da eternida<strong>de</strong>, a certeza mais<br />

apaixonada que impele o homem a sacrificar<br />

tudo, mesmo a vida" (Diário, X 4 , A 635). O caráter<br />

compromissivo da F. consiste em seus<br />

laços com a existência: ter fé significa existir <strong>de</strong><br />

certo modo: "Para ter F., é preciso que haja<br />

uma situação que <strong>de</strong>ve ser produzida com um<br />

passo existencial do indivíduo" (Ibid., X 4 , A<br />

114). "Esse passo marca a ruptura com o mundo<br />

e com seu i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> inteligibilida<strong>de</strong>. O que é<br />

crer? É querer (o que se <strong>de</strong>ve e por que se<br />

<strong>de</strong>ve), em obediência reverente e absoluta, <strong>de</strong><br />

fen<strong>de</strong>r-se do vão pensamento <strong>de</strong> querer compreen<strong>de</strong>r<br />

e da vã imaginação <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r compreen<strong>de</strong>r"<br />

(Ibid., X 1 , A 368). Sob este ponto <strong>de</strong> vista,<br />

a F. não é feita <strong>de</strong> certezas, mas <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão e<br />

risco. A F., diz Kierkegaard em Temor e tremor,<br />

é a certeza angustiante, a angústia que se<br />

torna segura <strong>de</strong> si e <strong>de</strong> uma relação oculta com<br />

Deus. O homem po<strong>de</strong> rogar a Deus que lhe<br />

conceda a F., mas a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> rogar não<br />

é em si mesma um dom divino? Assim, há na fé<br />

uma inegável contradição, que a torna paradoxal.<br />

O homem é colocado num dilema: crer ou<br />

não crer. Por um lado, a ele cabe escolher, e<br />

por outro qualquer iniciativa é impossível, porque<br />

Deus é tudo, e <strong>de</strong>le <strong>de</strong>riva inclusive a fé.<br />

Esse conceito foi substancialmente retomado<br />

por Karl Barth, que interpretou a F. como inserção<br />

da Eternida<strong>de</strong> no tempo, da Transcendência<br />

na existência (Comentário à Epístola<br />

aos romanos, 1919). Rudolf Bultmann também<br />

atribui a fé à iniciativa divina, apesar <strong>de</strong> afirmar<br />

a exigência <strong>de</strong> libertar a F., sobretudo cristã,<br />

dos mitos cosmológicos com que ela tradicio-<br />

nalmente aparece unida, proce<strong>de</strong>ndo à sua<br />

<strong>de</strong>smitificação (v.). Indo mais longe, Dietrich<br />

Bonhoeffer contrapôs a F. à religião (v.), consi<strong>de</strong>rada<br />

como expressão mítica e contingente da<br />

F., inaceitável nesta época dominada pelo racionalismo,<br />

pela ciência e pela tecnologia. Desse<br />

ponto <strong>de</strong> vista, acentua-se o caráter prático<br />

da F., que se transforma em moral natural e<br />

humana, fundada na unida<strong>de</strong> entre mundo e<br />

Deus, entre humanida<strong>de</strong> e Cristo (Ética, 1949;<br />

Resistência e rendição, 1951). É nesse conceito<br />

<strong>de</strong> F., entendida como ação renovadora do<br />

mundo humano, que se inspira o panteísmo<br />

humanista dos chamados "novos teólogos" (v.<br />

DEUS e DEUS, MORTE DE). Karl Jaspers insistiu<br />

na i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> entre existência e fé sob o<br />

aspecto filosófico, mas, na esteira <strong>de</strong> Kierkegaard,<br />

continuou reconhecendo na F. uma relação<br />

direta com a Transcendência (Der philosophische<br />

Glaube, 1948).<br />

FÉ, FILOSOFIA DA (ai. Glaubensphilosophiè).<br />

Com este nome ou com o <strong>de</strong> "<strong>filosofia</strong><br />

do conhecimento imediato" indica-se a <strong>filosofia</strong><br />

<strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> filósofos alemães da segunda<br />

meta<strong>de</strong> do séc. XVIII, que fizeram parte<br />

do Sturm undDrang(v.). As principais figuras<br />

<strong>de</strong>sta <strong>filosofia</strong> foram J. J. Hamann (1730-88),<br />

chamado "o mago do Norte", J. G. Her<strong>de</strong>r<br />

(1744-1803) e F. E. Jacobi (1743-1819), a quem<br />

se <strong>de</strong>ve a expressão "<strong>filosofia</strong> da F.". De Kant,<br />

essa <strong>filosofia</strong> aceitava a doutrina dos limites da<br />

razão somente para afirmar a superiorida<strong>de</strong> da<br />

fé sobre a razão. Consi<strong>de</strong>rava a F. como uma<br />

relação imediata — portanto não sujeita a<br />

incertezas ou dúvidas — com as realida<strong>de</strong>s superiores<br />

e especialmente com Deus. Jacobi<br />

expressou essas idéias em Cartas sobre a<br />

doutrina <strong>de</strong> Spinoza a Moisés Men<strong>de</strong>lssohn<br />

(1785), e no ensaio David Hume eaF. (1787).<br />

Na lógica da Enciclopédia, Hegel consi<strong>de</strong>rou a<br />

doutrina <strong>de</strong> Jacobi como "Terceira posição do<br />

pensamento sobre a objetivida<strong>de</strong>", e criticou<br />

o imediatismo, que consi<strong>de</strong>rou o caráter fundamental<br />

da F. <strong>de</strong> que falava Jacobi (Ene,<br />

§§ 61-74).<br />

FÉ ANIMAL (in. Animal faitb). Assim Santayana<br />

chamou a crença na realida<strong>de</strong> produzida<br />

no homem pelas experiências animais: fome,<br />

sexo, luta, etc. (Scepticism and Animal<br />

Faitb, 1923) (v. CRENÇA).<br />

FÉ E CIÊNCIA. V. ESCOLÁSTICA.<br />

FELAPTO. Palavra mnemônica usada pelos<br />

escolásticos para indicar o segundo dos seis<br />

modos do silogismo <strong>de</strong> terceira figura, mais

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