22.06.2013 Views

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

CULTURA 227 CULTURA<br />

fosse "harmoniosa cooperação entre Filosofia e<br />

História, entendidas no seu significado amplo<br />

e verda<strong>de</strong>iro". Mas essa solução era sugerida<br />

pelo espírito polêmico antípositivísta e<br />

pela orientação típica da <strong>filosofia</strong> crociana, na<br />

qual a C. científica e o próprio espírito científico<br />

não encontram lugar. Na realida<strong>de</strong>, o problema<br />

da C. agravou-se ainda mais nos cinqüenta<br />

anos transcorridos após o diagnóstico<br />

<strong>de</strong> Croce. Não só o processo <strong>de</strong> multiplicação e<br />

especificação das correntes <strong>de</strong> pesquisa e,<br />

portanto, das disciplinas (naturalistas e nàonaturalistas)<br />

ampliou-se até assumir proporções<br />

gigantescas, como também a crescente<br />

industrialização do mundo contemporâneo torna<br />

indispensável a formação <strong>de</strong> competências<br />

específicas, possíveis apenas por meio <strong>de</strong> treinamento<br />

especializado, que confina o indivíduo<br />

num campo extremamente restrito <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong><br />

e estudo. O que a socieda<strong>de</strong> mais exige<br />

<strong>de</strong> cada um dos seus membros é o <strong>de</strong>sempenho<br />

na tarefa ou na função que lhe foi confiada;<br />

e o <strong>de</strong>sempenho não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> tanto da<br />

posse <strong>de</strong> uma C. geral <strong>de</strong>sinteressada quanto<br />

<strong>de</strong> conhecimentos específicos e aprofundados<br />

em algum ramo particularíssimo <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada<br />

disciplina. Ora, essa situação, <strong>de</strong>terminada<br />

por condições histórico-sociais cuja mudança<br />

ou cujo fim não é possível prever, não po<strong>de</strong><br />

ser ignorada ou minimizada por aqueles<br />

que se ocupam do problema da cultura. Portanto,<br />

é perfeitamente inútil erigir-se, com espírito<br />

profético, contra ela, contrapondo-lhe o<br />

i<strong>de</strong>al clássico <strong>de</strong> C. em sua pureza e perfeição,<br />

como formação <strong>de</strong>sinteressada do homem aristocrático<br />

para a vida contemplativa. Por outro<br />

lado, também seria inútil ignorar ou minimizar<br />

os <strong>de</strong>feitos gravíssimos <strong>de</strong> uma C. reduzida a<br />

puro treinamento técnico em <strong>de</strong>terminado<br />

campo e restringida ao uso profissional <strong>de</strong> conhecimentos<br />

utilitários. É óbvio que dificilmente<br />

uma coisa <strong>de</strong>ssas po<strong>de</strong>ria ser chamada <strong>de</strong><br />

"C", porque esta palavra <strong>de</strong>signa, como se viu,<br />

um i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> formação humana completa, a realização<br />

do homem em sua forma autêntica ou<br />

em sua natureza humana. Competências específicas,<br />

habilida<strong>de</strong>s particulares, <strong>de</strong>streza e precisão<br />

no uso dos instrumentos, materiais ou<br />

conceituais, são coisas úteis, aliás indispensáveis,<br />

à vida do homem em socieda<strong>de</strong> e da socieda<strong>de</strong><br />

no seu conjunto, mas não po<strong>de</strong>m, nem<br />

<strong>de</strong> longe, substituir a C. entendida como formação<br />

equilibrada e harmônica do homem<br />

como tal. E, <strong>de</strong> fato, a experiência revela todos<br />

os dias os inconvenientes gravíssimos da educação<br />

incompleta e especializada, sobretudo<br />

nos países on<strong>de</strong>, por fortes exigências sociais,<br />

ela foi levada mais a fundo. O primeiro inconveniente<br />

é o permanente <strong>de</strong>sequilíbrio da personalida<strong>de</strong>,<br />

que pen<strong>de</strong> para uma única direção<br />

e fica centrada em torno <strong>de</strong> poucos interesses,<br />

tornando-se incapaz <strong>de</strong> enfrentar situações ou<br />

problemas que se situem um pouco além <strong>de</strong>sses<br />

interesses. Esse <strong>de</strong>sequilíbrio, já gravíssimo<br />

do ponto <strong>de</strong> vista individual (po<strong>de</strong> produzir,<br />

como <strong>de</strong> fato muitas vezes produz, em certos<br />

limites, diversas formas <strong>de</strong> neuroses), também<br />

é grave do ponto <strong>de</strong> vista social, pois impe<strong>de</strong><br />

ou limita muito a comunicação entre os homens,<br />

fecha cada um em seu próprio mundo<br />

restrito, sem interesse nem tolerância por aqueles<br />

que estão fora <strong>de</strong>le. O segundo inconveniente<br />

é que ele não dá armas para enfrentar<br />

as exigências que nascem da própria especialização<br />

das disciplinas. De fato, quanto mais a<br />

fundo é levada essa especialização, tanto mais<br />

numerosos se tornam os problemas que surgem<br />

nos pontos <strong>de</strong> contato ou <strong>de</strong> intersecção<br />

entre disciplinas diferentes; e esses problemas<br />

não po<strong>de</strong>m ser enfrentados no domínio <strong>de</strong> uma<br />

só <strong>de</strong>las e apenas com os instrumentos que ela<br />

oferece. Em outros termos, a própria especialização,<br />

que é por certo uma exigência imprescindível<br />

do mundo mo<strong>de</strong>rno, requer, em certa<br />

altura <strong>de</strong> seu <strong>de</strong>senvolvimento, encontros e colaboração<br />

entre disciplinas especializadas diversas:<br />

encontros e colaboração que vão muito<br />

além das competências específicas e exigem<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> comparação e <strong>de</strong> síntese, que a<br />

especialização não oferece.<br />

Certamente, esses inconvenientes e problemas<br />

não têm a mesma gravida<strong>de</strong> em todos os<br />

países. Em geral, po<strong>de</strong>-se dizer que on<strong>de</strong> o <strong>de</strong>senvolvimento<br />

industrial e econômico foi mais<br />

rápido esses problemas são mais agudos. Mas<br />

mesmo on<strong>de</strong> isso não ocorreu, esses problemas<br />

acabam surgindo mais cedo ou mais tar<strong>de</strong> (previsivelmente,<br />

mais cedo do que tar<strong>de</strong>) com a<br />

mesma gravida<strong>de</strong>, no momento em que, <strong>de</strong>vido<br />

às crescentes exigências do <strong>de</strong>senvolvimento<br />

científico e industrial, a especialização alcançar<br />

um estágio adiantado. De qualquer forma,<br />

o problema fundamental da C. contemporânea<br />

é sempre o mesmo: conciliar as exigências da<br />

especialização (inseparáveis do <strong>de</strong>senvolvimento<br />

maduro das ativida<strong>de</strong>s culturais) com a<br />

exigência <strong>de</strong> formação humana, total ou, pelo<br />

menos, suficientemente equilibrada. É para

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!