22.06.2013 Views

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

CRENÇA 219 CRENÇA<br />

ele, "ir além da asserção <strong>de</strong> que a C. é uma<br />

experiência do espírito que faz a distinção entre<br />

idéias do juízo e ficções da imaginação".<br />

Mas um dos resultados <strong>de</strong>ssa análise foi pôr em<br />

evidência o caráter específico <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são que o<br />

reconhecimento <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong> qualquer<br />

possui. Kant não fez mais do que aceitar e convalidar<br />

a generalização <strong>de</strong> Hume com os esclarecimentos<br />

metodológicos que aduziu na seção<br />

do Cânon da Razão Pura (Crít. R. Pura, mas<br />

cf. também a Crít. do Juízo, § 90) que <strong>de</strong>dicou<br />

à opinião, à ciência e à fé. Enten<strong>de</strong>u por C.<br />

''a valida<strong>de</strong> subjetiva do juízo", ou seja, a valida<strong>de</strong><br />

que o juízo possui "na alma <strong>de</strong> quem<br />

julga". E reconheceu três graus <strong>de</strong> C: opinião,<br />

que é uma C. insuficiente tanto subjetiva quanto<br />

objetivamente; fé, que é uma C. insuficiente<br />

objetivamente, mas consi<strong>de</strong>rada subjetivamente<br />

suficiente; e ciência, que é uma C. suficiente<br />

tanto subjetiva quanto objetivamente. Mas<br />

esses reparos e distinções, apesar do sucesso<br />

que tiveram, são um tanto confusos. Com efeito,<br />

Kant consi<strong>de</strong>ra a opinião como uma espécie<br />

<strong>de</strong> C, reconhecendo que carece <strong>de</strong> caráter <strong>de</strong><br />

a<strong>de</strong>são. Além disso, julga que só a fé tem ou<br />

po<strong>de</strong> ter influência sobre a ação, ao passo que,<br />

como vira Hume, essa é a característica própria<br />

da crença. O caráter específico da C. foi<br />

ressaltado pelos empiristas ingleses do séc. XIX,<br />

por Brentano e pelos pragmatistas. Stuart Mill<br />

i<strong>de</strong>ntificou "juízo" e "C". "É necessário fazer a<br />

distinção", disse ele, "entre a simples sugestão<br />

ao espírito <strong>de</strong> certa or<strong>de</strong>m entre as sensações<br />

ou idéias — como, p. ex., a do alfabeto e a da<br />

tábua pitagórica — e a indicação <strong>de</strong> que essa<br />

or<strong>de</strong>m é um fato real que está acontecendo,<br />

que aconteceu uma ou mais vezes ou que<br />

acontece sempre em certas circunstâncias: que<br />

são as coisas indicadas como verda<strong>de</strong>iras por<br />

uma predicação afirmativa ou como falsas pela<br />

negativa" (Analysis of the Phenomena of the<br />

HumanMind [<strong>de</strong> JAMES MILL], cap. IV, § 4, nota<br />

48; também System ofLog., I, 5, 2). De resto, a<br />

tese <strong>de</strong> que o juízo importa C. já fora <strong>de</strong>fendida<br />

por Hobbes (De corp., 3, § 8), para quem, no<br />

entanto, a C. consistia somente em consi<strong>de</strong>rar<br />

que sujeito e predicado são dois nomes <strong>de</strong> uma<br />

só coisa. Stuart Mill, criticando Hobbes nesse<br />

aspecto, preten<strong>de</strong> mostrar que a a<strong>de</strong>são implícita<br />

no juízo não é só verbal ou lingüística, mas<br />

diz respeito ao objeto do próprio juízo, isto é, à<br />

realida<strong>de</strong> (Logic, I, 5, 4). Tese análoga foi sustentada<br />

por Franz Brentano do ponto <strong>de</strong> vista<br />

da intencionalida<strong>de</strong> da consciência. Brentano<br />

afirmou que todo objeto julgado existe na<br />

consciência em forma dupla: como objeto<br />

representado e como objeto reconhecido ou<br />

negado, ou seja, "crido". "Afirmamos", disse<br />

Brentano, "que, quando o objeto <strong>de</strong> uma representação<br />

se torna objeto <strong>de</strong> um juízo afirmativo<br />

ou negativo, a consciência refere-se a ele<br />

numa espécie <strong>de</strong> relação completamente nova.<br />

O objeto está, então, duplamente presente para<br />

a consciência, como representado e como aceito<br />

ou negado, assim como, quando o <strong>de</strong>sejo<br />

recai sobre um objeto, esse objeto está presente<br />

na consciência, ao mesmo tempo como representado<br />

e como <strong>de</strong>sejado" (Von <strong>de</strong>rKlassification<br />

<strong>de</strong>r psychischen Phãnomene, 1911, II,<br />

1). Brentano, portanto, fazia a distinção entre<br />

juízo e representação como faculda<strong>de</strong>s psíquicas<br />

diferentes e consi<strong>de</strong>rava que o juízo era<br />

marcado pelo caráter <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são da crença.<br />

Husserl chama esse mesmo caráter <strong>de</strong> "tético";<br />

para ele, a C. é um ato que "põe" o ser: ao<br />

caráter "tético" da C. correspon<strong>de</strong> o caráter "real"<br />

<strong>de</strong> seu objeto (I<strong>de</strong>en, I, § 103). As mesmas características<br />

são atribuídas à C. nas análises <strong>de</strong><br />

Charles S. Peirce, que, a<strong>de</strong>mais, ressaltou na C.<br />

o caráter <strong>de</strong> compromisso com a ação. Os<br />

caracteres da C, segundo Peirce, são os seguintes:<br />

I a é algo <strong>de</strong> que tomamos consciência; 2 a<br />

aquieta a irritação da dúvida; 3 a implica estabelecimento<br />

<strong>de</strong> uma regra <strong>de</strong> ação, <strong>de</strong> um hábito.<br />

Desse conceito <strong>de</strong> C, Peirce extraía a regra que<br />

foi <strong>de</strong>pois assumida como princípio fundamental<br />

do pragmatismo: "Para <strong>de</strong>senvolver o significado<br />

<strong>de</strong> uma coisa não <strong>de</strong>vemos fazer mais<br />

do que <strong>de</strong>terminar os hábitos que ela produz,<br />

pois aquilo que uma coisa significa é simplesmente<br />

o hábito que ela implica. A i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> um hábito <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> como ele nos levará<br />

a agir, não só nas circunstâncias que provavelmente<br />

surgirão, mas nas circunstâncias que,<br />

embora improváveis, possam surgir" (Chance,<br />

Love and Logic, II, 2; Coll. Pap., 5. 397).<br />

Santayana elucidou a conexão da C. com a<br />

parte ativa e prática do homem, ou seja, com<br />

a fome, o amor, a luta ou, <strong>de</strong> modo geral, a<br />

espera do futuro. Aquilo em que se crê não é<br />

essência pura (que, como tal, é só objeto <strong>de</strong><br />

intuição), mas uma coisa existente, e as coisas<br />

existentes se dão somente na "experiência animal",<br />

isto é, na relação <strong>de</strong> ação e reação do<br />

organismo com o mundo. Logo, segundo Santayana,<br />

a C. na existência é uma "fé animal"<br />

(Scepticism and Animal Faith, 1923, cap. 15-<br />

16). Enfim, outro caráter da crença foi evi<strong>de</strong>n-

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!