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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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LIBERDADE 608 LIBERDADE<br />

segundo o qual aquilo que é livre "<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

si mesmo assim como um efeito <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da causa<br />

que o <strong>de</strong>termina necessariamente". Contra<br />

esta última concepção, Bergson objeta que os<br />

atos livres são imprevisíveis e que, portanto,<br />

não se lhes po<strong>de</strong> aplicar a causalida<strong>de</strong>, segundo<br />

a qual causas iguais têm efeitos iguais. Por<br />

isso, a L. continua in<strong>de</strong>finível; e <strong>de</strong>ve ser i<strong>de</strong>ntificada<br />

com o processo da vida consciente, ou<br />

seja, com a duração real (Essais sur les données<br />

immédiates <strong>de</strong> Ia consciente, 1899, pp. 131<br />

ss.). Mas na realida<strong>de</strong> o conceito <strong>de</strong> livre-arbítrio<br />

partia precisamente da imprevisibilida<strong>de</strong><br />

dos fatos humanos (os chamados "futuros contingentes")<br />

e da autocausalidacle da vonta<strong>de</strong>. A<br />

doutrina bergsoniana nega a indiferença da<br />

vonta<strong>de</strong> aos motivos, somente para sustentar<br />

que a vonta<strong>de</strong> cria ou constitui os motivos e<br />

confere-lhes a força <strong>de</strong>terminante <strong>de</strong> que dispõem.<br />

Mas <strong>de</strong>ssa forma a auto<strong>de</strong>terminação<br />

continua sendo <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong>; como<br />

tal permanece também no conceito (proposto<br />

por F. LOMBARDI, La liberta <strong>de</strong>i volere e<br />

Vindividuo, 1941, p. 192) <strong>de</strong> ato ou movimento<br />

que "se reproduz ou se produz continuamente",<br />

levando consigo, nessa autoproduçâo.<br />

"todo o mundo em que atua". Não tem sentido<br />

diferente a doutrina <strong>de</strong> Sartre, para quem a L. é<br />

a escolha que o homem faz <strong>de</strong> seu próprio ser<br />

e do mundo. "Mas exatamente por se tratar <strong>de</strong><br />

uma escolha, na medida em que é feita, essa<br />

escolha geralmente indica outras tantas como<br />

possíveis. A possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssas outras escolhas<br />

não é explicitada nem proposta, mas é vivida<br />

no sentimento <strong>de</strong> injusüficabilida<strong>de</strong> e expressa<br />

na absurdida<strong>de</strong> da minha escolha, conseqüentemente<br />

do meu ser. Assim, minha L.<br />

<strong>de</strong>vora a minha L. Sendo livre, projeto o meu<br />

possível total, mas com isto prorjonho que sou<br />

livre e que posso aniquilar esse meu primeiro<br />

projeto e relegá-lo ao passado 1 ' (Letre et le<br />

néant, p. 560). Mas uma escolha que não tem<br />

nada a escolher, que não é limitada por <strong>de</strong>terminadas<br />

condições, <strong>de</strong> escolha só tem o nome;<br />

na realida<strong>de</strong>, é uma autocriação gratuita. A<br />

doutrina <strong>de</strong> Sartre só faz levar ao extremo o<br />

antigo conceito <strong>de</strong> L. como autocausalida<strong>de</strong>.<br />

Recorrem a este conceito tanto o in<strong>de</strong>terminismo<br />

quanto o <strong>de</strong>terminismo. O que o <strong>de</strong>terminismo<br />

nega é o mesmo que o in<strong>de</strong>terminismo<br />

afirrna: a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma causa sui.<br />

Vimos que o próprio Kant consi<strong>de</strong>rava-a impossível<br />

no domínio dos fenômenos e a confiava ao<br />

domínio do númeno: foi o que fez também<br />

Schopenhauer, que consi<strong>de</strong>rou válidas as razões<br />

apresentadas por Priestley em sua Doutrina da<br />

necessida<strong>de</strong> filosófica (v. DETERMINISMO) e afirmou<br />

que a L. como autocausalida<strong>de</strong> é apenas<br />

da vonta<strong>de</strong> como força numênica ou metafísica,<br />

da vonta<strong>de</strong> como princípio cósmico (Die Welt,<br />

I, § 55). Em geral o <strong>de</strong>terminismo consiste em<br />

julgar universal o alcance do princípio <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong><br />

em sua força empírica e portanto em<br />

negar a causalida<strong>de</strong> autônoma. Neste sentido,<br />

Clau<strong>de</strong> Bernard afirmava a inércia dos corpos<br />

vivos tanto quanto dos inorgânicos, que é a incapacida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> entrar em movimento por si<br />

mesmos: e nessa inércia percebia a condição<br />

para o reconhecimento do <strong>de</strong>terminismo absoluto<br />

(Intr. à Vétu<strong>de</strong> <strong>de</strong> Ia medicine exjKrimentale,<br />

1865, II, 8).<br />

O equivalente político da concepção <strong>de</strong> L.<br />

como autocausalida<strong>de</strong> é a noção <strong>de</strong> L. como<br />

ausência <strong>de</strong> condições ou <strong>de</strong> regras e recusa <strong>de</strong><br />

obrigações; numa palavra, anarquia. Na maioria<br />

das vezes, esse conceito é utilizado como<br />

instrumento <strong>de</strong> polêmica, para negar a própria<br />

L. Platão foi o primeiro a fazer isso quando preten<strong>de</strong>u<br />

<strong>de</strong>monstrar que da <strong>de</strong>masiada L. concedida<br />

pelo regime <strong>de</strong>mocrático nascem a tirania<br />

e a escravidão. De fato, a recusa constante <strong>de</strong><br />

limites e restrições "torna os cidadãos tão suscetíveis<br />

que, tão logo se lhes proponha algo<br />

que pareça ameaçar sua liberda<strong>de</strong>, eles se melindram,<br />

rebelam-se e terminam rindo das leis<br />

escritas e não escritas, porque não querem <strong>de</strong><br />

forma alguma submeter-se a nenhum comando"<br />

(Rep., VIII, 563 d). A L. aqui é entendida<br />

(não por Platão, como veremos mais adiante)<br />

como ausência <strong>de</strong> medida, recusa <strong>de</strong> normas.<br />

O ilimitado po<strong>de</strong>r sobre todas as coisas, que,<br />

para Hobbes, constitui a L. em estado natural<br />

(De eive, I, § 7), tem o mesmo significado.<br />

Filmer acreditava estar expressando o significado<br />

da doutrina <strong>de</strong> Hobbes quando dizia: "A L.<br />

consiste em cada um fazer o que lhe aprouver,<br />

em viver como quiser, sem estar vinculado a lei<br />

nenhuma" (Observations upon Mr. Hobbess<br />

Leviathan, 1652, p. 55). Mas talvez a melhor e<br />

mais coerente expressão <strong>de</strong>ssa noção <strong>de</strong> L. seja<br />

o Único <strong>de</strong> Max Stiner: o indivíduo que não<br />

tem causa fora <strong>de</strong> si, que é sua própria causa e<br />

causa <strong>de</strong> tudo. Nessa forma extrema a tese da<br />

L. anárquica raramente é <strong>de</strong>fendida: na maioria<br />

das vezes é pressuposta como termo <strong>de</strong> polêmica,<br />

reduzindo-se a ela (em boa ou má-fé) as<br />

<strong>de</strong>mais concepções <strong>de</strong> L. política.

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