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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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DEUS 255 DEUS<br />

um é imputável por sua escolha: a divinda<strong>de</strong><br />

não é imputável" (Rep., X, 617 e). E na realida<strong>de</strong><br />

o Demiurgo predispõe todas as coisas "para<br />

não ser causa da malda<strong>de</strong> futura dos seres individuais"<br />

(Tim., 42 d). Para Platão, a virtu<strong>de</strong>, assim<br />

como o vício (logo, a totalida<strong>de</strong> da or<strong>de</strong>m<br />

moral), faz parte da esfera <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> dos<br />

seres criados. Todavia, ser virtuoso significa<br />

também "ser amigo da divinda<strong>de</strong>'', e isso significa<br />

"ser semelhante" à divinda<strong>de</strong>. "A divinda<strong>de</strong><br />

é para nós a medida <strong>de</strong> todas as coisas, muito<br />

mais do que po<strong>de</strong> sê-lo um homem, como dizem<br />

hoje" (Leis, IV, 716 c). Analogamente, segundo<br />

Aristóteles, a divinda<strong>de</strong> exerce sua função<br />

apenas no mundo natural e só por essa<br />

função é possível <strong>de</strong>terminar seus atributos<br />

fundamentais (Motor imóvel, Causa primeira,<br />

Pensamento do pensamento, etc). Contudo,<br />

até Aristóteles admite, conforme as crenças populares,<br />

que, "se os <strong>de</strong>uses se preocupam <strong>de</strong><br />

algum modo com as obras humanas, como parece,<br />

é verossímil que lhes agra<strong>de</strong> ver nos<br />

homens algo <strong>de</strong> excelente e que com estes<br />

tenham a maior afinida<strong>de</strong>, o que só po<strong>de</strong> ser<br />

inteligência" {Et. nic, X, 9, 1179 a 24). A característica<br />

negativa <strong>de</strong>ssa concepção é a ausência<br />

da noção <strong>de</strong> providência, ou seja, <strong>de</strong> uma<br />

or<strong>de</strong>m racional criada por D. ou que seja D.,<br />

em que os homens e seus comportamentos<br />

encontrem lugar. Sua característica positiva é<br />

ser D. garante da or<strong>de</strong>m moral, conquanto não<br />

estabeleça seus caminhos e seus modos <strong>de</strong> realização.<br />

No mundo mo<strong>de</strong>rno essas características<br />

são encontradas nos <strong>de</strong>fensores da religião<br />

natural (v.), a religião sem revelação por parte<br />

<strong>de</strong> D., confiada unicamente às forças da razão.<br />

Grócio, p. ex., afirma que os enunciados da religião<br />

natural são quatro: "Primeiro: D. existe e<br />

é uno; segundo: D. não é coisa nenhuma que<br />

se veja, mas é muito superior a elas; terceiro: as<br />

coisas humanas são cuidadas por D. e julgadas<br />

com perfeita eqüida<strong>de</strong>; quarto: D. é o artífice<br />

<strong>de</strong> todas as coisas exteriores" (De iure belli, II,<br />

20, 45). Crenças semelhantes, que excluem das<br />

coisas humanas o plano provi<strong>de</strong>ncial, embora<br />

reconhecendo a ajuda e a garantia divina, são<br />

freqüentes nos filósofos dos sécs. XVII e XVIII.<br />

Talvez sua melhor expressão esteja em Rousseau<br />

e em Kant. Segundo Rousseau, D. intervém<br />

para pôr em ação "as leis da or<strong>de</strong>m universal",<br />

agindo <strong>de</strong> tal modo que, nesta vida,<br />

quem se comportar corretamente e for infeliz<br />

será recompensado na outra. Aliás, para Rousseau,<br />

a exigência <strong>de</strong> ver assim garantida a<br />

or<strong>de</strong>m moral é o único motivo razoável para<br />

crer na imortalida<strong>de</strong> da alma (Emílio, IV). Do<br />

mesmo modo, para Kant, a existência <strong>de</strong> D. é<br />

um postulado da razão prática pois só Deus<br />

torna possível a união <strong>de</strong> virtu<strong>de</strong> e felicida<strong>de</strong><br />

em que consiste o sumo bem, que é o objeto<br />

da lei moral (Crít. R. Pratica, I, cap. 2, § 5).<br />

"Desse modo", diz Kant, "mediante o conceito<br />

do sumo bem, a lei moral conduz à religião, ao<br />

conhecimento <strong>de</strong> todos os <strong>de</strong>veres na forma <strong>de</strong><br />

mandamentos divinos; não como sanções, ou<br />

seja, como <strong>de</strong>cretos arbitrários e por si mesmo<br />

aci<strong>de</strong>ntais <strong>de</strong> uma vonta<strong>de</strong> alheia, mas como<br />

leis essenciais <strong>de</strong> toda vonta<strong>de</strong> livre por si mesma,<br />

que, porém, <strong>de</strong>vem ser consi<strong>de</strong>radas mandamentos<br />

do Ser supremo, porque só <strong>de</strong> uma<br />

vonta<strong>de</strong> moralmente perfeita (santa e boa) e ao<br />

mesmo tempo onipotente po<strong>de</strong>mos esperar o<br />

sumo bem, que a lei moral nos obriga a ter<br />

como objeto <strong>de</strong> nossos esforços; portanto, po<strong>de</strong>mos<br />

esperar alcançá-lo mediante o acordo<br />

com essa vonta<strong>de</strong> perfeita". Conseqüentemente,<br />

para Kant D. é "1 B criador onipotente do céu<br />

e da terra, e, do ponto <strong>de</strong> vista moral, legislador<br />

santo; 2 S conservador do gênero humano<br />

como seu benévolo governante e curador moral;<br />

3 S guarda <strong>de</strong> suas próprias leis, ou seja, justo<br />

juiz" (Religion, III, II, Obs. ger.). Essa solução<br />

<strong>de</strong> Kant ficou sendo típica da concepção em<br />

exame, que limita o po<strong>de</strong>r moral <strong>de</strong> D. a uma<br />

garantia que não <strong>de</strong>termina <strong>de</strong> modo algum a<br />

ação dos homens, mas, ao contrário, <strong>de</strong> certo<br />

modo é solicitada pela própria autonomia <strong>de</strong>ssa<br />

ação.<br />

b) Deus como or<strong>de</strong>m moral do mundo. Essa<br />

concepção, como a outra <strong>de</strong> D. criador da or<strong>de</strong>m<br />

moral, apóia-se no conceito <strong>de</strong> providência,<br />

<strong>de</strong> or<strong>de</strong>m racional cjue compreen<strong>de</strong> não só<br />

os eventos do mundo mas também as ações<br />

humanas, or<strong>de</strong>m que é D. mesmo ou que vem<br />

<strong>de</strong> D. Os primeiros a formular o conceito <strong>de</strong><br />

providência foram os estóicos, que <strong>de</strong>ram esse<br />

nome ou o nome <strong>de</strong> <strong>de</strong>stino (v.) ao governo racional<br />

do mundo, ou seja, "a razão pela qual as<br />

coisas passadas aconteceram, as presentes<br />

acontecem e as futuras acontecerão" (STOBF.O,<br />

Ecl, I, 79). Os estóicos i<strong>de</strong>ntificaram essa razão,<br />

<strong>de</strong>stino ou natureza com D., "presente nas<br />

coisas e nos fatos todos, e que assim utiliza<br />

todas as coisas segundo sua natureza, para a<br />

economia do todo" (ALEXANDRE, De fato, 22,<br />

pp. 191, 30).<br />

Do ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong>ssa i<strong>de</strong>ntificação não<br />

<strong>de</strong>veria nascer o problema da liberda<strong>de</strong> huma-

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