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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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COMPAIXÃO 155 COMPATIBILIDADE<br />

outra pessoa po<strong>de</strong> chamar-se C. só se for um<br />

sentimento <strong>de</strong> solidarieda<strong>de</strong> mais ou menos<br />

ativa, mas que nada tem a ver com a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> estados emocionais entre quem sente C. e<br />

quem é comiserado. Aristóteles <strong>de</strong>finiu a C.<br />

como "a dor causada pela visão <strong>de</strong> algum mal<br />

<strong>de</strong>strutivo ou penoso que atinge alguém que<br />

não mereça e que po<strong>de</strong> vir a atingir-nos ou a<br />

alguém que nos seja caro" (Ret, II, 8, 1385 b).<br />

Essa <strong>de</strong>finição é repetida quase literalmente<br />

por Hobbes (Leviath., I, 6), Descartes (Pass.<br />

<strong>de</strong> l'âme, III, § 185) e por Spinoza (Et., III, 22<br />

scol.). Segundo Adam Smith, a C. é um caso<br />

típico da simpatia que constitui a estrutura <strong>de</strong><br />

todos os sentimentos morais ( Theory of Moral<br />

Sentíments, III, 1). Para Schopenhauer, a C. é a<br />

própria essência do amor e da solidarieda<strong>de</strong><br />

entre os homens, porque amor e solidarieda<strong>de</strong><br />

explicam-se somente a partir do caráter<br />

essencialmente doloroso da vida (Die Welt, I,<br />

55 66-67).<br />

Em oposição a essa tradição, há uma outra<br />

que vê na C. um elemento negativo da vida<br />

moral. Essa segunda tradição inicia-se com os<br />

estóicos (STOBEO, Ecl, II, 6, 180) e passa por<br />

Spinoza. Este consi<strong>de</strong>ra que "no homem que<br />

vive segundo a razão a C. é, por si mesma,<br />

ruim e inútil", porque nada mais é que dor; por<br />

isso "o homem que vive segundo a razão esforça-se<br />

o máximo possível para não ser tocado<br />

pela C", bem como tampouco pelo ódio, pelo<br />

riso ou pelo <strong>de</strong>sprezo, porque sabe que tudo<br />

<strong>de</strong>riva da necessida<strong>de</strong> da natureza divina (Et.,<br />

IV, 50, corol. scol.). Essa apreciação encontra<br />

expressão extrema nas invectivas <strong>de</strong> Nietzsche<br />

contra a C: "Esse instinto <strong>de</strong>pressivo e contagioso<br />

<strong>de</strong>bilita os outros instintos que querem<br />

conservar e aumentar o valor da vida; é uma<br />

espécie <strong>de</strong> multiplicador e <strong>de</strong> conservador <strong>de</strong><br />

todas as misérias, por isso um dos instrumentos<br />

principais da <strong>de</strong>cadência do homem" (Anticristo,<br />

Ap. 7). O traço comum <strong>de</strong>ssas con<strong>de</strong>nações<br />

da C. é consi<strong>de</strong>rá-la como miséria ou dor<br />

em si mesma; aliás, segundo a expressão <strong>de</strong><br />

Nietzsche, como algo que conserva ou multiplica<br />

a miséria e a dor. Scheler apontou o equívoco<br />

<strong>de</strong>sse pressuposto que, na verda<strong>de</strong>, confun<strong>de</strong><br />

a C. (que é simpatia e participação emotiva)<br />

como contágio emotivo. Pelo contrário, observa<br />

Scheler, "a C. está ausente sempre que houver<br />

contágio do sofrimento, pois então o sofrimento<br />

não será mais <strong>de</strong> outro, mas meu, e eu<br />

acredito po<strong>de</strong>r subtrair-me a ele evitando o<br />

quadro ou o aspecto do sofrimento em geral"<br />

(Sympathie, cap. II, § 3). Foi justamente essa<br />

advertência fundamental que tivemos em<br />

mente ao caracterizarmos a C. no princípio <strong>de</strong>sse<br />

verbete.<br />

COMPARATIVO (in. Comparative, fr. Compare,<br />

ai. Vergleichend; it. Comparativo). Os lógicos<br />

tradicionais chamam <strong>de</strong> questão comparativa<br />

aquela em que se pergunta se algo é<br />

menor ou maior, melhor ou pior, etc, do que<br />

outra coisa; p. ex.: "Se a justiça é preferível à<br />

força" (JUNGIUS, Lógica, V, 2, 42). A Lógica <strong>de</strong><br />

Port-Royal <strong>de</strong>nominou C. as proposições que<br />

instituem um confronto <strong>de</strong>sse tipo (ARNAULD,<br />

Log., II, 10, 3); essa expressão persiste na<br />

lógica tradicional (cf. B. ERDMANN, Logik, I, § 40,<br />

229).<br />

COMPATIBILIDADE (in. Consistency, fr.<br />

Compatibilité; ai. Wi<strong>de</strong>rsprucbslosigkeít; it.<br />

Compatibilitã). Ausência <strong>de</strong> contradição como<br />

condição <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> dos sistemas <strong>de</strong>dutivos.<br />

"Toda verda<strong>de</strong>", dizia Aristóteles, "<strong>de</strong>ve estar<br />

<strong>de</strong> acordo consigo mesma sob todos os aspectos"<br />

(An. pr, I, 32, 47 a 8). Todavia, foi só na<br />

matemática mo<strong>de</strong>rna, a partir <strong>de</strong> Hilbert, que a<br />

C. interna <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong>dutivo passou a ser<br />

o único critério <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> do próprio sistema.<br />

Segundo esse ponto <strong>de</strong> vista, diz-se que há C.<br />

no sistema em que não há nenhum teorema<br />

cuja negação seja um teorema; ou no qual nem<br />

todos os enunciados são teoremas. Essa segunda<br />

fórmula é ainda mais geral (cf. A. CHURCH, Introductíon<br />

to Mathematícal Logic, 1959, § 17).<br />

Desse ponto <strong>de</strong> vista, a <strong>de</strong>monstração da C.<br />

torna-se a própria <strong>de</strong>monstração da valida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

um sistema bem como da existência (v.) das<br />

entida<strong>de</strong>s a que ele faz a referência. Segundo<br />

Hilbert, a <strong>de</strong>monstração da C. não <strong>de</strong>veria fazer<br />

referência a um número infinito <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong>s<br />

estruturais das fórmulas ou a um número<br />

infinito <strong>de</strong> operações conformes. Nesse sentido,<br />

a <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong>veria ser finitista, porque<br />

só assim seria absoluta. Mas justamente a<br />

não-possibilida<strong>de</strong> da <strong>de</strong>monstração absoluta da<br />

C. dos sistemas <strong>de</strong>dutivos foi provada pelo<br />

teorema <strong>de</strong> Gõ<strong>de</strong>l (1931). O teorema <strong>de</strong> Gõ<strong>de</strong>l<br />

não exclui que se possa provar a C. <strong>de</strong> um sistema<br />

<strong>de</strong>dutivo tomado como mo<strong>de</strong>lo, mas, por<br />

sua vez, a valida<strong>de</strong> do mo<strong>de</strong>lo não po<strong>de</strong>rá ser<br />

<strong>de</strong>monstrada. A C. "absoluta" foi, portanto, expulsa<br />

do domínio da matemática pelo teorema<br />

<strong>de</strong> Gõ<strong>de</strong>l, que estabelece, por isso mesmo, os<br />

limites do chamado formalismo. Realmente,<br />

nenhum sistema formalista po<strong>de</strong> oferecer a garantia<br />

da sua própria absoluta compatibilida<strong>de</strong>.

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