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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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ERRO 342 ERRO<br />

"se enuncia uma coisa qualquer segundo uma<br />

coisa qualquer". Com efeito, para o intelecto<br />

a essência substancial ou necessária é o que o<br />

branco é para o olho: assim como ninguém se<br />

engana ao perceber o branco, mas alguém se<br />

po<strong>de</strong> enganar ao achar que o branco percebido<br />

é um homem, ninguém se po<strong>de</strong> enganar ao<br />

pensar o homem "segundo a sua essência necessária",<br />

ou seja, como "animal racional", mas<br />

alguém se po<strong>de</strong> enganar afirmando que "este<br />

é um homem" ou que "este homem é músico",<br />

ou seja, realizando sínteses ou divisões que<br />

não são guiadas pela essência necessária do<br />

objeto (Ibid, 430 b 26 ss.)- Com isso, Aristóteles<br />

restringe a possibilida<strong>de</strong> do E. à esfera das<br />

intelecções que não se referem à estrutura<br />

substancial do ser, já que essa estrutura é apreendida<br />

nos seus princípios com um ato análogo à<br />

percepção das qualida<strong>de</strong>s corpóreas, ato que,<br />

como "intelecção do indivisível", subtrai-se à<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> erro. Em outros termos, a estrutura<br />

necessária do ser exclui a possibilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> E. no que diz respeito ao pensamento do<br />

ser. O E. fica então circunscrito à esfera das<br />

afirmações aci<strong>de</strong>ntais, ou seja, que não têm lugar<br />

na ciência. Mas, na realida<strong>de</strong>, mesmo na<br />

esfera das afirmações aci<strong>de</strong>ntais é difícil enten<strong>de</strong>r,<br />

do ponto <strong>de</strong> vista aristotélico, a possibilida<strong>de</strong><br />

do E., visto que a necessida<strong>de</strong> da ciência<br />

silogística, constituindo a medida e o controle<br />

também da parte do conhecimento que não<br />

tem tal necessida<strong>de</strong>, elimina, mesmo <strong>de</strong>ssa parte,<br />

a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> erro. Na verda<strong>de</strong>, a partir<br />

<strong>de</strong> Aristóteles, o problema que a <strong>filosofia</strong> <strong>de</strong>ve<br />

enfrentar não é o da verda<strong>de</strong>, mas o do E., no<br />

sentido <strong>de</strong> que os princípios a que habitualmente<br />

a <strong>filosofia</strong> recorre implicam que o homem<br />

está "necessariamente" em verda<strong>de</strong> e excluem,<br />

assim, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> erro. Portanto,<br />

as soluções mais comuns do problema do E.<br />

são as seguintes: I a ) o E. não existe; 2 3 ) o E. <strong>de</strong>vese<br />

a uma força que intervém para perturbar o<br />

funcionamento normal do intelecto, precisamente<br />

A) na vonta<strong>de</strong> ou B) na sensibilida<strong>de</strong>.<br />

1- Ambas essas soluções do problema do E.<br />

estão em S. Agostinho, mas a primeira acaba<br />

predominando. Para S. Agostinho o E. consiste<br />

"em julgar e acatar como supremo o que, <strong>de</strong><br />

per si, é ínfimo" (De vera rei, 21), ou seja, em<br />

afastar-se "da or<strong>de</strong>m estabelecida por Deus,<br />

apesar <strong>de</strong> iludir-se achando que a conserva<br />

intacta" (Ibid., 20). O E. é, portanto, <strong>de</strong>vido à<br />

"vonta<strong>de</strong> maléfica", ou seja, ao propósito <strong>de</strong>liberado<br />

<strong>de</strong> prescindir da or<strong>de</strong>m divina do mun-<br />

do e da hierarquia dos valores que ela implica.<br />

Mas qual é a causa <strong>de</strong>ssa vonta<strong>de</strong> maléfica e<br />

como ela é possível na or<strong>de</strong>m divina do mundo?<br />

S. Agostinho nega que possa tratar-se <strong>de</strong><br />

uma causa positiva e eficiente; trata-se <strong>de</strong> uma<br />

causa <strong>de</strong>feituosa ou <strong>de</strong>ficiente. E querer encontrar<br />

a causa <strong>de</strong>ssas <strong>de</strong>fecções seria como querer<br />

ver as trevas ou ouvir o silêncio. "As coisas<br />

que ficam sendo conhecidas não em sua forma<br />

positiva, mas como privação <strong>de</strong> algo, são <strong>de</strong><br />

algum modo apreendidas, por assim dizer, exatamente<br />

ao não serem conhecidas, tanto que,<br />

se as conhecêssemos, não as ficaríamos conhecendo.<br />

Quando a acuida<strong>de</strong> da visão sensível<br />

percorre as espécies corpóreas, não vê trevas<br />

em lugar algum, a não ser no lugar on<strong>de</strong> começa<br />

a não ver as coisas. Assim, não cabe a nenhum<br />

outro sentido perceber o silêncio; a não ser ao<br />

ouvido, que, todavia, adverte-o quando não<br />

ouve nada. Assim, nossa mente vê com o intelecto<br />

as espécies inteligíveis, mas on<strong>de</strong> elas se<br />

acham em forma negativa conhece-as não as<br />

conhecendo" (De civ. Dei, XII, 7). Assim, para<br />

S. Agostinho E. é o conhecimento <strong>de</strong> um<br />

não-conhecimento: como ouvir o silêncio. Em<br />

sentido próprio e rigoroso, é um não conhecimento<br />

e um não ser: ele não existe. Essa redução<br />

do E. ao nada é característica <strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />

parte das doutrinas filosóficas tradicionais. Spinoza<br />

expressa-o com a costumeira niti<strong>de</strong>z: "A<br />

falsida<strong>de</strong> consiste na privação <strong>de</strong> consciência<br />

que está implícita nas idéias ina<strong>de</strong>quadas, falhas<br />

ou confusas". P. ex., os homens erram ao<br />

se acreditarem livres, porque estão cônscios<br />

<strong>de</strong> suas ações, mas <strong>de</strong>sconhecem as causas que<br />

as <strong>de</strong>terminam. Assim também erram quando<br />

acham que o Sol está próximo, porque são<br />

ativados pela ação do Sol, mas ignoram sua distância<br />

real (Et., II, 35, scol.). O E., portanto, não<br />

consiste na simples imaginação (que é a faculda<strong>de</strong><br />

das idéias ina<strong>de</strong>quadas e confusas), mas<br />

na falta <strong>de</strong> conhecimento, na falta da idéia que<br />

excluiria a existência dos objetos que a imaginação<br />

crê presentes (Ibid, II, 17, scol.). Com<br />

outra terminologia, tradicional, Leibniz afirmava<br />

a mesma coisa, reconhecendo como causa<br />

do E. uma causa "<strong>de</strong>ficiente", ou seja, a limitação<br />

ou a imperfeição da natureza humana<br />

(Théod., I, § 20). Para o i<strong>de</strong>alismo romântico, o<br />

E. é o "finito", o "negativo", o "aci<strong>de</strong>ntal": o que<br />

se <strong>de</strong>stina a ser eliminado e a encontrar sua<br />

"verda<strong>de</strong>" no Infinito, no Necessário e no Positivo<br />

da Autoconsciência absoluta. Assim, a rigor,<br />

não existe erro. Como dizia Gentile, expri-

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